A configuração das hipóteses do artigo 55 da Lei de Migração (Lei 13.445/2017) não precisa ser contemporânea ao fato que motivaria a expulsão do estrangeiro. Assim, um estrangeiro que resida no Brasil não pode ser expulso caso venha a preencher algum dos requisitos daquele dispositivo legal só após os fatos que levaram o governo a editar a portaria de expulsão.
Esse foi o entendimento da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao conceder habeas corpus a um nacional da Tanzânia para invalidar a portaria que determinou sua expulsão do Brasil, editada em 2017, em razão de ter sido condenado a sete anos de prisão e multa por tráfico de drogas.
No pedido de habeas corpus, a Defensoria Pública comprovou que ele tem um filho brasileiro, nascido em fevereiro de 2019, e convive em regime de união estável com pessoa residente no Brasil. Foram anexados ao processo comprovantes de contas de água e energia elétrica, como provas de sua residência.
De acordo com o artigo 55 da Lei de Migração, uma das condições que impedem a expulsão do estrangeiro é ter filho brasileiro que esteja sob sua guarda ou dependência econômica ou socioafetiva.
Unidade familiar
O ministro Og Fernandes – relator – afirmou que a documentação dos autos comprova que o tanzaniano possui filho brasileiro sob a sua guarda, havendo dependência econômica e socioafetiva.
Ele destacou que, de acordo com a Lei 13.445/2017, um estrangeiro nessas condições não pode ser expulso do Brasil, mesmo que tenha se enquadrado nas hipóteses que impedem a expulsão somente após a condenação criminal e a edição da portaria.
“Muito embora a portaria de expulsão tenha sido editada em 21 de junho de 2017, anteriormente, portanto, à formação de família no Brasil pelo paciente, o certo é que não se pode exigir para a configuração das hipóteses legais de inexpulsabilidade a contemporaneidade dessas mesmas causas em relação aos fatos que deram ensejo ao ato expulsório”, explicou.
Og Fernandes citou julgado do Supremo Tribunal Federal (HC 114.901) no qual o ministro Celso de Mello afirmou que a nova orientação da corte suprema é no sentido de preservar a unidade e a integridade da entidade familiar, bem como de assegurar a proteção integral à comunidade infantojuvenil.
“Desse modo, ao contrário do que afirma a autoridade impetrada, estão configuradas as hipóteses excludentes de expulsabilidade, razão pela qual o ato indicado como coator deve ser anulado”, concluiu.
O ministro ressaltou que merece destaque, no caso, a aplicação do princípio da prioridade absoluta dos direitos e interesses da criança e do adolescente, previsto na Constituição – o que autoriza a permanência do pai em território brasileiro.
A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a um recurso do Estado de Rondônia para reformar decisão judicial que havia mandado pagar com preferência um precatório de natureza comum, não alimentar, a uma mulher de mais de 60 anos acometida de doença grave.
Para o colegiado, a Constituição é clara ao conceder a preferência apenas aos precatórios de natureza alimentar de pessoas com mais de 60 anos ou portadoras de doença grave.
A credora entrou com o pedido de preferência de pagamento para seus créditos, decorrentes de danos materiais. Após o reconhecimento do direito à preferência, o governo de Rondônia ajuizou mandado de segurança, sustentando que a verba em questão não é de natureza alimentar e, portanto, não faz jus à preferência.
O Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO) denegou a segurança, por considerar razoável a preferência ao credor de precatório comum que seja idoso e portador de moléstia grave, pois a medida constitui meio de dar efetividade a princípios constitucionais como o da dignidade da pessoa humana.
No recurso em mandado de segurança, o governo estadual afirmou que a regra que concede preferência para o recebimento de precatórios de natureza alimentar em determinadas hipóteses não poderia ser estendida da forma como entendeu o tribunal local.
Interpretação extensiva
Segundo o ministro Benedito Gonçalves, relator do recurso no STJ, a interpretação extensiva feita pelo TJRO não é possível no caso.
Ele destacou que as Emendas Constitucionais 62/2009 e 94/2016, quando se referem à preferência dos maiores de 60 anos ou de pessoas com doenças graves para receber os precatórios de natureza alimentar, não fazem menção a eventual preferência para o recebimento de verbas de natureza comum.
“Ressoa evidente que, em ambos os casos, faz-se necessário, para obter o direito de preferência no recebimento, que o precatório seja de natureza alimentar, bem como que o credor seja idoso (maior de 60 anos) ou portador de doença grave”, resumiu o ministro ao destacar precedentes do STJ nesse sentido.
De acordo com o relator, a interpretação extensiva levada a efeito pelo TJRO “não encontra amparo no texto constitucional”, o que justifica o provimento do recurso em mandado de segurança.
A Secretaria de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) atualizou a base de dados de Repetitivos e IACs Organizados por Assunto. Foram incluídas informações a respeito do julgamento de oito recursos.
Classificados em direito administrativo, assunto desapropriação, o REsp 1.757.352 e o REsp 1.757.385 tratam da definição do prazo prescricional aplicável à desapropriação indireta na hipótese em que o poder público tenha realizado obras no local ou atribuído natureza de utilidade pública ou de interesse social ao imóvel.
Classificados em direito tributário, assunto crédito tributário, os REsp 1.767.945, REsp 1.768.060 e REsp 1.768.415 tratam do termo inicial da incidência de correção monetária no ressarcimento de crédito escritural excedente de tributo sujeito ao regime não cumulativo.
Também no assunto direito tributário, tratando da possiblidade de inclusão dos serviços de capatazia na composição do valor aduaneiro e na base de cálculo do Imposto de Importação, assunto II (Imposto de Importação), estão os REsp 1.799.306, REsp 1.799.308 e REsp 1.799.309.
Os usuários podem acompanhar o passo a passo dos recursos repetitivos no STJ por meio da página Repetitivos e Incidentes de Assunção de Competência, mantida pelo Núcleo de Gerenciamento de Precedentes (Nugep). O espaço traz informações atualizadas relacionadas à tramitação, como afetação, desafetação e suspensão de processos, entre outras.
O exercício simultâneo de pequena atividade comercial em propriedade que também é utilizada como residência não impede o reconhecimento de usucapião especial urbana. Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso de dois irmãos e reconheceu a usucapião de um imóvel utilizado por eles de forma mista.
O recurso teve origem em ação de usucapião na qual os irmãos alegaram que, por mais de cinco anos, possuíram de boa-fé um imóvel localizado em Palmas. Em primeiro grau, o pedido foi julgado parcialmente procedente para reconhecer a usucapião urbana somente da área destinada à moradia, correspondente a 68,63m² – decisão mantida pelo Tribunal de Justiça do Tocantins.
Segundo os irmãos, a propriedade tem 159,95m², sendo que em 91,32m² funciona uma bicicletaria na qual trabalham com a família. Eles alegaram que, mesmo com a parte maior do imóvel sendo utilizada para fins comerciais, não haveria óbice para o reconhecimento da usucapião de toda a propriedade quando ela também se destina à residência da família.
Requisitos
A relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, explicou que a modalidade de usucapião especial urbana é regulada na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 183, parágrafos 1º ao 3º, e pelo Código Civil, em seu artigo 1.240, parágrafos 1º e 2º, bem como, de forma mais específica, pelo Estatuto da Cidade.
Segundo a ministra, essa modalidade de usucapião tem como requisitos a posse ininterrupta e pacífica, exercida como dono; o decurso do prazo de cinco anos; a dimensão máxima da área (250m² para a modalidade individual e área superior a esta, na forma coletiva); a moradia e o fato de não ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
Em seu voto, a relatora lembrou que a Terceira Turma já se manifestou pela possibilidade de se declarar a usucapião de área com metragem inferior à estabelecida na legislação infraconstitucional que regula o parcelamento do solo urbano (REsp 1.360.017).
Sustento da família
Nancy Andrighi ressaltou que a exclusividade de uso residencial não é requisito expressamente previsto em nenhum dos dispositivos legais e constitucionais que tratam da usucapião especial urbana. “O uso misto da área a ser adquirida por meio de usucapião especial urbana não impede seu reconhecimento judicial, se a porção utilizada comercialmente é destinada à obtenção do sustento do usucapiente e de sua família”, disse.
De acordo com a relatora, há a necessidade de que a área reivindicada seja utilizada para a moradia do requerente ou de sua família, mas não se exige que essa área não seja produtiva, especialmente quando é utilizada para o sustento do próprio recorrente, como na hipótese em julgamento.
“Nesse sentido, o artigo 1.240 do Código Civil não parece se direcionar para a necessidade de destinação exclusiva residencial do bem a ser usucapido. Assim, o exercício simultâneo de pequena atividade comercial pela família domiciliada no imóvel objeto do pleito não inviabiliza a prescrição aquisitiva buscada”, afirmou.
A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), nesta quarta-feira (3), ao julgar questão de ordem suscitada pelo ministro Benedito Gonçalves no EREsp 1.162.117, definiu que só serão retirados da sessão por videoconferência para aguardar o retorno das sessões presenciais – caso solicitado por uma das partes – os processos cujo julgamento ainda não tiver começado.
No caso analisado pela Corte, uma das partes apresentou petição manifestando oposição à continuidade do julgamento por videoconferência, como previsto no artigo 1º, parágrafo 3º, da Resolução 9/2020. Já a outra se manifestou pelo prosseguimento do julgamento, por entender que não havia justificativa razoável para o destaque.
Segundo o dispositivo, “qualquer uma das partes ou qualquer ministro integrante do órgão julgador poderá destacar o processo a ser julgado e remetê-lo para pauta de julgamento em sessão presencial sem videoconferência, vedado, nessa hipótese, o julgamento monocrático pelo relator”.
Julgamento já iniciado
Ao proferir seu voto, Benedito Gonçalves, que estava com vista do processo, destacou que a previsão do artigo 1º, parágrafo 3º, da Resolução 9/2020 não se aplica ao caso analisado, em que o julgamento teve início no ano passado, antes mesmo da pandemia do novo coronavírus.
O ministro destacou que o prazo de 30 dias para prorrogação do pedido de vista, previsto no parágrafo 1º do artigo 162 do Regimento Interno do STJ, já se esgotou, razão pela qual a Corte Especial deve retomar o julgamento.
Ao submeter a questão de ordem ao colegiado, o presidente do tribunal, ministro João Otávio de Noronha, ressaltou: “Alguns ministros já até apresentaram voto, já houve sustentação oral, já houve apresentação de memoriais. Não é um julgamento novo, é continuação de julgamento”.
A Corte, por maioria, aderiu ao voto do ministro Benedito Gonçalves, ficando vencido o ministro Napoleão Nunes Maia Filho.
Ao negar mandado de segurança que questionava a anulação da anistia concedida a um ex-cabo da Aeronáutica, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aplicou o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) que admite a revisão do ato mesmo após o prazo decadencial de cinco anos previsto na Lei 9.784/1999.
O ex-cabo requereu a anulação da portaria que cancelou a anistia concedida a ele em 2003, em razão da qual recebia reparação econômica mensal.
Segundo informou o ex-integrante das Forças Armadas, em 2011 foi editada portaria que criou um grupo de trabalho interministerial com a finalidade de reexaminar as anistias embasadas na Portaria 1.104/1964, e em 2012 saiu a portaria que anulou sua anistia.
Para ele, passados mais de nove anos desde a declaração da anistia, estabilizou-se a relação jurídica, havendo, portanto, direito adquirido. Alegou ainda que o ato administrativo juridicamente perfeito é inviolável, e que teria havido a decadência da possibilidade de anulação da portaria anistiadora, conforme o artigo 54 da Lei 9.784/1999.
Poder de autotutela
O autor do voto que prevaleceu no julgamento da Primeira Seção, ministro Og Fernandes, apontou que o STF, no julgamento do RE 817.338 (Tema 839 da repercussão geral), reconheceu que a administração pode anular o ato de concessão de anistia.
O STF fixou a tese de que, “no exercício do seu poder de autotutela, poderá a administração pública rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria 1.104/1964, quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas já recebidas”.
De acordo com o ministro, o mandado de segurança procurou demonstrar a decadência para o processo de revisão da anistia e a necessidade de ser observado o princípio da segurança jurídica.
Contudo, ele lembrou que, segundo o STF, estando evidenciada violação direta ao texto constitucional (no caso, o artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), é possível a anulação de ato administrativo pela própria administração pública, mesmo quando decorrido o prazo decadencial da Lei 9.784/1999.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) iniciou nesta terça-feira (2) o VII Seminário de Planejamento Estratégico Sustentável do Poder Judiciário, que discute a sustentabilidade e a internalização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) nas instituições da Justiça, em meio à Covid-19.
A primeira apresentação, transmitida ao vivo nas redes sociais do tribunal, contou com a participação do ministro do STJ Villas Bôas Cueva e da secretária de gestão de pessoas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Ana Cláudia Mendonça. Para acompanhar o encontro, que continua até sexta-feira (5), não há necessidade de inscrição.
Villas Bôas Cueva falou sobre os efeitos da pandemia na expansão do trabalho remoto e mencionou o exemplo do próprio gabinete, pioneiro na adoção desse regime de produção. Para o ministro, a experiência apresentou aspectos positivos, como maior flexibilidade na organização das atribuições, mais produtividade e eliminação do acúmulo de pessoas no mesmo lugar.
Por outro lado, o magistrado observou que nem todas as pessoas ou unidades têm facilidade de se adaptar à nova rotina. Apontou como grandes desafios a realização dos julgamentos por videoconferência, o planejamento e o acompanhamento das atividades a distância, a delimitação da fronteira entre trabalho e vida pessoal, e o prejuízo para as relações sociais.
“Um problema que estamos enfrentando hoje é determinar qual o limite entre seu tempo de lazer, sua vida privada e seu trabalho. Isso tem um custo psíquico que dever ser objeto de estudos no futuro. Eu não acredito que a vida presencial física no trabalho irá desaparecer. Se fosse assim, empresas privadas já teriam adotado esse regime antes. Morar dentro do seu trabalho não é para todos”, analisou o ministro.
Humanização e resultados
O primeiro painel, sobre “Qualidade de vida e trabalho remoto: riscos e oportunidades – ODS 4”, foi mediado por Isabela Medeiros, servidora do Ministério Público do Trabalho (MPT). A secretária de gestão de pessoas do TSE, Ana Cláudia, disse que a sociedade vive uma era de rompimento de paradigmas, e alguns conceitos devem ser superados, inclusive os que tratam da relação entre gestores e subordinados. “O papel do novo gestor é desenvolver a autonomia da equipe, substituir a ideia de ‘comando-controle ou hora-cadeira’ para uma relação de confiança baseada em resultados.”
Nesse contexto, afirma Cláudia, o gestor deve assumir um perfil mais humanístico. “Se não existe confiança, a pergunta é: por que você trabalha com alguém em quem não confia?” A secretária lembrou que o teletrabalho é uma ótima ocasião para o servidor experimentar novas realidades, desenvolver outras competências e viver multipotencialidades.
Ao final do debate, a mediadora Isabela Medeiros destacou que uma gestão humanizada não é tarefa fácil, pois requer amadurecimento tanto do gestor quanto da equipe e do próprio serviço público. E lançou alguns questionamentos: “Para qual cultura queremos caminhar? Qual cultura queremos formar? Qual será nosso aprendizado após o período da pandemia?”
A sustentabilidade é um conceito amplo e plástico, por isso administradores devem continuar a persegui-la mesmo durante a pandemia do novo coronavírus (Covid-19). Essa foi uma das principais conclusões do segundo painel do VII Seminário de Planejamento Estratégico Sustentável do Poder Judiciário, realizado na noite desta terça-feira (2) pelas redes sociais do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O encontro debateu os efeitos da pandemia nas licitações e contrações públicas.
Participaram do evento a assessora da presidência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) Tatiana Camarão e o professor e auditor federal da Controladoria-Geral da União (CGU) João Domingues, tendo como mediadora a secretária de recursos do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), Isabella Brito.
Gestão racional
Tatiana Camarão destacou que a sustentabilidade é multidimensional e integrada a práticas de boa governança. A assessora comparou fases das contratações públicas a um conjunto de engrenagens, na qual a sustentabilidade é o seu pilar. “Um exemplo é a elaboração do Plano Anual de Contratação, que permite ao governo e aos fornecedores planejarem estrategicamente e fazer uma gestão mais racional e sustentável de recursos”, observou.
Ela enumerou ainda como vantagens: o melhor controle social, já que as compras são conhecidas com antecedência, e a busca por melhores soluções. “Desde 2010, a Lei de Licitações (Lei 8.666) integra padrões de sustentabilidade”, afirmou Tatiana.
Entretanto, o advento da pandemia obrigou a revisão desses planos. “É importante lembrar que integridade ética e boa alocação de recursos integram as políticas sustentáveis. A flexibilidade de contratações é necessária nesse momento de crise, mas ela também cria oportunidade de fraude”, apontou. Portanto, disse ela, os administradores não podem se descuidar.
José Domingues acrescentou que a pandemia afetou o cumprimento de contratos. “Muitos órgãos estão antecipando férias, diminuindo cargas horárias e fazendo rodízios”, exemplificou. Para ele, nesse cenário a boa governança e o monitoramento das atividades são essenciais. “Suprimentos para combater o alastramento do coronavírus são prioritários, e contratações emergenciais tornaram-se necessárias, como a compra de respiradores. Mas o administrador deve ser responsável, registrar todas suas operações e tomar os devidos cuidados”, alertou.
Prevenção e solidariedade
Além disso, administradores devem usar e-mail institucional, gravar reuniões on-line com fornecedores e checar as credenciais da empresa. Tatiana Camarão ressaltou que a tecnologia facilita a verificação de empresas inidôneas: “O administrador deve ser diligente e lembrar um princípio básico: contratações de maior vulto merecem investigações mais rigorosas”.
Isabella Brito destacou que o impacto da pandemia nos contratos é considerável, por isso é fundamental ter uma visão orgânica e ampla, além de maturidade administrativa. “O consumo caiu, porém, é importante ser cauteloso com a realocação de recursos”, advertiu. João Domingues também afirmou que a decisão de suspender um contrato tem consequências para empresas e trabalhadores e deve levar em conta a integridade das pessoas e dos serviços da administração pública.
Tatiana Camarão afirmou que a sustentabilidade exige preocupação com os outros e com o alinhamento dos contratos com questões orçamentárias e a situação nacional. “Ser ético é ter amor ao próximo. Só vamos sair dessa com a união de todos”, concluiu.
O seminário continua até sexta-feira (5) e pode ser acompanhado nas páginas do STJ no YouTube, Instagram, Facebook e Twitter. Haverá emissão de certificado individual para cada um dos painéis mediante resposta à avaliação de participação a ser divulgada pela Escola Corporativa do STJ (Ecorp).
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) estuda a possibilidade de voltar com as sessões de julgamento presenciais no início dos trabalhos forenses do segundo semestre, em agosto. Segundo o presidente da corte, ministro João Otávio de Noronha, tudo vai depender da evolução da pandemia do novo coronavírus (Covid-19).
“Precisamos pensar prioritariamente na saúde das pessoas – ministros, servidores, operadores do direito e todos aqueles que trabalham no STJ. Vamos agir com responsabilidade e cautela. O restabelecimento das sessões presenciais é importante, mas deve ocorrer com o maior grau de segurança possível. Estamos atentos à evolução do quadro da pandemia e às orientações técnicas das autoridades sanitárias”, afirmou o ministro.
Trabalho remoto
O STJ suspendeu as sessões presenciais de julgamento em março, mas manteve a prestação jurisdicional e o atendimento ao público por meio do trabalho remoto.
Os julgamentos por videoconferência vêm acontecendo desde o início de maio. Esse novo formato, para substituir temporariamente as sessões presenciais, foi autorizado pelo Pleno em abril e regulamentado pela Resolução 9/2020.
O prazo para as sessões por videoconferência foi prorrogado até 1º de julho pela Instrução Normativa 9.
Permanece em vigor a Resolução 8/2020, que prorrogou por tempo indeterminado as Resoluções 4/2020 e 5/2020. Os normativos estabelecem, entre outras providências, a adoção preferencial do trabalho remoto no tribunal.
Por unanimidade, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do mérito de habeas corpus coletivo em favor de presos que cumprem pena nos regimes aberto e semiaberto em dois presídios de Uberlândia (MG), confirmou a liminar que permitiu sua transferência para prisão domiciliar, por causa da pandemia da Covid-19. Os efeitos da decisão foram estendidos aos apenados na mesma situação em todo o sistema prisional de Minas Gerais.
No mesmo julgamento, no entanto, o colegiado não conheceu de pedido de extensão da medida para os presos do sistema penitenciário do Distrito Federal.
Segundo o relator do caso, ministro Sebastião Reis Júnior, em consequência da liminar concedida, diversos pedidos de extensão foram protocolizados nos autos, com base no artigo 580 do Código de Processo Penal.
Em um desses pedidos, a Defensoria Pública do Distrito Federal requereu a extensão da medida também aos presos que se encontram em idêntica situação no DF – cumprindo pena em regime aberto ou semiaberto, com implementação de trabalho externo e saída temporária, mas que tiveram os benefícios suspensos em razão da Covid-19.
Para o relator, a comprovação da similitude entre a situação jurídica dos dois grupos de presos, do DF e de Minas, autorizaria a extensão pretendida.
Divergência
Porém, ao examinar a possibilidade de estender o benefício, a maioria dos ministros da Sexta Turma concluiu que o pedido não deveria ser conhecido.
O ministro Rogerio Schietti Cruz – que inaugurou a divergência nesse ponto – afirmou que não cabe pedido de extensão em liminar de habeas corpus coletivo, ainda mais em se tratando de situações fáticas diferentes, que demandam análise própria.
Para Nefi Cordeiro, não é possível a extensão do habeas corpus para os presos do DF. “Não podemos fazer esse exame – se é igual ou não a situação – em uma simples extensão. Que entrem com um habeas corpus para cada situação”, afirmou.
Também os ministros Antonio Saldanha Palheiro, presidente do colegiado, e Laurita Vaz entenderam pela impossibilidade da extensão.
Ilegalidade evidente
Em relação a Minas Gerais, o ministro Sebastião Reis Júnior destacou ser evidente a ilegalidade da situação vivida pelos condenados do regime aberto e semiaberto que vinham trabalhando e estavam se reintegrando à sociedade.
“A revogação dos benefícios concedidos aos reeducandos elencados na petição inicial configura flagrante ilegalidade, sobretudo diante do recrudescimento da situação em que estavam na execução da pena, todos em regime semiaberto, evoluídos à condição menos rigorosa, trabalhando e já em contato com a sociedade”, argumentou.
O relator comentou que o recrudescimento da situação prisional somente é admitido na legislação brasileira como forma de penalidade, em razão de falta disciplinar, cuja imposição definitiva exige prévio procedimento com observância da ampla defesa e do contraditório.
A situação verificada em Minas Gerais – avaliou o ministro – amolda-se perfeitamente às diretrizes da Recomendação 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para a prevenção da Covid-19. Ele afirmou que é preciso dar imediato cumprimento à recomendação do CNJ, notadamente ao disposto no inciso III do artigo 5º.
Habeas corpus coletivo
Sobre o cabimento do habeas corpus coletivo, o ministro afirmou que, diante dos conflitos na sociedade contemporânea, passa a ser imprescindível um novo arcabouço processual que abarque a tutela de direitos coletivos também no âmbito penal.
Para Sebastião Reis Júnior, a reunião de várias pessoas na mesma situação, em um único habeas corpus, importa em economia de tempo, esforços e recursos, atendendo o desafio de tornar mais célere a prestação jurisdicional.
Para não incidir em indevida supressão de instância, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, não conheceu de habeas corpus impetrado por um delegado da Polícia Civil do Rio Grande do Sul condenado a 32 anos de prisão por integrar organização criminosa envolvida com roubo de cargas e criar embaraço às investigações, além de atuar na lavagem de dinheiro.
No habeas corpus, a defesa sustentou que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) modificou uma das imputações descritas na denúncia, afirmando que a investigação obstruída teria ocorrido na cidade de Alvorada (RS), e não em Cachoeirinha (RS), como informava a acusação do Ministério Público.
Para o relator do caso, ministro Ribeiro Dantas, a jurisprudência do STJ é uníssona no sentido de ser inviável a apreciação de matérias não analisadas pelo tribunal de origem, “sob pena de, assim o fazendo, incidir em indevida supressão de instância”.
Por isso, no caso em julgamento, o ministro explicou que, como a questão suscitada pela defesa do réu não foi analisada pelo TJRS, o STJ está impedido de examinar a matéria.
Mudança dos fatos
Segundo Ribeiro Dantas, as alegações da defesa pedindo o reconhecimento da mutatio libelli (modificação da acusação) envolvem fatos que são controversos, e seu exame pelo STJ exigiria o revolvimento das provas do processo – mais uma razão pela qual a pretensão não pode ser analisada.
O ministro afirmou que não há como o STJ diretamente acolher a tese defensiva de mutatio libelli unicamente pelo fato de o acórdão do TJRS mencionar a comarca de Alvorada como o local das investigações obstruídas, em vez da cidade de Cachoeirinha. “Isso porque, se a própria defesa afirma que ‘a dita investigação de Alvorada jamais foi mencionada nos autos’, é possível que o acórdão seja acometido de mero erro material, o que não ocasiona a nulidade arguida”, explicou.
De acordo com o relator, a questão trazida pelo habeas corpus deveria ter sido analisada previamente pelo TJRS, mas a defesa, mesmo tendo a oportunidade de opor embargos de declaração naquela corte para questionar a alegada modificação da denúncia, não o fez.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), na sessão realizada na última quarta-feira (27), definiu, por unanimidade, que somente serão levados a julgamento por videoconferência os recursos repetitivos sobre os quais não houver divergência entre os ministros.
Ficou estabelecido que os repetitivos a serem julgados em videoconferência deverão estar em consonância com a jurisprudência da Primeira e da Segunda Turmas, que compõem a Primeira Seção, especializada em direito público.
O colegiado decidiu também que cada relator poderá pautar apenas um tema repetitivo por sessão e deverá disponibilizar seu voto sobre a matéria com pelo menos uma semana de antecedência em relação à data do julgamento.
As sessões por videoconferência, adotadas para evitar a disseminação do novo coronavírus (Covid-19), deverão se estender, pelo menos, até 1º de julho, como prevê a Instrução Normativa STJ/GP 9.
Debate necessário
O presidente da Primeira Seção, ministro Benedito Gonçalves, explicou que a medida se deve ao fato de que o recurso repetitivo, por sua natureza, “tem o potencial de elastecer o tempo da sessão, pois normalmente há sustentação oral de ambas as partes, além da manifestação dos amici curiae“.
Pelos efeitos que o julgamento terá na tramitação de um número incontável de processos, no presente e no futuro, o repetitivo exige um debate mais profundo, o que, segundo o ministro, não é favorecido pelo formato da videoconferência e acaba por prejudicar o desenvolvimento da sessão, caso haja muitos desses recursos em pauta – sobretudo se o tema não tiver ainda um entendimento pacificado na corte.
De acordo com o que ficou acertado, se algum ministro registrar um destaque no voto, indicando divergência sobre algum ponto, o processo será automaticamente retirado de pauta e ficará à espera da volta das sessões presenciais.
Benedito Gonçalves observou que a própria Resolução STJ/GP 9, de 17 de abril, que autorizou a realização de sessões por videoconferência no tribunal em razão da pandemia de Covid-19, estabelece que qualquer uma das partes ou qualquer membro do órgão julgador poderá destacar o processo e remetê-lo para julgamento após o retorno das sessões presenciais.
Processos retirados
Na sessão de quarta-feira, o colegiado decidiu retirar de pauta sete temas repetitivos que estavam previstos para julgamento. A decisão veio após sugestão do ministro Napoleão Nunes Maia Filho, que apontou a necessidade de haver uma discussão ampla e precisa sobre cada tema, pois as teses fixadas em repetitivo servirão para solucionar processos semelhantes em tramitação em todo o país.
Um dos casos retirados de pauta foi o Tema 1.008, de relatoria da ministra Regina Helena Costa, no qual se discute a possibilidade de inclusão de valores de ICMS nas bases de cálculo do Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), quando apurados pela sistemática do lucro presumido.
Ao analisar questão de ordem levantada pela relatora, a seção, por unanimidade, autorizou que o julgamento dos três recursos afetados nesse tema ocorra somente quando forem retomadas as sessões presenciais, “mantendo-se, contudo, a suspensão nacional dos processos pendentes, tal como decidido por ocasião da afetação”.
Outro repetitivo adiado é o que discute a possibilidade de fixação de honorários advocatícios em exceção de pré-executividade, quando o sócio é excluído do polo passivo da execução fiscal, que não é extinta (Tema 961).
Também ficou para ser julgado posteriormente, pois foi retirado de pauta por indicação do relator, o recurso que trata da possibilidade de recebimento, no Regime Geral da Previdência Social, de benefício por incapacidade de caráter substitutivo da renda (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez) concedido judicialmente em período de abrangência concomitante ao tempo em que o segurado estava trabalhando e aguardando o deferimento do pedido (Tema 1.013).
Recursos repetitivos
O Código de Processo Civil de 2015 regula no artigo 1.036 e seguintes o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetarem um processo – ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos –, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.
A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica.
No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu não ser possível a colocação em prisão domiciliar do devedor de pensão alimentícia, a despeito da crise sanitária causada pelo novo coronavírus (Covid-19). Para o colegiado, a medida mais adequada é suspender a prisão civil durante o período da pandemia.
A decisão veio no julgamento de habeas corpus impetrado contra acórdão proferido pela Nona Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que manteve a prisão de um cidadão por não ter pago as prestações da pensão que venceram posteriormente ao pedido de extinção da execução de alimentos.
Segundo o TJSP, o devedor quitou os débitos alimentares até outubro de 2019, momento em que pediu a extinção da execução. No entanto, a partir daí, deixou de pagar a pensão, o que resultou na decretação da prisão, em janeiro de 2020.
No STJ, a defesa argumentou que o cenário de pandemia da Covid-19 recomenda a substituição da prisão civil em regime fechado pela domiciliar, dada a situação de vulnerabilidade da população carcerária. Sustentou, ainda, que toda a dívida acumulada já havia sido quitada e que, após o pedido de extinção da execução, os pagamentos continuaram sendo feitos mensalmente, mas de forma parcial.
Dignidade do alimentando
Em seu voto, o relator do caso, ministro Villas Bôas Cueva, lembrou que o artigo 6º da Recomendação 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) orienta que, em virtude do atual contexto epidemiológico, as pessoas presas por dívida alimentícia sejam colocadas em prisão domiciliar.
Destacou, entretanto, que a concessão de prisão domiciliar aos alimentantes inadimplentes relativizaria o disposto no artigo 528, parágrafos 4º e 7º, do Código de Processo Civil de 2015, que autoriza a prisão civil em regime fechado quando devidas três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que vencerem no curso do processo.
O magistrado ressaltou que, de fato, é necessário evitar a propagação do novo coronavírus, porém afirmou que “assegurar aos presos por dívidas alimentares o direito à prisão domiciliar é medida que não cumpre o mandamento legal e que fere, por vias transversas, a própria dignidade do alimentando”.
“Não é plausível substituir o encarceramento pelo confinamento social – o que, aliás, já é a realidade da maioria da população, isolada no momento em prol do bem-estar de toda a coletividade”, declarou.
Incolumidade
Por outro lado, Villas Bôas Cueva ressaltou que a Constituição Federal assegura a todos o direito à incolumidade física e moral e que os direitos inerentes à personalidade explicitam cláusula geral de tutela da pessoa humana, alcançando, inclusive, o devedor de alimentos, que pode ter sua vida posta em risco com o cumprimento da prisão em regime fechado.
Dessa forma, o relator concluiu que, em virtude da situação emergencial na saúde pública – e como não é possível a concessão de prisão domiciliar –, admite-se, excepcionalmente, a suspensão da prisão dos devedores de pensão alimentícia em regime fechado, enquanto durar a pandemia.
“A prisão civil suspensa terá seu cumprimento no momento processual oportuno, já que a dívida alimentar remanesce íntegra, pois não se olvida que, afinal, também está em jogo a dignidade do alimentando – em regra, vulnerável”, concluiu o ministro.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) teve duas iniciativas premiadas com o Selo CNJ de Desburocratização, do Conselho Nacional de Justiça: a automatização do controle de petições recursais incidentais e a automatização do controle de baixa de processos com decisão monocrática.
O presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha, comemorou o reconhecimento do esforço do tribunal para o aperfeiçoamento dos serviços prestados à sociedade.
“Este selo prestigia o empenho e o investimento que o STJ tem feito para desburocratizar seus serviços e atender com mais eficiência o jurisdicionado. O uso da tecnologia para simplificar os procedimentos é um dos caminhos – talvez o mais importante – para fazermos mais com os mesmos recursos, otimizando a utilização da nossa força de trabalho”, declarou o ministro.
Práticas
As áreas do STJ responsáveis pela implementação das práticas premiadas foram a Secretaria dos Órgãos Julgadores (SOJ) – que definiu os procedimentos que seriam automatizados e detalhou os controles necessários – e a Secretaria de Tecnologia da Informação e Comunicação (STI) – responsável pelo desenvolvimento dos sistemas.
A automatização do controle de baixa de processos com decisão monocrática foi posta em prática em junho de 2019, e a do controle de petições incidentais iniciou-se em outubro de 2019.
Foram adaptados controles desenvolvidos para a baixa automática de processos, utilizando a tecnologia para aumentar o desempenho e garantir resultados melhores.
Com o desenho de um novo fluxo para as petições, foi possível automatizar seu tratamento desde o protocolo até o envio para o gabinete do ministro, com abertura de vistas, controle de prazos para manifestação e certidões correspondentes. A maioria das petições passa por esse fluxo sem intervenção humana.
Prêmio
O Selo CNJ de Desburocratização foi concedido em 25 de maio a 11 tribunais brasileiros pelo desenvolvimento de boas práticas de simplificação e modernização de atividades e processos de trabalho. A premiação ocorreu durante a 1ª Reunião Preparatória do XIV Encontro Nacional do Poder Judiciário.
A premiação foi instituída pelo CNJ em 2019, por meio da Portaria 193/CNJ, para reconhecer iniciativas da Justiça brasileira com resultados notórios pela eficiência, eficácia e efetividade.
Para a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a desistência do recurso – ou a renúncia ao prazo recursal – constitui ato unilateral de vontade do recorrente que independe da concordância da parte contrária e produz efeitos imediatos, ensejando o trânsito em julgado. A contagem do prazo decadencial, no entanto, só pode se iniciar após a ciência da outra parte.
Com base nesse entendimento, o colegiado, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial de um grupo de bancos para pronunciar a decadência do direito de propor ação rescisória e restaurar acórdão proferido em embargos à execução de sentença que condenou a Fazenda Nacional a restituir valores pagos indevidamente a título de Finsocial.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) havia julgado parcialmente procedente a ação rescisória proposta pela Fazenda Nacional para excluir da condenação a correção pelo IGP-M nos meses de julho e agosto de 1994, admitindo, porém, a inclusão da Taxa Selic nos cálculos.
No recurso apresentado ao STJ, as instituições financeiras sustentaram que a ação rescisória foi proposta após o prazo de dois anos do trânsito em julgado da decisão, previsto no artigo 495 do Código de Processo Civil de 1973, vigente à época. Argumentaram que, como termo inicial do prazo, deve ser considerada não a data da certificação do trânsito em julgado, mas a da sua efetiva ocorrência, que corresponderia à data da desistência do último recurso interposto nos autos – 15 de dezembro de 2005.
Renúncia
O relator, ministro Gurgel de Faria, afirmou que deve ser aplicada ao caso a Súmula 401 do STJ, que dispõe que o prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível mais nenhum recurso do último pronunciamento judicial.
Os autos da ação principal, destacou o ministro, mostram que o julgamento do agravo regimental – último recurso interposto pelos recorrentes – aconteceu em 6 de dezembro de 2005. Em 15 de dezembro, foi protocolada petição requerendo a renúncia ao prazo recursal e ao direito de recorrer do acórdão, tendo o relator, em 6 de fevereiro de 2006, determinado a certificação do trânsito em julgado, sem homologar tal pedido.
Em 6 de março, no entanto, sobreveio a publicação do acórdão que julgou o agravo regimental, e a Fazenda Nacional foi intimada pessoalmente em 7 de março. A certidão de trânsito em julgado foi lavrada em 23 de março.
Para Gurgel de Faria, “não é a data da lavratura da certidão que estabelece o trânsito em julgado, mas a de sua efetiva ocorrência”. Ele explicou que a ocorrência do trânsito em julgado se verifica, em regra, pelo transcurso do prazo para interpor recurso contra a última decisão proferida no processo.
Peculiaridade
Assim, para o ministro, a certidão lavrada em 23 de março de 2006 não indicou a data em que teria ocorrido o trânsito em julgado, apenas o certificou. Segundo ele, a desistência do recurso ou a renúncia ao prazo recursal é ato unilateral que não depende da concordância da parte adversa e tem efeitos imediatos, provocando o trânsito em julgado do processo, segundo os artigos 158, caput, 501 e 502 do CPC/1973.
“A desistência do recurso ou a renúncia ao prazo recursal determina, em regra, o trânsito em julgado da decisão impugnada, se não houver, vale registrar, recurso pendente de julgamento da outra parte”, apontou.
O ministro observou que, no processo em análise, no entanto, há uma peculiaridade que impede o reconhecimento do trânsito em julgado em 15 de dezembro de 2005, data do protocolo da renúncia.
“Não obstante os efeitos imediatos preconizados na lei processual civil ao pedido de renúncia, não havendo homologação judicial, o princípio do contraditório impede que o trânsito em julgado seja reconhecido antes da ciência da parte ex adversa, pois não se pode permitir a abertura de um prazo – no caso, decadencial de dois anos, de que cuida o artigo 495 do CPC/1973 – antes que ocorra a indispensável intimação da parte interessada do fato processual que lhe dá origem”, afirmou.
Por isso, de acordo com o relator, o prazo decadencial deve ser contado da data da primeira intimação da Fazenda Nacional após o pedido de renúncia ao prazo recursal e ao direito de recorrer, ocorrida em 7 de março de 2006.
“Considerando que foi proposta a ação rescisória em 18 de março de 2008, a parte autora decaiu do direito, porquanto inobservado o prazo bienal previsto no artigo 495 do CPC/1973”, concluiu.
O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro João Otávio de Noronha, afirmou em debate virtual que o juiz tem espaço para criar soluções destinadas a conciliar interesses sob os efeitos econômicos da pandemia do novo coronavírus, mas um suposto “princípio da Covid-19” não pode se transformar em pretexto para interferência nas relações contratuais.
Para o ministro, os conflitos econômicos decorrentes da crise sanitária podem ser resolvidos com repactuação de acordos, porém os juízes não devem atender automaticamente aos pedidos de empresas sem demonstração real de desequilíbrio financeiro.
“O mundo empresarial é um sistema de vasos comunicantes. Se um cliente não paga o fornecedor, isso reflete em toda a cadeia produtiva”, ponderou. Para proteger o sistema, opinou o magistrado, é necessário o uso de mediação em larga escala – uma forma de preservar a economia e a ordem jurídica.
Situação de guerra
Noronha participou na última sexta-feira (29) do 1º Congresso Virtual do Forúm Nacional de Juízes de Competência Empresarial (Fonajem), que reuniu magistrados, juristas e especialistas diversos de todo o país para discutir temas como os impactos financeiros da pandemia, a insolvência das empresas e o sistema de falências e recuperação judicial.
O presidente do STJ é presidente de honra do Fonajem, criado em agosto de 2019, durante um curso na Escola Paulista de Magistratura (EPM), para ser um espaço de discussão do direito empresarial e de compartilhamento de informações”.
“A situação exige ser realista. Estamos numa situação de guerra, com um inimigo invisível, mas que fere tanto como uma bala”, disse Noronha, acrescentando que os desdobramentos econômicos da Covid-19 passarão necessariamente pelo Judiciário e que o ordenamento jurídico brasileiro tem instrumentos para lidar com isso.
Erro indesculpável
“A teoria da imprevisão, incorporada pelo artigo 317 do Código Civil, permite a correção de prestações contratuais em casos imprevistos que causem onerosidade excessiva”, afirmou o ministro.
Ele alertou, porém, que não se pode extrair disso uma tendência ao perdão de dívidas. “A Recomendação 63/2020 do Conselho Nacional de Justiça também não sugere a extinção das garantias contratuais indispensáveis para o equilíbrio econômico das instituições financeiras”, apontou. Para o ministro, os juízes que decidem assim cometem um erro indesculpável. “Não há princípio de miserabilidade no direito empresarial, e as garantias são pensadas exatamente para momentos de crise”, declarou.
Noronha lembrou que foi diretor jurídico do Banco do Brasil por dez anos e que sabe que os investidores necessitam de segurança jurídica para empregar seu capital. “O Estado brasileiro deve manter seriedade para atrair o capital nacional e estrangeiro para o pós-pandemia. Temos que tirar o subdesenvolvimento também da nossa cabeça”, comentou.
Base da recuperação
O ministro do STJ Luis Felipe Salomão também participou do evento, em palestra conjunta com a juíza Giovana Farenzena, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Eles trataram da negociação pré-falimentar e dos projetos de reforma da Lei de Recuperação e Falência.
Salomão elogiou a iniciativa do evento e destacou a necessidade de zelar pela solvência das empresas. “Ela serão a base da recuperação econômica na fase pós-pandemia, e não podemos abandoná-las”, comentou.
O conselheiro do CNJ Henrique Ávila apontou a importância do uso da mediação e incentivou a proatividade do Judiciário para evitar processos judiciais de falência e recuperação. “Muitos juízes já estão trabalhando nessa linha e tentando diminuir a judicialização da economia”, observou. Para o conselheiro, a Recomendação 63 do CNJ, publicada em março desse ano, que recomenda medidas para mitigação dos impactos do novo coronavírus, segue nessa direção.
Por falta de requisitos autorizadores, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Og Fernandes indeferiu liminar em mandado de segurança impetrado pela deputada federal Fernanda Melchionna e Silva (PSOL) para ter acesso ao perfil do ministro da Educação, Abraham Weintraub, no Twitter, no qual ela foi bloqueada. O mérito do pedido será julgado pela Primeira Seção.
A parlamentar argumentou que, no último dia 19, foi notificada pelo Twitter de que o ministro da Educação havia bloqueado seu acesso ao perfil dele na rede social. Segundo ela, desde o início de 2019, o alto escalão do governo federal tem estabelecido uma relação conflituosa em seus diálogos com a imprensa e com opositores políticos. Para a deputada, é necessário ter acesso às informações sobre as ações, medidas e posições que Abraham Weintraub assume na condição de ministro – as quais são publicadas em redes sociais.
Ela pediu a concessão da liminar para garantir o direito constitucional à informação, permitindo, assim, seu acesso de maneira irrestrita a todas as redes sociais em que haja divulgação de ações, posições e projetos do governo federal.
Urgência não justificada
O relator do pedido, ministro Og Fernandes, explicou que a concessão de liminar em mandado de segurança – quando possível – é condicionada à satisfação cumulativa dos requisitos previstos no artigo 7º, III, da Lei 12.016/2009: o fumus boni iuris (fundamento relevante) e o periculum in mora (perigo na demora).
“Na espécie, todavia, não observo, a partir da leitura dos fundamentos contidos na petição inicial, assim como da análise dos documentos que a instruíram, a presença dos requisitos autorizadores da medida liminar, notadamente o periculum in mora, haja vista que a impetrante não justificou a sua ocorrência”, afirmou.
Para o ministro, a tutela de urgência requerida pela deputada se confunde com o próprio mérito da ação, o qual será analisado pelo colegiado após os esclarecimentos a serem prestados pelo ministro da Educação.
Segundo o relator, é importante “perquirir acerca da natureza da conta vinculada ao Twitter à qual se requer inteiro acesso, bem como do objetivo de sua utilização e do eventual caráter institucional, para além do particular, a ela reservado, sem olvidar da via de mão dupla que deve permear o acesso às redes sociais, circunstância que inviabiliza, em juízo preambular, o deferimento do pleito”.
A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, reconheceu a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva no crime de falsidade ideológica imputado a um vereador acusado de colocar uma empresa em nome de “laranjas” para obter contrato com o poder público.
Para o relator do caso, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, o crime é instantâneo e foi consumado no momento da primeira alteração fraudulenta – a inserção do nome de “laranjas” como donas da empresa. Segundo ele, esse crime não se reitera ou continua pelo fato de, em alterações contratuais posteriores, os nomes das “laranjas” não terem sido trocados pelos nomes dos verdadeiros donos da empresa.
“A falsidade ideológica é crime formal e instantâneo, cujos efeitos podem vir a se protrair no tempo. A despeito dos efeitos que possam ou não vir a gerar, ela se consuma no momento em que é praticada a conduta”, explicou.
Termo inicial
Segundo os autos, o vereador utilizou o nome de duas mulheres como “laranjas” para representar uma empresa visando obter contrato com a Prefeitura de Porto Velho em 2012. A inserção dos nomes das duas mulheres na empresa aconteceu em 2003 e 2007, com posteriores alterações no contrato social realizadas em 2010 e 2011.
Em 2018, o caso foi julgado no STJ em decisão monocrática – que, ao analisar a alegação de atipicidade da conduta por falta de demonstração do dolo específico característico da falsidade ideológica, concluiu que a revisão do entendimento adotado pelo Tribunal de Justiça esbarraria na Súmula 7 do tribunal. Nesse ponto, a decisão não foi impugnada pelo recorrente no agravo regimental interposto perante o colegiado.
No pedido de revisão criminal, o requerente sustentou que a condenação estabelecida no recurso especial violou a correta aplicação da lei penal, alegando que estaria prescrita a pretensão punitiva, se consideradas como termo inicial da contagem do prazo as datas em que foram inseridos os nomes das “laranjas” no contrato social da empresa.
Também alegou infração aos artigos 71, 109 e 299 do Código Penal, em razão da ausência de demonstração, no acórdão recorrido, do dolo específico do agente, elemento indispensável à configuração do delito de falsidade ideológica.
Interpretação equivocada
O relator, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, explicou que somente compete ao STJ o julgamento de revisões criminais de seus próprios julgados. No caso em análise, o ministro destacou que o crime teve pena reduzida, pelo deferimento do recurso da defesa, para um ano, dois meses e 12 dias, e por isso, de acordo com o artigo 109, V, do Código Penal, a prescrição é de quatro anos.
O pedido de revisão, segundo ele, só poderia ser conhecido em parte, quanto à alegação de prescrição da pretensão punitiva. E, nesse ponto, merecia ser julgado procedente, pois os fatos ocorreram em 2003 e 2007, e a denúncia foi recebida somente em 2013, o que caracteriza a prescrição, já que transcorreram mais de quatro anos entre a data dos delitos e o recebimento da denúncia.
O relator destacou que o julgado rescindendo admitiu que a falsidade ideológica foi praticada em 2003 e 2007, mas considerou ter havido reiteração da prática quando, por ocasião das alterações contratuais ocorridas em 2010 e duas vezes em 2011, o réu deixou de regularizar o nome dos sócios verdadeiramente titulares da empresa, mantendo o nome das “laranjas”.
“A interpretação dada pelo julgado rescindendo é equivocada. A lei não pune um crime instantâneo porque ele continua produzindo efeitos depois de sua consumação. Seria absurdo punir um homicídio perpetuamente porque a vítima continua morta. O prazo prescricional deve ser contado da consumação do delito, e não da eventual reiteração de seus efeitos”, apontou.
Dessa forma, no entender do ministro, o termo inicial da contagem do prazo prescricional é o momento da consumação do delito – no caso, 2003 e 2007.
O momento do crime
Para o ministro, também não é possível entender que constitui novo crime a omissão do réu em corrigir informação falsa por ele inserida em documento público.
Segundo o relator, se os dois delitos de falsidade ideológica imputados ao autor da revisão criminal foram a inserção dos nomes das “laranjas” no contrato, “há de se reconhecer que o termo inicial para a contagem do prazo prescricional deve ser o momento em que seus nomes foram inseridos, e não, como o fez o julgado rescindendo, momentos posteriores em que foram feitas novas alterações no contrato social da empresa para alterar outros itens, mantendo o nome das ‘laranjas’ como sócias”.
Ao conhecer em parte da revisão criminal, o colegiado julgou procedente a tese da prescrição e deu por prejudicado o exame da alegação de inexistência de continuidade delitiva.
Quando um recurso aporta no Superior Tribunal de Justiça (STJ), normalmente está carregado por um sem-número de páginas que revelam alta carga de litigiosidade, mas nada impede que, no âmbito de uma corte superior, as partes encontrem na negociação a melhor saída para encerrar seu conflito.
Prova disso é o recente acordo firmado por um ex-casal, separado de fato desde 2011, que concordou em se submeter a um procedimento de mediação ao longo do ano passado. O resultado foi o encerramento de pelo menos 15 ações civis e de família em diferentes instâncias judiciais, incluindo um recurso especial recebido pelo STJ em 2013, que tramitou em segredo de justiça.
Para a realização do complexo acordo – que envolveu definições sobre transferências de cotas empresariais, indenizações, pagamento de dividendos e partilha de bens –, o relator do recurso especial, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, sugeriu como mediadores o ministro aposentado do STJ Aldir Passarinho Junior e a advogada Juliana Loss de Andrade Rodrigues, os quais foram aceitos pelas partes.
Segundo o ministro, a ideia da mediação surgiu após a análise de diferentes recursos oriundos do mesmo processo de partilha, sem que a ação principal tivesse sido decidida ainda em primeiro grau. Além da possibilidade de prolongamento do conflito, Sanseverino destacou que o caso envolvia não apenas o antigo casal, mas também os filhos e uma parte da família.
“Nesse caso, o melhor não seria a decisão convencional, mas sim a solução negociada, que fosse fruto de uma mediação que envolvesse não só o casal, mas toda a família. O relato que nós recebemos é que as partes ficaram extremamente satisfeitas com a mediação”, apontou o ministro.
Confiança
De acordo com Juliana Loss, o procedimento de mediação exigiu, além do preparo dos advogados e dos mediadores, a construção de uma relação de confiança com as partes. Segundo ela, é comum que os litigantes, antes de se dirigirem à mediação, já tenham participado de negociações frustradas, o que torna ainda mais difícil fazer com que acreditem na nova tentativa.
Além disso, Juliana Loss lembrou que situações complexas como as tratadas no caso envolvem, muitas vezes, questões empresariais, familiares, sucessórias e emocionais, com disputas que às vezes ultrapassam o âmbito civil para chegar à esfera criminal. Outro desafio importante, segundo a mediadora, é lidar com os diferentes perfis envolvidos na negociação e minimizar os ruídos de comunicação.
“O papel da mediação é justamente auxiliar nesse fluxo de informação, já que a solução de questões assim – ainda que para alguns possa parecer – não surge de saídas óbvias. Nessa específica mediação, a confiança das partes foi fundamental. O rapport e a conexão entre as partes – que eram várias – e os mediadores, desde o início do procedimento, foram essenciais. E ressalte-se que isso só foi e é possível com o apoio dos advogados das partes”, resumiu a mediadora.
Incentivos
O procedimento de mediação, que exigiu uma série de encontros presenciais, durou cerca de um ano e envolveu 18 signatários – entre pessoas físicas e jurídicas, além de nove sociedades de advogados que atuam ou atuaram nas ações.
Segundo o ministro aposentado Aldir Passarinho, os resultados positivos do acordo refletem a posição do STJ como grande incentivador do instituto da mediação. Esse incentivo – ressaltou Passarinho – tem ocorrido tanto no plano prático como na órbita acadêmica e propositiva, tendo em vista a crescente participação dos ministros em seminários, comissões legislativas e publicações sobre o tema.
No caso concreto, Aldir Passarinho destacou a disposição do ministro Sanseverino em buscar a solução não só do recurso em trâmite no STJ, mas também das demandas em outras fases, o que exigiu a interlocução com os magistrados responsáveis.
“Foi muito importante a disponibilidade para uma homologação abrangente do próprio ministro relator, englobando todos os processos em andamento, incluindo aqueles em tramitação nas instâncias de primeiro e segundo graus, bem como a rapidez como isso se deu – o que proporcionou um encerramento linear imediato das contendas principais e acessórias”, afirmou.
Movimento crescente
O acordo supervisionado pelo STJ acontece em um momento em que as estratégias para solução consensual dos conflitos ganham ainda mais força diante do crescente congestionamento da Justiça.
Com a experiência de 13 anos como membro do STJ, entre 1998 e 2011, Aldir Passarinho lembra que, em grande parte de sua carreira, as atividades de conciliar, acordar, transigir e renunciar eram previstas nas procurações dos advogados, mas pouco presentes na rotina forense, quase sempre focada em uma disputa sem fim.
Entretanto, Passarinho ressaltou que, recentemente, além de avanços legislativos nessa direção, houve mudanças nos programas dos cursos de direito – que passaram a adotar conteúdos relacionados às soluções consensuais – e incentivos à mediação por parte da Ordem dos Advogados do Brasil, movimentos progressivamente acolhidos pelo Judiciário.
Convívio pacífiauco
No âmbito legislativo, por exemplo, em seu artigo 3º, parágrafo 3º, o Código de Processo Civil de 2015 estabelece que a conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual dos conflitos devem ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, em qualquer fase do processo judicial.
Segundo o ministro Sanseverino, os métodos alternativos de solução de litígios já têm sido adotados com sucesso há alguns anos, principalmente no primeiro grau de jurisdição.
Entretanto, no caso dos processos que chegam aos tribunais superiores, ele explicou que há uma dificuldade maior, pois, em vários deles, a mediação ou a conciliação já foram tentadas anteriormente.
Mesmo assim, especialmente em controvérsias familiares, de vizinhança ou societárias, o ministrou enfatizou que a decisão dada pelo tribunal pode resolver o processo, mas dificilmente vai solucionar o conflito original.
Para o ministro, a pacificação efetiva seria possível com a ampliação do uso da mediação, técnica que, diferentemente da conciliação – mais rápida e voltada apenas para o encerramento do processo –, privilegia o enfrentamento do problema na origem. Com esse procedimento, afirmou o ministro, é provável que as pessoas restabeleçam um convívio mais pacífico e civilizado.
“Na medida em que nós começamos a ter experiências bem-sucedidas no âmbito do STJ, há um estímulo às partes e aos advogados para optarem por esse tipo de solução”, projetou Sanseverino.
Amadurecimento
De acordo com Juliana Loss, ainda que a solução consensual represente a melhor saída – inclusive em termos de tempo e dinheiro –, às vezes, só com o transcurso da marcha processual as partes terão mais clareza sobre os impactos do processo em suas vidas e se sentirão preparadas para tomar decisões difíceis.
Por isso, mesmo que tenham ocorrido negociações infrutíferas no passado, a chegada do processo à instância superior, para a mediadora, não pode representar o fim da tentativa de uma solução consensual. “É um momento também em que as emoções estão mais estabilizadas”, comentou.
Apesar disso, para Juliana Loss, as cortes superiores não podem ser “mais do mesmo” em relação às soluções negociadas sob supervisão judicial, nem devem se limitar a repetir os procedimentos normalmente realizados nas instâncias ordinárias.
“Acredito que seu papel nesse âmbito é justamente resguardar a política pública de solução consensual em seus precedentes e considerar o sistema multiportas como uma premissa importante para a Justiça contemporânea, tal qual já preconiza a legislação vigente”, ressaltou a mediadora.
Flexibilidade
No mesmo sentido, para Aldir Passarinho Junior, a mediação no STJ pode ser proveitosa porque, entre outras razões, a autoridade responsável pela homologação integra uma corte nacional, que possui experiência para identificar casos adequados dentre os milhares de processos que recebe anualmente. Por outro lado, para o ministro, a grande demanda recebida pelo tribunal também exige a adoção de critérios de triagem para processos em massa ou com teses já julgadas, que poderiam ser direcionados à mediação.
Em relação à instrumentalização legal para a realização dos procedimentos de mediação, Passarinho acredita que a legislação atual é suficiente. Apesar da necessária base normativa, o mediador observou que é preciso evitar um regramento excessivo dos caminhos para a solução extrajudicial, pois eles exigem certo nível de flexibilidade.
“Lida-se com o ser humano e, mesmo em questões empresariais, sempre são pessoas que conduzem as empresas e, não poucas vezes, também negociam conforme as suas emoções. Daí, deve haver comedimento no estabelecimento de regras rígidas, excessivamente minuciosas ou bastante abrangentes. Em suma, deve-se evitar excesso normativo”, enfatizou.
O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro João Otávio de Noronha, não conheceu do pedido do município de Votuporanga (SP) para suspender a decisão de um desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que não permitiu o relaxamento de medidas de isolamento social adotadas para combater a pandemia do novo coronavírus (Covid-19).
Na decisão desta quinta-feira (28), Noronha afirmou que o pedido do município tem fundamento na Constituição Federal, o que inviabiliza a análise da contracautela pelo STJ.
A administração de Votuporanga baixou três decretos para abrandar as medidas de isolamento social. A Procuradoria-Geral de Justiça de São Paulo ajuizou ação direta de inconstitucionalidade contra os decretos, alegando violação de normas constitucionais federais e estaduais, e o desembargador do TJSP concedeu liminar para suspender a eficácia das medidas.
No pedido de suspensão dirigido ao STJ, o município apontou interferência indevida do Judiciário em seus atos normativos, que possuem amparo na Lei 13.979/2020 e no Decreto Federal 10.282/2020 para elencar quais atividades devem ser consideradas essenciais.
Discussão constitucional
O ministro João Otávio de Noronha lembrou que a competência do STJ para examinar pedido suspensivo está vinculada à fundamentação infraconstitucional da causa de pedir da ação principal.
O presidente do STJ explicou que a controvérsia trazida pela administração de Votuporanga não está calcada apenas em aspectos infraconstitucionais. De acordo com trecho da liminar do TJSP citado pelo ministro, os decretos municipais também violaram, aparentemente, normas constitucionais estaduais e federais que tratam da distribuição de competências relativas à saúde entre os entes federativos.
“A discussão dos autos refere-se à definição de competência para atuação administrativa e regulamentação do poder de polícia sanitária na atual situação de pandemia reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), bem como à ponderação entre a garantia do direito à vida e à saúde, de um lado, e o exercício da atividade econômica, de outro – questões com expresso fundamento na Constituição Federal”, declarou.
Noronha disse que tanto no pedido inicial da ação proposta pela Procuradoria-Geral de Justiça de São Paulo quanto na decisão do desembargador do TJSP que deferiu a liminar estão presentes fundamentos constitucionais, o que faz com que o pedido deva ser analisado pelo Supremo Tribunal Federal.
Ele destacou que, mesmo se fosse ultrapassado esse ponto, a análise não seria possível, já que o STJ possui o entendimento de que não cabe pedido de suspensão contra decisão proferida em controle concentrado de constitucionalidade.