sexta-feira, 6 de setembro de 2024

Operadora de TV por assinatura não pode impor ao consumidor responsabilidade total pelos equipamentos


 Operadora de TV por assinatura não pode impor ao consumidor responsabilidade total pelos equipamentos

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou abusivas as cláusulas dos contratos de TV por assinatura que, mesmo diante de caso fortuito ou de força maior, impõem ao consumidor a responsabilidade total pelos danos causados aos equipamentos fornecidos pelas operadoras.

O entendimento, por maioria, foi firmado pelo colegiado ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que julgou improcedente a ação civil pública movida pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) contra uma empresa de TV por assinatura e internet. O tribunal estadual considerou válida a cláusula que atribui ao consumidor, em qualquer circunstância, a responsabilidade pelos equipamentos fornecidos em locação ou comodato, como decodificadores de sinal, modemscable modems e smart cards.

No recurso ao STJ, o MPSP sustentou que a cláusula é abusiva por dar vantagem exagerada ao fornecedor do serviço. A empresa, por sua vez, afirmou que a cláusula serve para resguardá-la contra condutas de má-fé, como dano intencional, comércio no mercado paralelo, apropriação indevida, simulação de furtos ou roubos.

Objetivo do consumidor não é alugar equipamentos

O relator do recurso, ministro Humberto Martins, disse que a relação em debate é de consumo e deve ser resolvida com base no artigo 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Segundo ele, é preciso levar em consideração que o objetivo do consumidor é contratar serviço de TV por assinatura e internet (contrato principal), e não receber equipamentos em comodato ou locação (contrato acessório).

Além disso, o relator ressaltou que, nesse tipo de contrato de adesão, o consumidor não tem a liberdade de obter os equipamentos de outro fornecedor. Assim, o ministro ponderou que, como o consumidor – hipossuficiente – tem de se sujeitar ao comodato ou à locação impostos pela operadora, deve ser considerada abusiva a regra contratual que lhe impõe a assunção do risco pela guarda e pela integridade do equipamento em qualquer situação.

"Seria diferente se o consumidor, sopesando os riscos, benefícios e custos envolvidos na operação, pudesse optar, com liberdade, entre a aquisição do aparelho e o comodato/locação. Nessa hipótese, desde que informado adequadamente, seria possível que o consumidor assumisse, de forma consciente, os riscos decorrentes de sua escolha, em especial a assunção da responsabilidade pelo perecimento do aparelho em quaisquer circunstâncias", declarou.

Conduta ilícita de alguns não autoriza presumir má-fé do conjunto de consumidores

O ministro apontou também que eventuais prejuízos causados por comprovada ilicitude da conduta de locatários específicos não autorizam a inserção de cláusulas contratuais que presumam a má-fé da generalidade dos consumidores, violando o artigo 4º, inciso III, e o artigo 6º, inciso VIII, do CDC.

Para Humberto Martins, a operadora não pode transferir aos consumidores os riscos inerentes à atividade negocial. Segundo ele, a entrega dos equipamentos ao consumidor é essencial para a prestação do serviço e é do interesse da operadora. "Não interessam ao usuário, portanto, as ferramentas a serem utilizadas na prestação do serviço, e sim a efetiva recepção e fruição do sinal de rede/televisão", declarou.

O relator considerou desproporcional que o contrato acessório de comodato ou locação imponha ao consumidor a responsabilidade integral por algo que serve diretamente ao interesse da prestadora, "enquanto esta, por meio de cláusulas abusivas, pretende se desonerar de todos e quaisquer riscos do contrato e da propriedade".

Fonte: STJ

Leia o acórdão no REsp 1.852.362.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1852362

quarta-feira, 4 de setembro de 2024

Empresa não terá de indenizar 44 empregados dispensados de uma vez


 4/9/2024 - A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho isentou a Intercement Brasil S.A. de pagar indenização a 44 empregados dispensados coletivamente. O colegiado acolheu embargos da empresa e reformou sua própria decisão anterior, em razão de entendimento vinculante firmado pelo Supremo Tribunal Federal. Embora afastando a condenação, foi mantida a determinação de que a empresa não promova nova dispensa coletiva sem a participação prévia do sindicato.

Na ação, o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção, do Mobiliário e da Extração de Mármore, Calcário e Pedreiras de Pedro Leopoldo, Matozinhos, Prudente de Morais, Capim Branco e Confins (MG) questionou a dispensa dos 44 empregados, em março de 2018. A medida foi anulada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG), que determinou a reintegração dos trabalhadores porque o sindicato não fora informado previamente para que, por meio do diálogo, se buscassem medidas para reduzir os efeitos nocivos da dispensa em massa.

Ao julgar o recurso de revista da Intercement, em novembro de 2022, a Terceira Turma do TST afastou a nulidade da dispensa coletiva e a ordem de reintegração determinada pelo TRT, mas condenou a empresa a indenizar os empregados dispensados. 

STF decidiu sobre o tema em 2022

Em 2022, o STF decidiu, em recurso com repercussão geral (Tema 638, de observância obrigatória pelas demais instâncias da Justiça), que a intervenção sindical prévia é imprescindível para a dispensa em massa de trabalhadores. Posteriormente, o Supremo explicitou que essa exigência diz respeito apenas às demissões em massa ocorridas após a publicação da ata do julgamento de mérito.

Com base nisso, a Intercement opôs embargos declaratórios alegando que se tratava de um fato superveniente relevante para a solução do seu processo.

Fato superveniente

Segundo o relator dos embargos declaratórios, ministro Maurício Godinho Delgado, a questão se enquadra, de fato, como fato superveniente - ou seja, uma circunstância jurídica que modifica ou altera uma situação firmada em fato anterior. “Nesse quadro, não restam dúvidas de que a decisão do STF, por ser vinculante, deve ser plenamente cumprida, na forma e no sentido por ela exposta, respeitada a modulação feita pelo próprio Supremo”, concluiu, manifestando ressalva de entendimento sobre o tema.

Com relação à determinação de que a empresa não promova mais dispensas coletivas sem a intervenção sindical prévia, o relator explicou que ela se volta para o futuro e, portanto, não é afetada pela modulação feita pelo STF.

A decisão foi unânime.

Fonte: TST

Processo: ED-RR-10342-90.2018.5.03.0144 

Ação de nulidade do registro no INPI só é imprescritível quando há notoriedade da marca e má-fé do registrador



A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou a jurisprudência segundo a qual a ação de nulidade do registro somente é imprescritível nos casos em que ficam demonstradas a notoriedade da marca e a má-fé do registrador – o que torna importante a análise do comportamento das partes.

Os ministros negaram o pedido das detentoras da marca Speedo Internacional para que fosse decretada a nulidade ou a adjudicação de todos os registros da marca Speedo concedidos desde 1980 pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) a empresas de um ex-atleta brasileiro de pólo aquático.

Para o colegiado, a conduta dos proprietários da marca internacional de materiais esportivos foi contraditória, uma vez que eles mantiveram uma relação comercial com as empresas do ex-atleta ao longo de 30 anos.

Empresas mantiveram acordos comerciais por 30 anos

Segundo o processo, as empresas estrangeiras, desde 1914, são fabricantes e titulares dos produtos da marca Speedo, os quais ficaram mundialmente conhecidos graças à sua divulgação em várias edições das Olímpiadas. No Brasil, elas obtiveram o registro da marca no INPI em 1970, mas ele foi extinto por caducidade em 1976.

O atleta brasileiro requereu o registro da marca em 1980 e o conseguiu em 1985, transferindo-o depois para empresas de sua família ou dele próprio. Contudo, até 2006, as partes mantiveram acordos comerciais que incluíram pagamento de royalties às empresas estrangeiras. O inadimplemento da marca brasileira teria sido responsável pela extinção do contrato até então vigente. Rompida a relação, o grupo internacional ajuizou a ação para retomar a marca em 2010.

Tanto o juízo de primeiro grau quanto o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) negaram o pedido do grupo para que a ação de nulidade do registro da marca brasileira fosse considerada imprescritível.

Análise da imprescritibilidade da ação de nulidade de marca não é objetiva

Com respaldo na jurisprudência das turmas de direito privado do STJ, o relator do recurso na Quarta Turma, ministro Raul Araújo, afirmou que o artigo 174 da Lei 9.279/1996 estabelece em cinco anos o prazo de prescrição da ação de nulidade do registro, mas a Convenção da União de Paris (CUP) de 1883 abre uma exceção ao determinar que o pedido não prescreve quando tiver havido má-fé do registrador e for comprovada a notoriedade da marca na época do registro indevido.

No caso em julgamento, o relator verificou que, segundo as instâncias ordinárias, ao tempo da obtenção do registro pelo atleta brasileiro, a marca Speedo não gozava de notoriedade perante o público em geral no Brasil. De igual modo, disse o ministro, consideraram a peculiaridade de que a má-fé, ainda que constatada, teve a sua eficácia suspensa durante os 30 anos em que as partes mantiveram relacionamento comercial harmônico.

"Não há como acolher a alegação recursal de que a imprescritibilidade é objetiva e não comportaria análise do comportamento das partes acerca de tal questão. Ora, má-fé é dolo, vontade de agir. Tem total relação, portanto, com o comportamento das partes", afirmou.

Raul Araújo também considerou descabida a adjudicação da marca, que tem efeitos retroativos. Na sua avaliação, deferir o pedido "seria o mesmo que entrar em rota de colisão com a assertiva de que a má-fé das rés não projetaria efeitos sobre o período em que as partes mantiveram relação empresarial colaborativa e amistosa".

Má-fé do registrador voltou a produzir efeitos com o fim do acordo entre as partes

No entanto, em razão das peculiaridades do caso, a Quarta Turma restabeleceu a sentença na parte em que determinou a não renovação do registro pela empresa brasileira, o que possibilitará que, paulatinamente, a marca Speedo e seu arrow device (marca figurativa) voltem às suas verdadeiras proprietárias, desde que cumpram os requisitos legais para obter os registros, sem causar para o registrador brasileiro um rompimento abrupto da realidade até então existente.

Fonte: STJ

Leia o acórdão no REsp 2.061.199.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 2061199

Exigência de dano efetivo ao erário vale para casos anteriores à reforma da Lei de Improbidade



A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no artigo 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. Na decisão, tomada por unanimidade, o colegiado reforçou o entendimento de que a condenação com base no artigo 10 (atos de improbidade que causam prejuízo ao erário) não pode mais ser aplicada com fundamento na presunção de lesão aos cofres públicos.

Na origem do processo julgado pela turma, o Ministério Público do Tocantins (MPTO) ajuizou ação de improbidade contra dois agentes públicos estaduais devido a contratações irregulares realizadas mediante inexigibilidade de licitação. Essas contratações, no valor de R$ 2,2 milhões, eram relacionadas à execução do projeto Agora Tocantins

Em primeira instância, os acusados foram condenados com base no artigo 10, incisos VIII e XI, da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992), ainda sem as modificações trazidas pela Lei 14.230/2021. As penas incluíam perda dos valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano e proibição de contratar com o poder público.

No entanto, o Tribunal de Justiça do Tocantins (TJTO) afastou a condenação por entender que não houve efetiva demonstração de prejuízo ao erário, uma vez que não havia evidências de que o valor contratado estava acima do normal.

Ao STJ, o Ministério Público pediu o restabelecimento das sanções aplicadas em primeiro grau, sob o argumento de que a dispensa indevida de licitação ou a declaração indevida de sua inexigibilidade justificariam a condenação por ato de improbidade com base no artigo 10, em razão do dano presumido. 

Não há como reconhecer ato ímprobo sem o efetivo dano ao erário

O relator do recurso, ministro Gurgel de Faria, explicou que, antes das mudanças trazidas pela Lei 14.230/2021, o STJ entendia que a dispensa indevida de licitação configurava improbidade, em razão do prejuízo presumido aos cofres do estado. Contudo, com a reforma legislativa e a nova redação dada ao artigo 10, tornou-se necessário comprovar a perda patrimonial efetiva para haver condenação por improbidade.

No entendimento do ministro, essa exigência de comprovação do dano deve prevalecer também nos casos anteriores à mudança da lei que ainda estejam em tramitação na Justiça. "Sem o dano efetivo, não há como reconhecer o ato ímprobo", declarou.

Gurgel de Faria ressaltou que a situação em análise não se enquadra na limitação prevista pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do Tema 1.199 da repercussão geral. Segundo ele, não se trata de aplicação retroativa de alteração normativa benéfica ao réu, já que, anteriormente, não havia norma expressa prevendo a possibilidade do dano presumido – o que só foi admitido em razão da jurisprudência consolidada do STJ. 

Ao negar provimento ao recurso do Ministério Público, o relator afirmou que o entendimento jurisprudencial anterior não pode seguir orientando as decisões do tribunal quando a legislação estabelece expressamente não ser cabível a condenação por ato ímprobo com fundamento em dano presumido. 

"Cabe ao Judiciário prestar a devida deferência à opção que seguramente foi a escolhida pelo legislador ordinário para dirimir essa questão", concluiu o ministro.

Fonte: STJ

Leia acórdão no REsp 1.929.685.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1929685

Impossibilidade de rever provas e peculiaridades do caso levam STJ a afastar estupro contra menor de 14 anos



A regra que impede a reanálise de provas em recurso especial, bem como a aplicação dos princípios do grau de afetação do bem jurídico e da relevância social do fato, levaram a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, a confirmar decisão de segunda instância que absolveu um homem acusado de estupro de vulnerável. Aos 20 anos, ele namorou uma menina de 13 anos e oito meses de idade e manteve relações sexuais com ela.  

De acordo com o processo, os fatos chegaram ao conhecimento da polícia após um desentendimento entre a menor e sua mãe. A genitora alegou que havia concordado inicialmente com o namoro, mas que depois, sem a sua autorização, a filha deixou o lar para morar com o namorado.  

Para o tribunal estadual – que confirmou a absolvição decidida em primeiro grau –, apesar da redação do artigo 217-A do Código Penal, o caso apresenta peculiaridades que impedem a simples aplicação do tipo penal. Segundo o tribunal, não existem elementos no processo que indiquem que o acusado tenha se aproveitado da idade da adolescente ou de sua suposta vulnerabilidade – situação que, na visão da corte, deveria ser ponderada para evitar uma condenação "desproporcional e injusta" de pelo menos oito anos de prisão.

Ainda segundo a corte estadual, a jovem foi ouvida em juízo quando já tinha 18 anos e, mesmo naquele momento, nem ela nem sua mãe relataram que a situação lhe tivesse causado qualquer abalo.

Em recurso dirigido ao STJ, o Ministério Público alegou que, sendo incontroverso que o homem manteve relações sexuais com menor de 14 anos, não haveria dúvidas sobre a configuração do crime de estupro de vulnerável, independentemente do consentimento da vítima e de sua responsável legal.

Condenação depende de avaliação da necessidade e do merecimento da pena

Relator do recurso, o ministro Sebastião Reis Junior explicou que, no entendimento do tribunal local, embora o relacionamento tenha terminado depois de dois anos e meio, o acusado e a suposta vítima constituíram a própria família durante esse período, de modo que a conduta do homem não é compatível com aquela que o legislador buscou evitar.

Na visão do ministro, para rever os fundamentos da decisão do tribunal estadual quanto à falta de elementos suficientes para justificar a condenação do réu, seria necessário reexaminar os fatos e as provas do processo, medida que o STJ não admite no julgamento de recurso especial, conforme estabelecido na Súmula 7.

O relator também citou precedente do STJ no sentido de que, para um fato ser considerado penalmente relevante, não basta a sua mera adequação à descrição legal do crime, mas é necessário avaliar aspectos como a extensão da lesão causada ao bem jurídico tutelado pela legislação, com o objetivo de verificar se há necessidade e merecimento da sanção.

Para voto divergente, não é possível relativizar vulnerabilidade da vítima                        

Ao divergir do relator, o ministro Rogerio Schietti Cruz considerou que a posição do tribunal de segunda instância violou o artigo 217-A do Código Penal, na medida em que não se apontou que a intenção do réu não foi a de manter relações sexuais com pessoa menor de 14 anos.

O ministro lembrou que, nos termos da Súmula 593 do STJ, o crime de estupro de vulnerável se configura com a prática de qualquer ato sexual com menor de 14 anos, sendo irrelevante o consentimento da vítima, sua experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso com o agente.

Para Schietti, a situação dos autos indica uma tentativa de restabelecer a antiga jurisprudência que delegava à Justiça a avaliação subjetiva sobre a vulnerabilidade da vítima, tomando como referência o comportamento dela e do suposto agressor. De acordo com ele, contudo, essa vulnerabilidade não pode mais ser relativizada, pois tal fato violaria toda a evolução legislativa e jurisprudencial de proteção a crianças e adolescentes.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

terça-feira, 3 de setembro de 2024

Técnicos da Secretaria de Fazenda do AM podem gerir arrecadação tributária, decide STF


O Supremo Tribunal Federal (STF) considerou que as atribuições previstas em norma do Amazonas para os técnicos de arrecadação de tributos estaduais são diferentes das funções exclusivas reservadas aos auditores-fiscais de tributos estaduais. A decisão unânime foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5597.

A Lei estadual 2.750/2002, com alterações posteriores, atribui aos técnicos de arrecadação de tributos (atualmente designado controlador de arrecadação da receita estadual) a gestão da arrecadação, o que engloba execução e controle de processos na área, cadastro, cobrança administrativa, desembaraço de documentos fiscais e atendimento especializado ao público. Na ação, a Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite) alegava que a norma permitiria a esses cargos exercer atividades típicas de auditor-fiscal.

Em seu voto, no entanto, o relator da ação, ministro Nunes Marques, verificou que, de acordo com a legislação local, não há invasão das funções típicas de Estado atribuídas aos auditores-fiscais. Segundo ele, essa carreira é responsável pela gestão tributária e têm exclusividade nas tarefas de constituição do crédito tributário (procedimento que atesta a ocorrência do fato gerador do tributo e permite sua cobrança). Os técnicos, por sua vez, cuidam apenas da gestão de arrecadação.

A ADI 5597 foi julgada na sessão virtual encerrada em 23/8.

Fonte: STF

STF vai decidir se união estável pode ser convertida retroativamente em casamento


O Supremo Tribunal Federal (STF) vai decidir se é possível converter uma união estável em casamento de forma retroativa. A matéria é tema do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1405467, que teve a repercussão geral reconhecida (Tema 1313), ou seja, a tese a ser firmada será aplicada aos demais processos semelhantes em andamento na Justiça.

O caso diz respeito a um casal que, desde 1995, vivia em regime de união estável e teve dois filhos. Em 2006, para que os filhos tivessem direito à cidadania austríaca, eles pediram a conversão da união estável em casamento, mas com efeitos retroativos. A Justiça só deferiu a conversão a partir de 2017, quando saiu a decisão, levando-os a reiterar o pedido de retroatividade em nova ação em 2019, acrescentando, ainda, outro pedido, desta vez para mudança do regime de bens.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) abriu prazo para que o pedido relativo à retroatividade fosse excluído da ação, porque já tinha sido decidido. Como isso não foi feito, extinguiu o processo.

No recurso ao STF, o casal argumenta, entre outros pontos, que, em respeito ao princípio do acesso à Justiça, o TJDFT deveria analisar o outro pedido, que nunca havia sido apreciado em outro processo.

Manifestação

Relator do recurso, o ministro Flávio Dino se manifestou pela repercussão geral dos dois temas tratados no recurso – o momento em que começam os efeitos da conversão da união estável em casamento e a decisão do TJDFT de não examinar todos os pedidos do processo porque um deles já tinha sido resolvido de forma definitiva. Segundo ele, a discussão diz respeito à extensão da proteção devida pelo Estado às famílias formadas inicialmente por meio da união estável, depois convertida em casamento. Para Dino, as duas questões constitucionais vão além do interesse pessoal das partes.

A manifestação do relator foi seguida por maioria em deliberação no Plenário Virtual.

Ainda não há data prevista para o julgamento do mérito do recurso.

Fonte: STF

Mantida decisão que determina retirada de barco de estacionamento de automóveis


      A 27ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve sentença da 4ª Vara Cível de Praia Grande, proferida pelo juiz Sérgio Castresi de Souza, que determinou a condômino a retirada de barco e reboque estacionados em área destinada exclusivamente a veículos automotores. A decisão impôs pena de R$ 10 mil ao réu em caso de descumprimento, bem como autorizou o condomínio a fazer a remoção na hipótese de inércia do apelante.

Segundo os autos, a empresa autora é registrada em cartório de registro de imóveis como local de destinação de estacionamento de carros e possui convenção de condomínio que garante a guarda de um automóvel a cada proprietário de box de garagem. Porém, o réu passou a utilizar o espaço para estacionar barco e reboque, mesmo após ser notificado da irregularidade da conduta. 
A relatora do recurso, desembargadora Daise Fajardo Nogueira Jacot, salientou que a alegação de que o uso da vaga para guarda do barco não gera incômodo a outros proprietários não basta para justificar a utilização para fim diverso do previsto na convenção do condomínio e na matrícula do imóvel. “O bem guardado pelo demandado no ‘box’ de sua propriedade é uma embarcação suscetível de locomoção sobre a água, que não se confunde com automóvel”, escreveu.
Completaram a turma julgadora os desembargadores Rogério Murillo Pereira Cimino e Luís Roberto Reuter Torro. A decisão foi unânime.

Fonte: TJSP

Dispositivos que instituem taxa de prestação de serviços aos visitantes de Olímpia são inconstitucionais, decide OE


         O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo declarou a inconstitucionalidade de dispositivos da Lei Complementar nº 212/18, com redação da Lei Complementar nº 278/23, ambos do Munícipio de Olímpia, que criam taxa de prestação de serviços aos visitantes. A decisão foi unânime.
A ação foi proposta pelo Ministério Público, sob a alegação de que taxa instituída apresenta indevida generalidade e indivisibilidade da atividade. 
O relator do acórdão, desembargador Nuevo Campos, observou que a criação da taxa deve obedecer às características dispostas no inciso II, do art. 145, da Constituição Federal, reproduzidos no inciso II, do art. 160, da Constituição Estadual – que garante ao Estado a competência de instituir “taxas em razão do exercício do poder de polícia, ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos de sua atribuição, específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte, ou postos a sua disposição”.
“É certo que, observadas as peculiaridades do município, com elevado fluxo turístico, há maior demanda dos serviços públicos, com inegável impacto financeiro”, escreveu o magistrado, apontando que, apesar disso, o dispositivo impugnado trata “de hipótese de incidência genérica, sem especificação dos serviços públicos prestados ou postos à disposição do contribuinte”.
“Há que se considerar, também, a indivisibilidade dos serviços tratados nos normas em questão, sendo que, embora o sujeito passivo tributário seja o ‘hóspede com estadia nos meios de hospedagem do Município’ (art. 178-C, da LC nº212/2018), é de todo inviável, nos termos da norma questionada, a determinação dos beneficiários dos serviços prestados ou postos à disposição, serviços estes, inclusive, não devidamente especificados”, concluiu.

Fonte: TJSP

DF não pode ser responsabilizado por morte de paciente que recebeu atendimento adequado


 Em decisão unânime, a 3ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) manteve entendimento de que o DF não cometeu erro médico em tratamento de paciente com problemas respiratórios que foi tratado com toxina botulínica e veio a falecer em seguida.  

A mãe do paciente é autora da ação e afirma que o filho recebeu aplicação da toxina em maio de 2015, como medida para reduzir a salivação e evitar complicações pulmonares. Informa que, em agosto, numa consulta de rotina, observou-se que o paciente começou a apresentar roncos ao dormir e progressiva dificuldade para respirar. Dias depois, ele foi internado de emergência, com indicação de traqueostomia. A mãe conta que, após o procedimento, o quadro de saúde do filho se agravou, com necessidade de uso contínuo de oxigênio e infecções respiratórias de repetição. Com a morte do paciente, no curso do processo, considera que houve erro médico, pois a aplicação da toxina botulínica desencadeou a cirurgia de traqueostomia e suas complicações 

Por sua vez, o DF nega existência de erro médico e, por isso, pede que o pedido da autora seja negado e a sentença mantida. 

Ao analisar, a Desembargadora relatora observou que, conforme a Constituição Federal, o Estado será responsável pelos atos danosos que seus agentes praticarem quando atuarem na qualidade de agente público. No entanto, a magistrada considerou que “não ficou evidenciada falha na prestação dos serviços prestados pelos profissionais da rede pública, nem que tenham atuado sem a cautela exigida para evitar os danos decorrentes do tratamento”.   

 “A responsabilidade civil de hospitais e médicos só surge se a lesão decorrer de conduta inadequada praticada por profissional da saúde, de forma que o Estado tem a obrigação de ser diligente e aplicar a técnica adequada e com procedimentos corretos, segundo os padrões e avanços oferecidos pela ciência médica daquele momento. Em casos em que se alega erro médico, a prova essencial para elucidar os fatos é a pericial, capaz de demonstrar se houve algum tipo de falha na prestação do serviço público de saúde a que se submeteu o paciente”, explicou.  

De acordo com a magistrada, as provas indicam que a aplicação do botox foi tentativa de reverter o grave quadro de deficiência respiratória do paciente. Além disso, a traqueostomia decorreu do estágio avançado de comprometimento das funções respiratórias, sem qualquer correlação com a aplicação do medicamento.  

"A perita médica constatou que a toxina botulínica era indicada para o paciente, pois durante o período de pico, os efeitos do botox lhe trouxeram melhora. Atestou, também, que os sintomas de obstrução das vias aéreas ocorreram quando a quantidade de toxina presente no organismo do paciente era insuficiente para agravar seu quadro clínico", descreveu. 

Diante disso, o colegiado concluiu que não se deve impor indenização por danos morais ao Estado. 

Fonte: TJDFT

Abuso de direito em ligações de telemarketing gera dever de indenizar


 A 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal manteve a decisão que condenou as empresas Foco Informática e Tecnologia LTDA, Foco Sistemas de Telecomunicações LTDA, Infinitus Brasil Telecomunicações LTDA, e VPK Serviços LTDA ao pagamento de indenização por danos morais, em razão de excessivas ligações e mensagens de telemarketing enviadas a um consumidor sem sua autorização.

O caso teve início quando o autor da ação relatou que recebeu diversas ligações e mensagens de telemarketing, em diferentes horários, inclusive fora do horário comercial, o que lhe causou incômodos significativos. A sentença de primeira instância determinou que as empresas se abstivessem de realizar novas ligações e mensagens ao autor, sob pena de multa, e as condenou cada uma das rés ao pagamento de R$ 2 mila título de danos morais.

As empresas recorreram, sob a alegação de que apenas atuavam como intermediadoras e que não tinham controle sobre as ligações feitas por terceiros. Argumentaram ainda que a sentença impôs uma prova impossível de ser realizada, pois seria inviável demonstrar que não realizaram as chamadas.

Contudo, a Turma Recursal rejeitou os argumentos apresentados e afirmou que as rés fazem parte da cadeia de prestação de serviços e, portanto, possuem responsabilidade solidária pelos danos causados. A decisão destacou que o excesso de ligações e mensagens caracteriza abuso de direito, conforme previsto no Código de Defesa do Consumidor e no Código Civil. Segundo o colegiado, "não se pode olvidar que não configura ato ilícito, por si só, a simples ligação sem demais desdobramento. O que não pode acontecer é o uso abusivo desta comunicação, tais como ligações e mensagens injustificadas em sequência, e de maneira recorrente"

A Turma ainda ressaltou que as empresas não negaram a ocorrência das ligações e mensagens, mas alegaram falta de ingerência, argumento que não se sustenta, uma vez que elas têm participação ativa na prestação do serviço que deu origem aos danos.

A decisão foi unânime.

Fonte: TJDFT

Empresa é condenada por adulteração de quilometragem de veículo


 

A Import Car Multimarcas Comércio de Veículos LTDA foi condenada a indenizar uma consumidora por adulteração de quilometragem de veículo. A decisão é da 7ª Vara Cível de Brasília e cabe recurso.

Conforme o processo, em agosto de 2022, a autora adquiriu um veículo no estabelecimento réu, cujo hodômetro constava aproximadamente 34.109 quilômetros. Porém, após perícia realizada pela Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), constatou-se houve adulteração que reduziu a quilometragem do veículo em 93.665 km. Afirma que, aproximadamente em novembro de 2023, ao levar o veículo para fazer a revisão dos 40 mil quilômetros, foi informada de que o estado das peças eram incondizentes com a quilometragem apresentada.

Por fim, a consumidora afirma que comunicou o fato à ré, que pediu à autora laudo técnico. Contudo, após elaboração do documento pela PCDF, a empresa recursou-se a assinar notificação extrajudicial e ficou de dar uma resposta à autora, porém isso não ocorreu.

No curso do processo, a empresa ré não deixou de se manifestar no prazo, razão por que foi decretada a sua revelia. Nesse sentido, a Juíza explica que esse instituto faz presumir que são verdadeiros os fatos alegados pela consumidora, especialmente porque os pedidos estão em conformidade com o direito e os demais elementos juntados no processo.

Para a magistrada, a adulteração da quilometragem está comprovada pelo laudo pericial produzido pela PCDF, o qual concluiu que “o veículo examinado apresentava hodômetro do painel de instrumentos com quilometragem total adulterada, muito provavelmente reprogramando a memória interna [...]”. Assim, “ao oferecer um produto no mercado de consumo, o fornecedor assume a garantia de entregá-lo sem vícios, não sendo possível eximi-lo desta obrigação nem mesmo por ignorância do defeito, conforme art. 23 do CDC”, declarou a Juíza. Dessa forma, a empresa foi condenada a devolver à autora o valor de R$ 123.183,30, além de pagar a quantia de R$ 7 mil, a título de danos morais.

Fonte: TJDFT

TRT/MS mantém demissão por justa causa por assédio sexual no trabalho


 A Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (TRT/MS) manteve, por unanimidade, a demissão por justa causa de um trabalhador devido à prática de assédio sexual. A decisão de 1º Grau foi da juíza do trabalho Fabiane Ferreira, que concluiu que o comportamento do empregado se enquadra na modalidade de assédio sexual por intimidação, também conhecido como assédio sexual ambiental. 

Duas testemunhas confirmaram que o trabalhador disse para uma colega palavras de conotação sexual e ameaça. Conforme a sentença, o assédio sexual acontece por chantagem ou intimidação. No caso da intimidação, o autor faz provocações sexuais inoportunas, pedidos sexuais ou outras manifestações parecidas, verbais ou físicas, com o objetivo de prejudicar a atuação de uma pessoa ou de criar uma situação ofensiva.  

Protocolo com Perspectiva de Gênero

O processo foi analisado seguindo o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. O documento, criado em 2023 pelo Conselho Nacional de Justiça, orienta os tribunais brasileiros a considerarem as desigualdades de gênero, raça ou origem nos conflitos que envolvam mulheres. O objetivo é evitar preconceito e discriminação. 

O protocolo esclarece que “na atuação judicial com perspectiva de gênero, é recomendável lembrar que a ocorrência da violência ou do assédio normalmente se dá de forma clandestina, o que pode ensejar uma readequação da distribuição do ônus probatório, bem como a consideração do depoimento pessoal da vítima e da relevância de prova indiciária e indireta”. 

O trabalhador, em depoimento, negou a prática de assédio sexual, porém confirmou a conversa mantida com a vítima, na data e no horário indicados na denúncia. As testemunhas também relatam conhecimento de assédio pelo colega. A decisão também enfatizou que, em casos de assédio sexual, é suficiente a "prova indiciária" (aquela que se baseia em indícios e circunstâncias) para confirmar a prática, especialmente considerando o histórico do autor com outras trabalhadoras. 

“Comprovado o assédio sexual cometido pelo autor, nos termos do previsto nos arts. 1.1 e 3 da Convenção 190 da Organização Internacional do Trabalho - OIT, e, portanto, violada liberdade sexual e a dignidade humana da trabalhadora, mesmo que a conduta tenha sido praticada em relação a ela uma única vez, o que autoriza a dispensa motivada do demandante, sem ônus para a empresa”, conclui o relator do processo, desembargador Francisco Filho.

Fonte: TRT 24

Família de operador de escavadeira que sofreu acidente com caminhão-pipa será indenizada


Uma empresa do ramo da construção civil de Anápolis foi condenada a pagar R$300 mil de indenização a filhos de operador de escavadeira que faleceu em acidente de trabalho com caminhão-pipa. A 1ª Turma do TRT-GO manteve a decisão da 2ª Vara do Trabalho de Anápolis que afastou a tese de possível culpa da vítima (por descuido ou desatenção) diante do estado de conservação do veículo envolvido no acidente, um caminhão do ano de 1976, em condições precárias de segurança.

O acidente

Conforme os autos, o trabalhador havia sido contratado para exercer as funções de “operador de máquinas pesadas”, no entanto, sofreu o acidente ao conduzir um caminhão-pipa pela rodovia GO 239, na Zona Rural de Nova Crixás–GO. Na condenação, a sentença considerou laudo de perícia criminal que apontou que o veículo envolvido no acidente não possuía condições adequadas de tráfego e que, ao conduzir o caminhão em rodovia, o trabalhador estava em desvio de função.

Valor da indenização

Quanto ao valor da indenização, o Juízo de primeiro grau entendeu que a limitação a 50 salários previstos no art. 223-G, § 1º, IV, da CLT não é proporcional ao prejuízo moral advindo do acidente, principalmente em razão do resultado morte. Assim, fixou a indenização em R$ 150 mil para cada um dos dois filhos, ressaltando o posicionamento do STF nas ADIs 6.050, 6.069 e 6.082, no sentido de ser constitucional o arbitramento judicial do dano em valores superiores aos limites máximos dispostos nos incisos I a IV do § 1º do art. 223-G, quando consideradas as circunstâncias do caso concreto e os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da igualdade.

No recurso, a empresa buscava diminuir o valor da indenização por danos morais. Argumentou que traria excessiva oneração e grande desgaste financeiro, podendo levá-la à inadimplência com os seus demais funcionários e fornecedores e até ao encerramento da empresa.

Após analisar o recurso, a relatora do processo, desembargadora Iara Teixeira Rios, adotou os fundamentos da sentença de 1º grau e acrescentou que a empresa reclamada possui três filiais em três estados distintos da federação, além de capital social de 7 milhões de reais, “demonstrando capacidade financeira de arcar com a decisão destes autos”. Os demais desembargadores da 1ª Turma acompanharam o voto da relatora por unanimidade.

PROCESSO: 0011308-45.2023.5.18.0052

Fonte: TRT 18

Empresa é condenada a indenizar empregado vítima de racismo recreativo


 A 9ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região condenou uma empresa ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 20 mil. A vítima é um empregado, que, no ambiente de trabalho, foi exposto a atos considerados racismo recreativo. No âmbito do TRT-15, esta é a primeira decisão colegiada que se baseia no Protocolo de Julgamento com Perspectiva Interseccional de Raça, estabelecido pelo Conselho Nacional de Justiça.

Segundo a relatora do acórdão, juíza convocada Camila Ceroni Scarabelli, “o racismo recreativo, praticado por meio do humor reprovável, onde os agressores se divertem enquanto a vítima se sente humilhada e inferiorizada, na verdade retrata a intenção de se manter uma estrutura social que menospreza e inferioriza o povo negro, como forma de expressão de poder/dominação, perpetuando o racismo estrutural na sociedade, com piadas, gestos, falas, imagens, postagens que retratam o quão enraizado e naturalizado está o racismo na cultura e na sociedade”.

O conjunto probatório demonstrou a ocorrência de prática violadora da dignidade do trabalhador, que comprovou ter “sofrido racismo recreativo no ambiente de trabalho, fruto do racismo estrutural indevidamente naturalizado e tolerado na sociedade e no ambiente de trabalho”.

O órgão colegiado concluiu que a conduta praticada contra o empregado, no local de trabalho e durante o expediente, tratou-se de uma “prática racista generalizada, isto é, vários colegas participaram dela, direta ou indiretamente”. A reclamada foi condenada em razão de sua omissão diante das “piadas” e “brincadeiras”, de cunho racista, “praticadas pelos colegas de trabalho da vítima, toleradas no ambiente de trabalho, inclusive pelo chefe do reclamante que frequentava/trabalhava na portaria onde os fatos aconteceram”.

Além disso, a empresa sequer alegou a adoção de providências para reprimir a prática racista indevidamente implementada, nem providenciou qualquer acolhimento à vítima. Diante desses fatos, os desembargadores da 9ª Câmara do TRT-15 entenderam que o reclamante foi vítima de racismo recreativo, no ambiente de trabalho e com o conhecimento da empresa, que nada fez para coibir a prática. Por esses motivos, determinou o pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 20 mil.

Processo em segredo de justiça.

Fonte: TRT 15

Auxiliar de cozinha de hospital receberá adicional de insalubridade pela exposição ao calor no preparo de refeições


 A Justiça do Trabalho determinou que um hospital de Belo Horizonte pague o adicional de insalubridade em grau médio, no valor de 20% do salário mínimo, a uma auxiliar de cozinha, pela exposição ao calor na preparação das refeições dos pacientes. A profissional alegou que recebia regularmente o adicional de insalubridade até fevereiro de 2020. Mas, segundo ela, o pagamento da verba foi cessado a partir daquela data, embora estivesse exposta a agentes insalubres no exercício de suas atividades.

A decisão é dos integrantes da Quarta Turma do TRT-MG, que, em sessão ordinária realizada de 21 a 23 de fevereiro de 2024, mantiveram, no aspecto, a sentença proferida pelo juízo da 5ª da Vara do Trabalho de Belo Horizonte. No recurso, a empregadora alegou que, durante o período da pandemia, o preparo das refeições não era realizado na unidade de trabalho, não havendo, assim, exposição à fonte de calor. E que, nessa época, os auxiliares de cozinha não se aproximavam dos pacientes, sendo as refeições servidas em embalagens descartadas pelos próprios pacientes após o uso. Sustentou ainda que a profissional não mantinha contato permanente com pacientes ou objetos de uso pessoal deles sem prévia esterilização.

Mas, com o resultado da perícia técnica, a desembargadora relatora Rosemary de Oliveira Pires Afonso deu razão à trabalhadora. “Determinada a realização de perícia técnica, nos termos do artigo 195 da CLT, concluiu o perito ter sido caracterizada a insalubridade em grau médio, por exposição a calor e a agentes biológicos no ambiente de trabalho”.

Na descrição das atividades informadas pelo hospital, consta que a função da trabalhadora era auxiliar as cozinheiras na preparação dos alimentos oferecidos na instituição. Além disso, deveria servir as refeições aos empregados e zelar pela guarda, conservação, manutenção e limpeza dos equipamentos, instrumentos e materiais utilizados, bem como do local de trabalho.

Sobre os riscos ambientais, o documento menciona exposição ao agente físico calor, constando a avaliação desse agente físico no CAT, emitido em 19/7/2023, o que dispensou as medições do calor pelo perito durante a diligência”, ressaltou a julgadora.

Para a magistrada, a constatação da presença de calor além dos limites de tolerância no ambiente de trabalho da auxiliar de cozinha é indiscutível. “A prova oral produzida confirma que as refeições eram preparadas na unidade de trabalho da reclamante, sem interrupção durante a pandemia. Portanto, prevalece a conclusão do laudo quanto à exposição da reclamante ao agente físico calor durante todo o período laborado”.

Quanto à exposição a agentes biológicos, a julgadora discordou da conclusão pericial. Isso porque não houve prova de que o hospital efetivamente se dedicava a prestar auxílio a paciente para se sentar ou levantar das cadeiras do refeitório. “É vaga a declaração obtida da trabalhadora a esse respeito. Ela afirmou que, antes da pandemia, entregava as refeições diretamente aos pacientes e, durante a pandemia, as refeições eram colocadas nos salões, com a entrega feita pelas técnicas de enfermagem e enfermeiras, nada mais dizendo sobre a possibilidade de contato físico com os pacientes, apesar de ter sido indagada especificamente sobre isso”.

Nesse contexto, a relatora entendeu que não é possível reconhecer que as atividades de trabalho envolviam o contato permanente com pacientes, não se caracterizando a insalubridade pela mera proximidade com eles durante a entrega das refeições em bandeja. A desembargadora ressaltou ainda que não é o mero trabalho em ambiente hospitalar que enseja o adicional de insalubridade. “O contato permanente com pacientes potencialmente infectados e o manuseio de objetos de uso deles, não previamente esterilizados, é o que caracteriza o risco da atividade, o que não se verifica no caso”.

Apesar de afastado o laudo quanto à caracterização da insalubridade por agentes biológicos, o voto condutor concluiu que deve ser mantida a condenação ao pagamento do adicional de insalubridade pela presença do agente físico calor no ambiente de trabalho por todo o período trabalhado. A perícia técnica não foi desmentida nesse aspecto.