segunda-feira, 9 de dezembro de 2024

Arma ilegal na posse de traficante pode ser crime autônomo se não houver prova de relação entre os delitos


 

Arma ilegal na posse de traficante pode ser crime autônomo se não houver prova de relação entre os delitos

Se não ficar demonstrado no processo que a arma de fogo era usada no contexto do tráfico de drogas, ou seja, para assegurar o sucesso deste segundo delito, ambos os crimes serão punidos de forma autônoma – situação pior para o réu, pois as penas serão somadas. Por outro lado, caso seja provado que a posse ou o porte ilegal da arma servia para a prática do tráfico, a pena deste último será aumentada na fração de um sexto a dois terços.

O entendimento foi fixado pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar o Tema 1.259 dos recursos repetitivos, sob a relatoria do ministro Reynaldo Soares da Fonseca. Segundo ele, a controvérsia dizia respeito à hipótese de "absorção do crime de porte ou posse ilegal de arma de fogo pelo delito de tráfico de drogas majorado, nos termos do artigo 40, inciso IV, da Lei 11.343/2006, em detrimento do concurso material".

O ministro afirmou que o princípio da consunção resolve o conflito aparente de normas penais quando um delito se revela meio necessário ou normal na fase de preparação ou execução de outro crime. "Nessas situações, o agente apenas será responsabilizado pelo último crime. Para tanto, porém, é imprescindível a constatação do nexo de dependência entre as condutas, a fim de que uma seja absorvida pela outra", disse.

Entendimento já era pacífico nas turmas de direito penal

De acordo com o relator, as turmas de direito penal do STJ já haviam adotado a compreensão de que, quando o uso da arma está diretamente ligado ao sucesso dos crimes previstos nos artigos 33 a 37 da Lei de Drogas, ocorre a absorção do delito de porte ou posse de arma de fogo. Do contrário, haverá o reconhecimento do concurso material, e nesse caso as penas dos dois crimes serão somadas.

Segundo o ministro, o entendimento do STJ sobre a possibilidade de absorção "parte da premissa de que a posse ou o porte de arma de fogo, nesses casos, é apenas um meio instrumental para viabilizar ou facilitar a prática do crime de tráfico de drogas. A arma de fogo, nesse contexto, não é considerada um delito autônomo, mas uma ferramenta essencial para a execução do crime principal, ou seja, o tráfico. Dessa forma, a conduta referente à arma de fogo é absorvida pela prática do outro delito, evitando, assim, a duplicidade de punição", declarou.

Para Reynaldo Soares da Fonseca, essa interpretação garante uma aplicação mais coerente das penas e evita a sobrecarga penal injustificada quando os crimes estão intrinsecamente conectados.

A tese repetitiva foi fixada nos seguintes termos: "A majorante do artigo 40, inciso IV, da Lei 11.343/2006 aplica-se quando há nexo finalístico entre o uso da arma de fogo e o tráfico de drogas, sendo a arma usada para garantir o sucesso da atividade criminosa, hipótese em que o crime de porte ou posse ilegal de arma é absorvido pelo tráfico. Do contrário, o delito previsto no Estatuto do Desarmamento é considerado crime autônomo, em concurso material com o tráfico de drogas".


Fonte: STJ

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1994424REsp 2000953

Procuração de pessoa jurídica não perde validade com a morte do sócio que a assinou


 

Procuração de pessoa jurídica não perde validade com a morte do sócio que a assinou

A procuração outorgada por pessoa jurídica aos seus advogados não perde a validade com o falecimento do sócio que assinou o instrumento de mandato, uma vez que a personalidade jurídica da sociedade empresária é distinta da dos seus sócios e representantes legais.

Com esse entendimento, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou o pedido do município de Blumenau (SC) para que fosse exigida a regularização da procuração outorgada ao advogado de uma empresa de publicidade, devido à morte dos representantes legais da pessoa jurídica no curso de uma ação de execução fiscal.

Para o município, essa situação deixou a empresa sem representante legal, e a procuração anteriormente outorgada por ela precisaria ser regularizada, sob pena de nulidade absoluta dos atos processuais praticados pelo advogado – que estaria sem procuração válida nos autos.

Validade do mandato prevalece até a sua revogação

Segundo o relator do caso no STJ, ministro Afrânio Vilela, a jurisprudência da corte considera que a morte da pessoa física que subscreveu o instrumento de procuração, outorgando ao advogado a representação da empresa, "não interfere na validade do mandato assinado por quem de direito no momento da prática do ato civil".

Em seu voto, ele destacou decisões da Quarta Turma no sentido de que a morte do sócio não implica automaticamente a dissolução da pessoa jurídica, de modo que o mandato validamente outorgado tem sua vigência enquanto não for revogado.

O ministro explicou que o artigo 6º, parágrafo 1º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), em conjunto com o artigo 682, I a IV, do Código Civil, estabelecem que o negócio jurídico produz efeitos a partir de sua celebração.

"Se realizado de forma válida no momento em que ocorreu, o mandato concedido no caso específico deve prevalecer até que ocorra sua revogação, renúncia, extinção da pessoa jurídica ou mudança de estado que impeça a atuação do mandatário", disse.

Leia o acórdão no REsp 1.997.964.

Fonte: STJ

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Saiba o significado de termos publicados nesta notícia:
    Fim do significado dos termos apresentados.

    Ministro dá habeas corpus para dispensar mulher grávida de usar tornozeleira eletrônica durante o parto


     

    Ministro dá habeas corpus para dispensar mulher grávida de usar tornozeleira eletrônica durante o parto

    O ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), concedeu habeas corpus a uma mulher grávida para que ela não seja obrigada a usar tornozeleira eletrônica durante o parto. De acordo com o processo, a mulher, investigada pelos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico, estava submetida à monitoração eletrônica desde agosto deste ano.

    Ao pedir a revogação da medida, a defesa a considerou "extremamente gravosa" em função do estado gestacional. Apontou que os tribunais devem considerar em seus julgamentos a Resolução 492/2023 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a qual manda observar o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, bem como o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, que dispõe sobre a priorização de medidas menos gravosas para gestantes.

    Em liminar, a defesa requereu que o uso da tornozeleira fosse suspenso pelo menos até o fim do estado puerperal.

    Mais atenção à preservação da dignidade da mulher

    Na decisão, Og Fernandes comentou que, embora as cautelares determinadas pela Justiça sejam adequadas às circunstâncias dos crimes supostamente cometidos, a imposição do monitoramento eletrônico no momento do parto é desproporcional. Segundo o ministro, a mulher em trabalho de parto fica sujeita a uma situação de vulnerabilidade física e mental, o que exige mais atenção do Estado quanto à preservação de sua dignidade e integridade.

    "A imposição do uso do equipamento de monitoramento eletrônico durante o parto é desproporcional e excessiva, podendo ser substituída por medidas menos invasivas. Nesse contexto, torna-se adequada a limitação do monitoramento eletrônico da paciente ao período anterior ao início do trabalho de parto, a fim de garantir o direito da parturiente à dignidade e ao tratamento adequado", disse o magistrado.

    O ministro também determinou que o médico responsável informe ao juízo a data provável do parto, a fim de se definir o momento em que a monitoração será suspensa.

    Após o parto, segundo Og Fernandes, o uso da tornozeleira deverá ser retomado, mas respeitando um período mínimo de recuperação, "conforme determinação do juízo de origem, fundamentada na recomendação médica competente".

    Leia a decisão no HC 956.729.

    Fonte: STJ

    Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):HC 956729

    domingo, 8 de dezembro de 2024

    Justiça e direitos humanos: os reflexos dos julgamentos da Corte IDH nas decisões do STJ


     

    Justiça e direitos humanos são temas tão interligados que até se celebram em datas próximas: 8 de dezembro é o Dia da Justiça; 10 de dezembro, o Dia Internacional dos Direitos Humanos.

    Na Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pelas Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948 – aí a razão da data –, a justiça é citada logo na primeira frase do preâmbulo e se espalha por vários artigos do documento: nele constam garantias como o acesso aos tribunais no caso de violação de direitos, o julgamento por juiz imparcial e independente e a presunção de inocência.

    Essa conexão íntima segue em outros acordos internacionais, com destaque para a Convenção Americana de Direitos Humanos (1969), documento elaborado com o propósito de consolidar, como define o seu preâmbulo, "um regime de liberdade pessoal e de justiça social, fundado no respeito dos direitos essenciais do homem". Foi a convenção que instituiu a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH).



    Desde 2002, o Brasil se submete formalmente às sentenças proferidas pela corte internacional para fatos posteriores a 10 de dezembro de 1998 (
    Decreto 4.463/2002). A partir de eventual condenação, cabe ao Estado brasileiro adotar mecanismos para cumprimento da sentença e garantia das reparações determinadas pela Corte IDH. Os efeitos dos julgamentos da Corte Interamericana, contudo, vão além: eles servem como fundamento para a resolução de processos no Judiciário brasileiro.​​​​​​​​​

    Em 2022, o STJ sediou o 150º período de sessões da Corte IDH. Foram realizadas audiências públicas sobre quatro casos de supostas violações de direitos individuais e coletivos no Equador, no Peru, na Argentina e no México.
    No Superior Tribunal de Justiça (STJ), os entendimentos da Corte IDH têm sido aplicados de duas formas: ou por cumprimento direto das suas decisões, como no caso do Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho; ou pela adoção de fundamentos respaldados na jurisprudência do tribunal interamericano – e não apenas em processos que envolvem o Brasil, mas também em litígios de outros países –, a exemplo de precedentes do STJ sobre o direito de defesa no processo penal e os limites das diligências policiais.

    Todos os julgamentos da Corte IDH relativos ao Brasil podem ser vistos no portal do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), na área de Monitoramento e Fiscalização das Decisões do Sistema IDH. Os demais casos citados nesta reportagem trazem links para a decisão original da corte (em espanhol).

    As determinações da Corte IDH no caso do Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho

    Além da competência para proferir sentenças e atender a consultas dos Estados-membros, a Corte IDH é responsável por definir medidas provisórias (semelhantes às decisões liminares) em situações consideradas de extrema gravidade e urgência, ou quando é necessário evitar danos irreparáveis às pessoas.

    Em 2018, a corte emitiu decisão em medida provisória contra o Brasil para a adoção imediata de providências destinadas a proteger a vida e a integridade pessoal de todos os presos do Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho (IPPSC), no Rio de Janeiro. A decisão teve por fundamento a situação degradante e desumana verificada no presídio, em especial a superlotação e as instalações precárias da unidade, além das notícias de sucessivas mortes na penitenciária.  

    Entre as determinações da Corte IDH, estavam a proibição de ingresso de novos presos e a contagem em dobro do tempo de pena cumprido no instituto, salvo para os indivíduos condenados por crimes contra a vida, a integridade física ou a dignidade sexual – casos em que a diminuição da pena, em 50% ou menos, dependeria da avaliação do preso em perícia criminológica.

    Com base na medida provisória da Corte Interamericana, a Quinta Turma do STJ, em decisão inédita de 2021, determinou a contagem em dobro de todo o período que um preso passou no IPPSC, entre julho de 2017 e maio de 2019. O Ministério Público do Rio de Janeiro alegava que a contagem em dobro só seria válida a partir da intimação do Brasil sobre a decisão da Corte IDH, em 14 de dezembro de 2018.

    O relator do recurso, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, destacou que, ao se submeter à jurisdição da Corte IDH, o Brasil ampliou o rol de direitos das pessoas e o espaço de diálogo com a comunidade internacional, dando mais efetividade aos direitos humanos.

    Imagem de capa do card   

    sentença da Corte IDH produz autoridade de coisa julgada internacional, com eficácia vinculante e direta às partes. Todos os órgãos e poderes internos do país encontram-se obrigados a cumprir a sentença.

    RHC 136.961

    Ministro Reynaldo Soares da Fonseca


    De acordo com o relator, o argumento de que a decisão da Corte IDH só teria efeitos a partir do momento em que o Estado brasileiro tomou ciência dela – o que significaria não computar em dobro parte do tempo em que o apenado esteve no presídio – resultaria em desrespeito à ordem da corte internacional, tendo em vista que as suas decisões possuem eficácia imediata e efeito vinculante.

    "Os juízes nacionais devem agir como juízes interamericanos e estabelecer o diálogo entre o direito interno e o direito internacional dos direitos humanos, até mesmo para diminuir violações e abreviar as demandas internacionais. É com tal espírito hermenêutico que se dessume que, na hipótese, a melhor interpretação a ser dada é pela aplicação da resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos, de 22 de novembro de 2018, a todo o período em que o recorrente cumpriu pena no IPPSC", concluiu o ministro (RHC 136.961).

    STJ pediu apoio do CNJ para o cumprimento das determinações da Corte IDH

    Em outro caso relacionado ao IPPSC, a Sexta Turma, também em 2021, indicou ao CNJ que desse apoio à Justiça do Rio de Janeiro para o atendimento das determinações da Corte IDH.

    No processo analisado, o réu cumpriu pena no IPPSC por homicídios e roubo, o que tornava necessário o exame criminológico para verificação da possibilidade de contagem especial do tempo passado no instituto. O pedido de redução da pena, contudo, foi negado pelas instâncias ordinárias sob o argumento de falta de profissionais aptos a realizar a perícia.

    O relator do caso, ministro Sebastião Reis Junior, comentou que a pandemia da Covid-19, naquele momento, explicava ao menos em parte a dificuldade para a realização rápida do exame. Além disso, havia relatos de que realmente faltava pessoal habilitado para a análise criminológica, a qual, segundo a medida provisória da Corte IDH, deveria ser feita por uma equipe de, no mínimo, três profissionais, não sendo suficiente o parecer de um único especialista.

    Tendo em vista a necessidade de cumprir a medida e não prejudicar o apenado, a Sexta Turma determinou ao juízo das execuções penais que atuasse junto aos órgãos estaduais e até recorresse ao Sistema Único de Saúde (HC 660.332), se necessário, para assegurar a realização da perícia. O colegiado decidiu também informar ao CNJ a fim de que pudesse adotar providências para apoiar a Justiça do Rio de Janeiro no cumprimento da determinação da Corte IDH.

    O caso Favela Nova Brasília e a necessidade de investigação de atos de violência

    Em processo sob segredo de justiça, a Sexta Turma levou em consideração dois julgados da Corte IDH relacionados ao Brasil na análise de um pedido de reabertura de apuração sobre violência doméstica. A vítima sustentava que o inquérito foi arquivado prematuramente e sem justificativa plausível das autoridades.

    O primeiro julgado citado pela relatora, ministra Laurita Vaz (aposentada), foi o caso Favela Nova Brasília vs. Brasil. Trata-se de ação que resultou na responsabilização do Estado brasileiro por uma série de violações a direitos fundamentais – como a imparcialidade nas investigações policiais e o direito à integridade pessoal – em duas diligências da polícia na Favela Nova Brasília, no Rio de Janeiro, em 1994 e 1995, as quais resultaram na morte de 26 homens e em atos de violência sexual contra três mulheres.

    Imagem de capa do card   

    A Corte Interamericana de Direitos Humanos, ao proferir condenação contra o Brasil no caso Favela Nova Brasília vs. Brasil, reforçou que os países signatários da convenção têm o dever de, diante da notícia de violações de direitos humanos, agir com a devida diligência para promover uma investigação séria, imparcial e efetiva do ocorrido, no âmbito das garantias do devido processo.

    Processo sob segredo de justiça

    Ministra Laurita Vaz


    Segundo a ministra, chamou a atenção da Corte IDH o fato de que o Brasil arquivou vários inquéritos sobre o caso Nova Brasília sem que houvesse investigação prévia e diligente – quadro que, conforme o tribunal internacional, “foi decisivo para a impunidade dos fatos e a falta de proteção judicial dos familiares”.

    O outro precedente citado pela relatora foi o caso Barbosa de Souza e outros vs. Brasil, relativo ao homicídio de uma jovem em 1998, em João Pessoa, no qual se discutiu a violação de direitos e garantias judiciais, além da omissão do Estado ante sua obrigação de prevenir, investigar e punir a violência contra a mulher. 

    Nessa decisão, apontou a ministra Laurita Vaz, a Corte IDH fez um novo alerta ao Poder Judiciário brasileiro, destacando que a ineficácia judicial em situações de violência de gênero envia uma mensagem de tolerância que favorece a perpetuação social desse fenômeno e mantém a sensação de insegurança das mulheres.

    "O arcabouço normativo internacional, aliado aos apelos da Corte Interamericana quanto à necessidade de devida diligência do Estado brasileiro na investigação de violações de direitos humanos, em especial no âmbito da violência contra a mulher, demandam que se analise com maior atenção as alegações da recorrente no caso em apreço", afirmou a relatora, que cassou a decisão homologatória do arquivamento.

    A Guerrilha do Araguaia e o acesso às provas do inquérito policial

    Também em processo sob segredo judicial, a Sexta Turma examinou o pedido dos familiares de duas vítimas de homicídio para ter acesso às provas produzidas no inquérito policial.

    Ao deferir o pedido, o ministro Rogerio Schietti Cruz mencionou a decisão da Corte IDH no caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia) vs. Brasil, no qual o Estado foi condenado pelo desaparecimento de membros da Guerrilha do Araguaia (1972-1975), bem como pela falta de investigação a respeito.

    De acordo com Schietti, relator do recurso em mandado de segurança, no julgamento sobre a guerrilha do Araguaia a Corte Interamericana reforçou que as vítimas de violações de direitos humanos ou seus familiares devem contar com amplas possibilidades de serem ouvidos e atuarem nos respectivos processos – tanto para buscarem o esclarecimento dos fatos e a punição dos responsáveis quanto para pleitearem a reparação dos danos.

    Schietti também citou que, ao julgar o caso Favela Nova Brasília, a Corte IDH considerou que a vítima, no processo penal brasileiro, tem uma posição secundária e é tratada como mera testemunha, não tendo acesso regular às investigações.

    No mesmo julgamento, o relator demonstrou preocupação com o "desapreço" do Brasil em dar cumprimento satisfatório às sentenças proferidas pela Corte IDH. Nesse cenário, o ministro elogiou a Recomendação 123/2022 do CNJ, para que o Judiciário brasileiro utilize a jurisprudência da Corte Interamericana.

    Defesa tem direito de acessar os autos com tempo razoável antes do júri

    No HC 865.707, a Quinta Turma aplicou precedentes da Corte IDH em caso no qual o magistrado, diante da informação de que o advogado constituído pelo réu não poderia comparecer ao júri e do pedido de adiamento apresentado pela Defensoria Pública, nomeou defensor dativo menos de 24 horas antes do início da sessão de julgamento. O réu acabou condenado a 12 anos de prisão, em regime inicial fechado.

    A relatora do habeas corpus, ministra Daniela Teixeira, comentou que a Corte IDH, no caso Ruano Torres e outros vs. El Salvador, determinou aos Estados-membros a parametrização da defesa no sistema americano. Entre esses parâmetros, explicou, estão o desenvolvimento de atividade probatória mínima, a demonstração de conhecimento técnico do processo penal e o não abandono da defesa.

    Tendo a Defensoria Pública considerado insuficiente o tempo para a preparação da defesa em plenário, Daniela Teixeira disse que era dever do juízo de primeiro grau remarcar a sessão plenária e respeitar o prazo mínimo de dez dias previsto pelo artigo 456, parágrafo 2º, do Código de Processo Penal para que o defensor público analisasse os autos e pudesse conversar com o réu.

    "Em suma, não foi oportunizado ao paciente seu defensor público natural nem tempo hábil para que a defesa técnica realizasse uma defesa diligente no caso concreto, de acordo com as regras mínimas fixadas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos", concluiu a ministra ao anular a sessão do júri e determinar a realização de novo julgamento.

    Período noturno é mais propício a abuso de autoridade em diligências policiais

    A jurisprudência da Corte IDH sobre as diligências policiais noturnas foi discutida pela Sexta Turma em habeas corpus no qual a defesa alegava que a polícia entrou na casa do réu sem o seu consentimento e antes do amanhecer, o que se configuraria como causa de nulidade das provas obtidas na ocasião. 

    O ministro Rogerio Schietti, relator, destacou que a Corte IDH, no caso Valencia Campos e outros vs. Bolívia, ressaltou que o horário noturno é o período mais propício para as violações de direitos humanos, tendo em vista a redução da circulação de pessoas e da possibilidade de socorro ou de presença de testemunhas. Essas condições, segundo o tribunal internacional, são comprovadamente propícias para a prática de abusos em operações policiais.

    Ainda de acordo com a Corte IDH – declarou o ministro –, o ingresso da polícia em residências durante a noite só é admissível em situações absolutamente excepcionais, exigindo motivação concreta que justifique o fato de não ser realizado em horário diurno (processo em segredo de justiça).


    Fonte: STJ

    Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):RHC 136961HC 660332HC 865707

    STJ suspende decisão que impedia deportação de imigrantes ilegais retidos no Aeroporto de Guarulhos


     


    O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Herman Benjamin, acolheu pedido da União e suspendeu a liminar do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) que proibia a deportação de imigrantes ilegais retidos no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo.

    Na decisão, o ministro levou em consideração o grande número de pessoas que utilizam o Brasil apenas como corredor de passagem para outros países, a impossibilidade de manter os imigrantes aglomerados no terminal aeroportuário e os riscos sanitários e de segurança que eles podem representar.

    O presidente do STJ estendeu os efeitos da decisão para proibir a concessão de eventuais liminares semelhantes à do TRF3, em ações individuais ou coletivas, que autorizem de forma indiscriminada o ingresso ou a permanência de pessoas que pedem refúgio ou asilo no Brasil.

    Apesar de suspender os efeitos da liminar do TRF3, Herman Benjamin apontou que não há impedimento para que a Justiça analise os casos individuais relativos à imigração, desde que haja prova pré-constituída de vínculos da pessoa com o Brasil – especialmente nas situações de reunião familiar – e também prova de que o migrante tem a intenção de permanecer no país.

    Na liminar, acolhendo pedido da Defensoria Pública da União (DPU), o TRF3 considerou que os imigrantes poderiam, a qualquer momento, ser obrigados a deixar o Brasil sem a possibilidade de solicitar refúgio ou regularizar a sua situação migratória, o que violaria a Lei 9.474/1997 (Estatuto dos Refugiados). Ainda segundo o tribunal regional, as pessoas citadas pela DPU estão há semanas no Aeroporto de Guarulhos, vivendo em condições inadequadas.

    Mais de 97% dos imigrantes ilegais buscam chegar aos Estados Unidos

    O ministro Herman Benjamin comentou que, segundo dados da Polícia Federal, dos 8.300 requerimentos de refúgio formulados ao Brasil entre 2023 e 2024, apenas 117 resultaram em obtenção do registro nacional migratório, e somente 262 pessoas fizeram sua inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas.

    "Percebe-se que menos de 2,5% dos migrantes que entram irregularmente no país objetivam permanência e moradia no território nacional. Os outros 97,5% almejam, única e tão somente, alcançar outros destinos, valendo-se de suposto pedido de refúgio que não encontra guarida na realidade nem na ratio da lei", esclareceu o ministro.

    Segundo o presidente do STJ, as autoridades policiais brasileiras já identificaram uma rede profissional de tráfico internacional de pessoas que utiliza o Aeroporto de Guarulhos como principal porta de entrada na América do Sul. Depois de conseguirem entrar no Brasil – disse o ministro –, essas pessoas são transportadas para o Acre e, de lá, iniciam uma viagem com destino à fronteira dos Estados Unidos.

    "Inadmissível a utilização do nosso sistema normativo generoso para, com os olhos fechados, aceitar ou mesmo estimular o tráfico internacional de pessoas ou, indiretamente, prestigiar a atuação do crime organizado e de 'coiotes' que transformam o Brasil em entreposto para a sua atuação ilícita", declarou.

    Imigrantes estão em condições precárias de conforto e higiene

    De acordo com o ministro, devido à liminar do TRF3, o policiamento de fronteiras tem sido impedido de deportar os imigrantes ilegais que estão aglomerados na área restrita do Aeroporto de Guarulhos em condições precárias de conforto e higiene pessoal.

    "Além disso, a permanência daqueles migrantes no local oferece sério risco à segurança pessoal e sanitária deles, dos funcionários e do próprio terminal, que está sendo usado como local de confinamento – em espaço restrito e pequeno – de cidadãos cujas condições de saúde e antecedentes, inclusive criminais, se desconhecem", enfatizou.

    Ao suspender os efeitos da decisão do TRF3, o ministro destacou que o Brasil é signatário de diversos compromissos internacionais de prevenção e repressão ao tráfico de pessoas. "A manutenção desses migrantes no local onde estão, ou mesmo a permissão de ingresso no Brasil, viola frontalmente todos esses acordos, daí porque nenhuma solução judicial de caráter coletivo poderá prevalecer", concluiu.

    Leia a decisão na SLS 3.522.


    Fonte: STJ

    Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):SLS 3522

    sexta-feira, 6 de dezembro de 2024

    União indenizará moradora de Florianópolis que foi perseguida pela ditadura


     A Justiça Federal condenou a União a pagar R$ 100 mil de indenização por danos morais a uma mulher de 74 anos, que atualmente mora em Florianópolis, por perseguição política durante a ditadura militar. Ela abandonou a universidade, perdeu o emprego de professora e viveu em exílio na Albânia, Leste Europeu, entre 1974 e 1979. A sentença é da 2ª Vara Federal da capital catarinense e foi proferida ontem (4/12).

    “Muito embora a autora tenha recebido indenização pelos danos sofridos [a condição de anistiada política foi reconhecida pelo Ministério da Justiça em 2008], a Súmula nº 624 do Superior Tribunal de Justiça prevê ser possível cumular a indenização do dano moral com a reparação econômica da Lei nº 10.559/2002 (Lei da Anistia Política), uma vez que aquela indenização pretende reparar danos econômicos, ao passo que a indenização por danos morais visa a reparar eventuais dissabores extrapatrimoniais”, afirmou a juíza Adriana Regina Barni.

    A autora era militante da denominada Ação Popular, movimento de oposição à ditadura, e acadêmica do curso de Ciências Sociais da Unicamp, que deixou em 1973, período em do desaparecimento de um líder estudantil de que era amiga. Para se proteger da perseguição, ela viveu na clandestinidade e usou um nome falso, inclusive para registrar a filha com o atual companheiro, com quem casara à época, ele também anistiado e indenizado. Na Albânia, trabalhou como jornalista na seção de língua portuguesa da Rádio Tirana.

    Ela ainda afirmou que, mesmo com a Lei da Anistia e o retorno ao Brasil, continuou sob vigilância. Por causa de seu trabalho no jornal Tribuna da Luta Operária, respondeu a um inquérito com base na Lei de Segurança Nacional.

    Em sua defesa, a União chegou a requerer a compensação do valor pago a título de reparação econômica. A juíza entendeu que não é cabível “o desconto do valor pago administrativamente, uma vez que, conforme já explanado acima, as indenizações visam a reparar danos distintos”, concluiu. Cabe recurso.

    Banco deve indenizar por compra indevida com cartão de crédito, mesmo com uso de CVV


     A Caixa Econômica Federal (CEF) deverá indenizar uma cliente de 81 anos, moradora de Florianópolis, por compras indevidas realizadas pela Internet com cartão de crédito, ainda que com número e código de segurança (CVV, sigla em inglês para Card Verification Value) corretos. A 2ª Vara Federal da Capital entendeu que a instituição emissora do cartão não demonstrou a responsabilidade da cliente e que o sistema tinha fragilidade por não exigir senha.

    “Como se trata de transações online sequer é necessário o uso de senha pessoal, bastando apenas o número do cartão, o código de segurança (impresso no cartão e acessível a qualquer pessoa que o manuseie ou, ainda, por meio de fraude eletrônica) e dados pessoais do titular, o que torna essa espécie de compra insegura por natureza, porque essas informações podem ser obtidas por terceiros sem grandes dificuldades”, afirmou o juiz Alcides Vettorazzi, em sentença proferida ontem (5/12).

    O juiz considerou que o sistema apresenta “notória fragilidade” e que o banco tem obrigação de “desenvolver recursos e tecnologias aptas a obstar compras fraudulentas, independentemente de qualquer ação do consumidor, especialmente quando a relação envolve pessoa idosa, hipervulnerável, como ocorre na espécie”. Vettorazzi citou precedentes do TRF4 e do STJ que reconhecem a necessidade de as instituições bancárias aumentarem as medidas de precaução.

    As compras aconteceram em agosto de 2022, quando a cliente tinha 78 anos, e causaram prejuízo de cerca de R$ 6 mil. Parte do dinheiro (R$ 4,3 mil) foi restituído pela própria plataforma, mas a titular do cartão não conseguiu recuperar o restante e recorreu à via judicial. A CEF deverá pagar R$ 1.684,23 referentes às despesas indevidas e R$ 3 mil de indenização por danos morais.

    “Cumpria à CEF comprovar de forma clara que as compras contestadas realmente haviam sido realizadas pela autora, juntando, por exemplo, dados de cada transação, tais como titular do cadastro que realizou a compra, endereço de entrega etc, informações que poderiam ser obtidas com os fornecedores”, concluiu o juiz. Cabe recurso.



    Pensão especial para vítimas da síndrome de Talidomida pode ser cumulada com o benefício assistencial de prestação continuada


     


    A 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a sentença que determinou o restabelecimento do benefício assistencial de prestação continuada (BPC/Loas), pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), a uma pessoa com deficiência cumulado com o benefício da pensão especial vitalícia designado às vítimas da “síndrome da Talidomida”.

    Consta nos autos que a autora recebia há anos o benefício assistencial de prestação continuada destinado à pessoa com deficiência. No entanto, após obter a concessão da pensão especial vitalícia atribuída às vítimas da “síndrome da Talidomida”, o INSS suspendeu o pagamento do BPC alegando não ser possível o acúmulo dos dois benefícios.

    Ao analisar o caso, o relator, desembargador federal Rui Gonçalves, destacou a alteração introduzida pela Lei n. 12.435/11 no § 4º do art. 20 da Lei n. 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social) que passou a permitir a cumulação do BPC/Loas com pensões especiais de natureza indenizatória.

    Além disso, o magistrado ressaltou que a legislação da autarquia previdenciária também reafirmou a natureza indenizatória da pensão especial às pessoas com deficiência pela síndrome da Talidomida e admitiu a possibilidade de cumulação conforme o art. 485 da Instrução Normativa PRES/INSS n. 128/22.

    Com isso, o Colegiado, por unanimidade, negou a apelação do INSS e afastou a aplicação da multa diária no valor de R$ 500,00 fixada pelo juízo de origem.

    Processo: 1001089-76.2020.4.01.4300

    Indevida a transferência para o Tesouro Nacional do saldo de caderneta de poupança por falta de recadastramento de correntista


     


    A 12ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) acatou o pedido de devolução dos valores depositados em conta poupança por um correntista e determinou que o valor a ser restituído deverá ser corrigido monetariamente de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, acrescido de juros de mora em 12% ao ano. Ao julgar a ação para reaver os valores, o juiz sentenciante extinguiu o processo reconhecendo a prescrição do direito de ação do autor.

    O requerente alega que havia em sua conta poupança no Banco do Estado de Goiás S/A na cidade de Silvânia/GO, hoje denominado Banco Itaú S/A, o saldo no valor de R$ 36.833,71 que foi transferido ao Tesouro Nacional ante a falta do recadastramento determinado pelas Leis 9.526/97 9.8214/99.

    Segundo a relatora, juíza federal Jaqueline Conesuque Gurgel do Amaral, a prescrição deve ser afastada, haja vista a data da propositura da ação e tratando-se de um contrato de depósito, cumpria ao banco depositário guardar, conservar a coisa depositada e restituí-la “com os frutos e acrescidos quando lhe exigir o depositante ou comprovar que imposição legal o impeliu a transferir os valores depositados em seu poder à conta do Tesouro Nacional”.

    Como a Constituição Federal garante o direito de propriedade, sustentou a magistrada, a Lei 9.526/97 violou os princípios constitucionais ao determinar que os saldos bancários não reclamados seriam recolhidos ao Tesouro Nacional, o que desrespeita o direito de propriedade assegurado constitucionalmente e implicaria enriquecimento ilícito da União.

    Assim, indevida a transferência para o Tesouro Nacional do saldo existente na caderneta da parte autora, motivo pelo qual a União deverá restituir o valor respectivo, concluiu a relatora.

    Processo: 0003520-37.2004.4.01.3500

    Empresas com nomes semelhantes podem ser registradas na mesma localidade desde que possuam ramos de atuação distintos


     


    A 12ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), de forma unânime, deu provimento à apelação de uma empresa que atua na extração de minérios e comércio de produtos químicos contra a sentença que julgou improcedente o seu pedido que objetivava a proteção do seu nome comercial mediante o arquivamento de atos constitutivos na Junta Comercial do Estado de Rondônia. O juiz sentenciante entendeu que os atos da instituição não poderiam ser arquivados porque existia outra empresa com nome semelhante já registrada na localidade.

    A relatora do caso, juíza federal convocada Carina Cátia Bastos de Senna, destacou que, embora os nomes empresariais compartilhem semelhanças, os elementos adicionais e as atividades distintas tornam as empresas suficientemente diferenciáveis. A apelante atua em mineração, produtos químicos e commodities agrícolas, enquanto a outra empresa trabalha no varejo de peças automotivas e serviços de manutenção de veículos.

    Essa divergência de ramos econômicos elimina o risco de confusão entre os consumidores, respeitando o princípio da especificidade. “Resta clara a impossibilidade de serem feitas quaisquer confusões entre uma empresa destinada, primordialmente, à exploração de atividade de extração e comércio de minérios e produtos químicos com outra sociedade destinada a vender, no varejo, peças e acessórios para veículos automotores, além de serviços de manutenção e reparação de automóveis, caminhões, ônibus e outros veículos pesados”, sustentou a magistrada.

    Citando jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a relatora destacou que a proteção de nomes comerciais e marcas não exige novidade absoluta, mas deve considerar o segmento de atuação, reforçando que a especificidade impede confusão. Assim, o voto da relatora foi no sentido de determinar que a Junta Comercial do Estado de Rondônia (JUCER) proceda ao arquivamento da extensão da denominação social da autora, reformando a decisão de origem.

    Processo: 0000985-76.2007.4.01.4100

    Presença de enfermeiro é necessária durante todo o período de funcionamento do hospital para cuidados de maior complexidade



    A 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), de forma unânime, negou a apelação do Conselho Regional de Enfermagem da Bahia (Coren-BA) contra a sentença que julgou improcedente o pedido que objetivava determinar a contratação de enfermeiros para suprir a falta de profissionais em setores diversos de um hospital estadual.

    O Coren-BA sustentou que “a ausência de profissionais de enfermagem suficientes, especialmente enfermeiros, coloca em risco a qualidade do atendimento prestado pelo hospital” e que “a supervisão de técnicos de enfermagem sem a presença de enfermeiros viola a Lei nº 7.498/1986”.

    Segundo o relator do caso, desembargador Hercules Fajoses, a Lei nº 7.498/1986 e o Decreto nº 94.406/1987 estabelecem regras para o exercício da enfermagem e suas atividades auxiliares. Os técnicos e auxiliares de enfermagem devem ter habilitação legal, estar inscritos no Conselho Regional de Enfermagem e atuar sob orientação e supervisão de enfermeiros. “A necessidade da presença de enfermeiro durante todo o período decorre de interpretação sistemática da lei, não só em razão de suas funções como orientador e supervisor dos profissionais de enfermagem de nível médio, mas, também, em decorrência da competência privativa para os “cuidados de enfermagem de maior complexidade técnica e que exijam conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas’”, disse.

    O magistrado entendeu que o Coren-BA, como autarquia federal, tem legitimidade para fiscalizar e acionar judicialmente instituições que não atendam às normas, mas não pode fixar quantitativo exato de profissionais devido à ausência de previsão legal. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e de outros Tribunais Regionais Federais reforça a obrigatoriedade de enfermeiros em quantidade suficiente, mas ressalta que normas como as resoluções do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) possuem caráter orientador, não coercitivo. O cumprimento efetivo das exigências deve ser comprovado pelas instituições de saúde, sendo necessária a análise de cada caso concreto para avaliar a adequação ao que estabelece a legislação.

    “Quanto ao pedido de necessidade de permanência de enfermeiro durante todo o período de funcionamento das instituições de saúde, observa-se que o estado apelado comprovou que mantém profissionais necessários para que possa atingir o fim pretendido pela Lei nº 7.498/1986”, concluiu.

    Processo: 1077795-88.2023.4.01.3300

    Ex-empregadora não é responsável por morte de engenheiro por "síndrome da classe econômica"


     Resumo:

    • Um engenheiro morreu de embolia pulmonar após uma viagem longa, e sua família processou seus dois últimos empregadores, alegando que as frequentes viagens teriam causado sua morte.
    • As instâncias anteriores da Justiça do Trabalho consideraram os dois empregadores responsáveis, mas a 1ª Turma do TST absolveu a penúltima empresa.
    • A decisão fundamentou-se no laudo do perito, que disse que a última viagem, mais longa e realizada pouco antes da morte, foi o fator determinante para o desencadeamento da doença.


    3/12/2024 - A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho isentou a XL Brazil Holdings Ltda., de São Paulo (SP), da responsabilidade pela morte de um engenheiro por embolia pulmonar, desencadeada por imobilidade prolongada em viagens longas de avião - cohecida como "síndrome da classe econômica". Ele havia sido dispensado 10 meses antes, e, conforme a perícia médica, a causa do falecimento foi a última viagem aérea internacional, de longa duração, na semana anterior.

    Engenheiro fazia muitas viagens a serviço

    O engenheiro trabalhou para a XL de 2009 a fevereiro de 2013, como consultor sênior de prevenção de perdas. Em seguida, foi contratado pela Global Risk Consultores (Brasil) Ltda. 

    A viúva ajuizou, em nome dela e de dois filhos pequenos, ação contra as duas últimas empregadoras. Segundo ela, o marido era submetido a “um regime exagerado e excessivo de viagens” para países como Costa Rica, Panamá, Colômbia, Argentina, Bolívia e Uruguai e para dezenas de cidades brasileiras. 

    Segundo seu relato, em novembro de 2013, ao retornar de uma viagem por toda a América Central, com duração de 56 horas em uma semana, ele apresentou inchaço no pé esquerdo e dores nas pernas, e foi diagnosticada a trombose venosa profunda e o tromboembolismo pulmonar. Ele foi internado e morreu 36 horas depois, aos 37 anos.

    Na ação, a viúva sustentou que a doença teria sido causada pelo excesso de tempo de viagens.

    Perícia relacionou doença à “síndrome da classe econômica”

    O juízo de primeiro grau reconheceu a responsabilidade da XL e da Global pela doença e condenou as duas empresas a pagar indenizações por danos materiais e morais. 

    A perícia atestou que a quantidade de viagens e o tempo de duração contribuíram para o desenvolvimento do trombo na perna esquerda, que se deslocou e atingiu o pulmão. Segundo o laudo, a principal causa da doença é a imobilidade prolongada no avião, em razão do espaço reduzido entre as poltronas, aliada à baixa oxigenação de cabines de aeronaves, que influenciam o aparecimento da trombose venosa profunda. 

    O perito ainda considerou a segunda empresa responsável pela falta de orientação para uso de meias elásticas e circulação na aeronave e, também, por não ter feito uma avaliação médica adequada. 

    A sentença foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP).

    Última viagem foi fator principal

    No recurso ao TST, a XL argumentou que o consultor não era mais seu empregado quando faleceu e que seria juridicamente impossível responsabilizá-la pelas indenizações. 

    O relator, ministro Amaury Rodrigues, destacou trechos do laudo pericial que explicam que a formação do trombo é repentina e que ele se desloca dentro do organismo tão logo é formado. O documento também registra que a última viagem teria sido o fator que culminou com a patologia. 

    Diante desse quadro, o relator concluiu que a morte do engenheiro não teve relação com as viagens a serviço na empresa anterior, uma vez que o vínculo de emprego foi extinto mais de 10 meses antes. 

    A decisão foi unânime.

    Processo: RRAg-609-96.2014.5.02.0038