terça-feira, 3 de março de 2020

STJ homologa decisão que condenou jogador do Bahia a pagar R$ 137 mil por ruptura de contrato



​​A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) homologou sentença do Tribunal Arbitral do Esporte (TAS/CAS), localizado na Suíça, que condenou o jogador José Élber Pimentel da Silva a pagar R$ 137 mil a um empresário pela ruptura de contrato de representação firmado entre eles. O atleta joga atualmente pelo Esporte Clube Bahia.

O contrato previa que o empresário representaria o jogador, de forma exclusiva, na negociação de qualquer acordo ou assunto relacionado à sua profissão de atleta do futebol. Pelos serviços prestados, o agente deveria receber 10% do valor bruto pago ao jogador em razão dos contratos negociados com sua participação.  

Segundo o empresário, o contrato teria validade até 2013; entretanto, em 2012, o jogador teria assinado outro contrato de representação com uma empresa de agenciamento esportivo. Por isso, o empresário instaurou procedimento arbitral no TAS/CAS, conforme previsto no contrato firmado entre as partes.

Após a sentença condenatória do tribunal arbitral suíço, os representantes do empresário tentaram notificar formalmente o jogador para o cumprimento da obrigação, porém sem sucesso. Em consequência, foi submetido ao STJ o pedido de homologação da decisão estrangeira.

Simpl​​ificação

Em contestação, a defesa do jogador alegou que não seria cabível a aplicação da Convenção de Haia ao caso, por ser a sentença arbitral um documento particular oriundo de instituição que não integra o sistema judiciário suíço – necessitando, portanto, da autenticação consular.

O relator do pedido de homologação, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, apontou que, de acordo com a Convenção sobre a Eliminação da Exigência de Legalização de Documentos Públicos Estrangeiros – promulgada no Brasil por meio do Decret​o 8.660/2016–, os atos notariais são considerados documentos públicos e, como tal, têm dispensada a formalidade de autenticação pelos agentes diplomáticos ou consulares, sendo suficiente para tal finalidade a aposição de apostila, emitida pela autoridade competente do Estado no qual o documento é originado – como aconteceu nos autos em discussão.

Segundo o ministro, como já decidido pela Corte Especial, o conceito de documento público para fins de aplicação da Convenção de Haia deve ser interpretado de maneira abrangente, “o que assegura o reconhecimento da autenticidade, de maneira simplificada, a um maior número possível de documentos, sendo o apostilamento meio hábil para a comprovação da autenticidade de assinatura, selo ou carimbo oficiais do Estado de origem apostos no documento legal estrangeiro”.

Ao homologar a sentença arbitral, Napoleão Nunes Maia Filho também considerou que a decisão suíça não ofende a soberania nacional, a dignidade da pessoa humana ou a ordem pública brasileira, e foi proferida por autoridade competente, eleita no contrato de representação.

Leia o acórdão.
Fonte: STJ – 03/03/2020

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):HDE 1940


Rescisória não permite analisar violação de lei não apontada pelo autor, mesmo em caso de ordem pública



A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a um recurso por entender que a ação rescisória fundada na violação a literal dispositivo de lei não permite ao seu julgador analisar matéria estranha àquela apontada na petição inicial, mesmo que a questão seja de ordem pública.

O colegiado reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) para julgar improcedente a ação rescisória ajuizada contra sentença favorável a um pedido de adjudicação de imóvel, objeto de contrato de compra e venda.

A empresa autora da rescisória alegou violação dos artigos 332382 e 397 do Código de Processo Civil (CPC) de 1973, sustentando que a negativa do pedido de produção de provas quanto a uma suposta simulação de compra e venda do imóvel justificaria a rescisão da sentença.

O TJRN julgou o pedido procedente, desconstituiu a sentença e determinou o prosseguimento da ação de adjudicação para discutir a eventual simulação de compra e venda – questão de ordem pública –, garantida a produção de provas.

Ônus do requeren​​​te

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso no STJ, explicou que a indicação de violação a literal dispositivo de lei é ônus do requerente, já que constitui a causa de pedir da rescisória e vincula o exercício da jurisdição pelo órgão competente para apreciá-la – no caso, o TJRN.

Segundo a ministra, não é possível ao julgador da rescisória examinar a decisão rescindenda para saber se teriam sido violados na sua literalidade outros dispositivos de lei, além daqueles apontados pelo autor do pedido.

Assim, o julgador da ação rescisória fundada no artigo 485, V, do CPC/1973 fica vinculado aos dispositivos de lei apontados na petição inicial como violados, e não pode examinar outras matérias – ainda que de ordem pública –, “sob pena de transformar a ação rescisória em mero sucedâneo recursal”.

Limite ultr​​​apassado

Ela lembrou que a rescisória proposta pela empresa está fundada na previsão do inciso V do artigo 485 do CPC/1973, tendo como causa de pedir as alegadas violações aos artigos 332, 382 e 397 do código.

Apesar disso, destacou, o juízo rescindente foi baseado no reconhecimento de que a sentença proferida na ação de adjudicação transgrediu literal disposição do artigo 303 do antigo CPC.

“Na hipótese dos autos, o juízo rescindente promovido pelo tribunal de origem ultrapassou os limites das causas de pedir deduzidas pelo autor na presente ação rescisória, além de não ter observado que o indeferimento da produção probatória e o julgamento antecipado da lide foram devidamente fundamentados”, afirmou Nancy Andrighi.

A relatora considerou que o indeferimento da produção de provas na ação de adjudicação do imóvel foi fundamentado pelo juiz e que não houve cerceamento de defesa ou violação dos dispositivos indicados.

Exaurimento de instâ​​ncia

Apesar do provimento do recurso especial, a ministra rejeitou o argumento da recorrente em relação à necessidade de exaurimento de instância como pré-requisito da ação rescisória.

Ainda que, na hipótese concreta, a requerente não tenha interposto apelação da sentença rescindenda, essa circunstância, por si mesma, não representa óbice ao cabimento da ação rescisória”, disse Nancy Andrighi.

O fato de não ter sido interposto algum recurso cabível – acrescentou, citando precedentes –, ou de tal recurso não ter invocado determinado dispositivo legal, não impede o exame de mérito da rescisória, “pois o essencial para tanto é que a decisão rescindenda tenha incidido em alguma das hipóteses de rescindibilidade previstas no artigo 485 do CPC/1973 – vigente à época do trânsito em julgado”.

Leia o acórdão.
Fonte: STJ – 03/03/2020

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1663326


Inclusão judicial do executado em cadastro de inadimplentes não dependede prévia recusa administrativa



Na verdade embora o juiz não esteja totalmente obrigado a conceder o requerimento de inclusão do nome de que deve no cadastro de inadimplentes, consoante o previsto pelo artigo 782, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil (CPC) de 2015, não é permitido ao magistrado condicionar a medida judicial à prévia recusa do registro por parte das entidades mantenedoras do cadastro.

A tese foi fixada pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) segundo o qual o acionamento do aparato judicial para inscrever o nome do devedor só teria justificativa caso fosse comprovada a recusa do pedido administrativo.

O recurso teve origem em agravo de instrumento interposto por empresa de fomento mercantil contra decisão de primeiro grau que, em fase de cumprimento de sentença, indeferiu o pedido de inscrição do nome do executado no cadastro de inadimplentes, sob o fundamento de que a medida é de iniciativa exclusiva do credor. A decisão foi mantida pelo TJPR.

Efetividade do pro​​cesso

O relator do recurso especial da empresa de fomento mercantil, ministro Marco Aurélio Bellizze, lembrou que o ordenamento jurídico brasileiro deve tutelar não apenas o reconhecimento do direito postulado pela parte no Judiciário, mas também a efetivação desse direito.

Como resultado dessa orientação – destacou o ministro –, o CPC/2015 criou diversos mecanismos para garantir a efetividade da tutela jurisdicional, a exemplo da possibilidade de protesto da decisão judicial transitada em julgado depois de ultrapassado o prazo para pagamento voluntário (artigo 517) e da constituição da hipoteca judiciária (artigo 495), entre outros.

“Além disso, estabeleceu-se a permissão para a adoção de medidas executórias atípicas, a fim de coagir indiretamente o executado a satisfazer a obrigação, dando maior efetividade ao processo civil, possibilitando, por exemplo, a restrição de alguns direitos, como a retenção de passaporte e/ou da Carteira Nacional de Habilitação”, apontou o relator.

Segundo Bellizze, uma das medidas executivas típicas é a possibilidade de inclusão do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes. Esse ato judicial, contudo, só é possível mediante requerimento da parte, nunca por iniciativa do juiz.

“Vale ressaltar que a medida prevista no artigo 782, parágrafo 3º, do CPC/2015 não impõe ao juiz o dever de determinar a negativação do nome do devedor, pois se trata de mera faculdade – em razão do uso da forma verbal ‘pode’ –, e não de uma obrigação legal, devendo ser analisadas as particularidades do caso concreto”, ponderou o ministro.

Requisi​​​to ilegal

No entanto, o relator ressaltou que o TJPR, ao condicionar a averbação à prévia recusa administrativa, criou requisito não previsto em lei. Ademais – enfatizou –, o entendimento está na contramão da sistemática trazida pelo CPC, a qual busca a máxima efetividade na tutela jurisdicional.

Bellizze afirmou que não há impedimento para que o credor requeira diretamente a inclusão do nome do devedor à gestora do cadastro de restrição de crédito, mas também não existe óbice para que esse pedido seja feito na via judicial, no curso da execução.

Como as instâncias ordinárias indeferiram o pedido de inscrição apenas com fundamento na falta de prévia recusa administrativa, Bellizze concluiu ser necessário o retorno dos autos ao TJPR, a fim de que sejam analisadas as circunstâncias do caso concreto para se verificar a necessidade da inscrição e o seu potencial de coagir o devedor a pagar a dívida.

Leia o acórdão.
Fonte: STJ – 03/03/2020

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1835778


segunda-feira, 2 de março de 2020

Estelionato e tráfico são alguns destaques da nova Pesquisa Pronta



​​A Secretaria de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) publicou a edição desta semana da Pesquisa Pronta, que tem por objetivo divulgar o entendimento da corte sobre questões jurídicas diversas. A pesquisa é organizada por grupos predefinidos (assuntos recentes, casos notórios e teses de recursos repetitivos) ou ramos do direito.

Este​lionato

Em julgamento relatado pelo ministro Reynaldo Soares da Fonseca, a Terceira Seção entendeu que, nos termos do artigo 70 do Código de Processo Penal, a competência será, em regra, determinada pelo lugar em que se consumou a infração; no caso do estelionato, tipificado no artigo 171 do Código Penal, a consumação se dá no local e no momento em que é auferida a vantagem ilícita (CC 167.025).

Ressa​​rcimento

O ressarcimento integral, no caso de estelionato, não extingue a punibilidade, segundo decidiu a Sexta Turma ao analisar recurso relatado pelo ministro Rogerio Schietti Cruz (RHC 75.903).

Tráfico de dro​​gas

De acordo com entendimento da Sexta Turma, em julgamento sob relatoria do ministro Nefi Cordeiro, caso tenha sido juntado laudo preliminar de constatação de cocaína, assinado por perito criminal, e estando corroborado pelas demais provas dos autos, a materialidade do crime de tráfico de drogas encontra-se devidamente comprovada, sendo dispensável a existência de laudo definitivo (AREsp 1.578.818).

Plano de sa​​úde

Para a jurisprudência do STJ, a rescisão unilateral de contrato de plano de saúde coletivo pela prestadora do serviço, no caso de pessoa jurídica com menos de 30 beneficiários, exige a apresentação de justificativa plausível, em virtude da vulnerabilidade desse grupo de usuários e em respeito aos princípios da boa-fé e da conservação dos contratos. O entendimento foi aplicado pela Terceira Turma, em processo sob relatoria do ministro Moura Ribeiro (REsp 1.823.727).

Hono​​rários

A Sexta Turma, sob relatoria do ministro Nefi Cordeiro, destacou que a Terceira Seção, ao julgar o REsp 1.656.322, sob o rito dos recursos repetitivos, firmou orientação no sentido de que as tabelas de honorários elaboradas unilateralmente pelos conselhos seccionais da OAB não vinculam o magistrado no momento de arbitrar o valor da remuneração do defensor dativo que atua no processo penal (REsp 1.709.424).

Fonte: STJ – 02/03/2020


Repetitivo discute prorrogação de plano de saúde para trabalhador que exige tratamento constante



​Sob o rito dos recursos repetitivos, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afetou dois recursos especiais para “definir a (im)possibilidade de prorrogação do prazo de cobertura previsto no parágrafo 1° do artigo 30 da Lei 9.656/1998 na hipótese de o beneficiário continuar precisando de constante tratamento médico para a moléstia que o acomete”. Cadastrada como Tema 1.045, a controvérsia tem relatoria do ministro Moura Ribeiro.

A lei assegura ao trabalhador – nos casos de rescisão do contrato de trabalho sem justa causa – o direito de se manter como beneficiário do plano, nas mesmas condições de cobertura assistencial, desde que assuma o pagamento integral do serviço de saúde, pelo prazo máximo de 24 meses.  

Na decisão de afetação, o colegiado não suspendeu a tramitação dos processos com a mesma controvérsia, por entender que a paralisação, por até um ano, poderia acarretar efeito diverso da celeridade e da segurança jurídica buscadas pelo regime dos recursos repetitivos.

“O quadro retratado mostra que se debaterá sobre o real direito personalíssimo à vida, que não deve sofrer limitações”, disse o ministro Moura Ribeiro.


Doen​​​ça grave

No REsp 1.836.823, representativo da controvérsia, uma operadora de plano de saúde recorreu de decisão que manteve um homem como beneficiário, após transcorridos 24 meses da rescisão do seu contrato de trabalho, em razão de ele estar em tratamento de doença grave. Para a empresa, mesmo nesses casos, deve ser observado o limite de tempo previsto na lei.

O relator ressaltou a importância do tema, diante da multiplicidade de recursos sobre a mesma questão jurídica e a necessidade de se evitarem decisões divergentes. Ele lembrou que a jurisprudência do STJ já reconheceu que a resilição unilateral pela operadora de plano de saúde, mediante prévia notificação, “não obstante seja em regra válida, revela-se abusiva quando realizada durante o tratamento médico que possibilite a sobrevivência ou a manutenção da incolumidade física do beneficiário”.

Recursos repe​​​titivos

O CPC/2015 regula, nos artigos 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica.

No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

Leia o acórdão de afetação no REsp 1.836.823.
Fonte: STJ – 02/03/2020

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1836823REsp 1839703


Associação pode assumir ação coletiva iniciada por outra mesmo sem autorização expressa dos associados



​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao acolher embargos de declaração, decidiu permitir que o Instituto Mineiro de Políticas Sociais e de Defesa do Consumidor (Polisdec) assuma o polo ativo de ação civil pública promovida por outro ente associativo que, no curso do processo, veio a se dissolver.

Em 2015, o colegiado havia negado essa possibilidade à Polisdec diante da posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no RE 573.232, com repercussão geral. O STF definiu que a legitimação para promover ação coletiva exige a autorização expressa dos associados para a defesa de seus direitos em juízo, seja individualmente, seja por deliberação em assembleia, não bastando a previsão genérica no respectivo estatuto.

Na ocasião, a Terceira Turma extinguiu sem análise do mérito a ação movida contra uma empresa de crédito acusada de estimular o superendividamento mediante publicidade supostamente abusiva. A ação foi movida pela Associação Nacional dos Consumidores de Crédito (Andec), a qual, no curso do processo, foi dissolvida por deliberação dos seus associados, tendo a Polisdec pedido para assumir o polo ativo.

Os ministros haviam concluído que, sob o aspecto da representação, seria inconciliável a situação jurídica dos então representados pela associação dissolvida com a dos associados do “novo ente associativo”, ainda que em tese os interesses discutidos na ação coletiva fossem comuns aos dois grupos de pessoas.

Alcance limit​​ado

No entanto, o relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, explicou que em 2018 o STF acolheu os embargos de declaração no RE 612.043 para esclarecer que o entendimento firmado alcança tão somente as ações coletivas submetidas ao rito ordinário, as quais tratam de interesses meramente individuais, sem índole coletiva, pois, nessas situações, o autor se limita a representar os titulares do direito controvertido, atuando na defesa de interesses alheios e em nome alheio – o que não ocorre nas ações civis públicas.

Segundo Bellizze, a partir da decisão do STF, o STJ retomou, em seus julgados, a compreensão anteriormente adotada de que, por se tratar do regime de substituição processual, a autorização para a defesa do interesse coletivo em sentido amplo é estabelecida na definição dos objetivos institucionais, no próprio ato de criação da associação, sendo desnecessária nova autorização ou deliberação em assembleia.

Para o ministro, no caso concreto, a substituição da Andec pela Polisdec “é plenamente possível, haja vista que o microssistema de defesa dos interesses coletivos privilegia o aproveitamento do processo coletivo, possibilitando a sucessão da parte autora pelo Ministério Público ou por algum outro colegitimado, mormente em decorrência da importância dos interesses envolvidos em demandas coletivas”.

O relator ressaltou que esse entendimento tem como base o parágrafo 3º do artigo 5º da Lei da Ação Civil Pública e o artigo 9º da Lei da Ação Popular. 

Leia o acórdão.


Fonte: STJ – 02/03/2020

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1405697


Quarta Turma afasta cobertura de fertilização in vitro com exclusão expressa no plano de saúde



​Por unanimidade, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não é abusiva a decisão de negar a cobertura, pelo plano de saúde, de tratamento de fertilização in vitro.

Para o STJ, determinar cobertura obrigatória da fertilização in vitro pode trazer indesejável repercussão no equilíbrio econômico-financeiro dos planos, o que prejudicaria os segurados e a própria higidez do sistema de suplementação privada de assistência à saúde.

“A fertilização in vitro não possui cobertura obrigatória, de modo que, na hipótese de ausência de previsão contratual expressa, é impositivo o afastamento do dever de custeio do mencionado tratamento pela operadora do plano de saúde”, afirmou o relator, ministro Marco Buzzi.

Exclusã​​​o expressa

No caso julgado, o contrato continha cláusula que excluía expressamente o tratamento pleiteado pela beneficiária.

A controvérsia teve origem em ação ajuizada por usuária de plano que, em razão de problemas de saúde (endometriose), teve recomendação médica de tratamento para engravidar por meio da técnica de fertilização in vitro.

Em primeiro grau, o pedido foi julgado improcedente, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo deu provimento ao recurso da mulher para obrigar o plano a custear o tratamento, sob o argumento de que é possível interpretação abrangente acerca do alcance do termo “planejamento familiar” contido na legislação para incluir a fertilização in vitro.

Equilíb​​rio

Para o ministro Marco Buzzi, as controvérsias envolvendo a cobertura de tratamentos pelos planos de saúde devem contemplar tanto o efetivo atendimento às necessidades clínicas dos pacientes/contratantes quanto o respeito ao equilíbrio financeiro das instituições de saúde suplementar.

Segundo o relator, a Resolução Normat​iva 192 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) indica que a inseminação artificial e o fornecimento de medicamentos de uso domiciliar não são de cobertura obrigatória, conforme o disposto nos incisos III e VI do artigo 10 da Lei 9.656/1998.

Para Buzzi, não seria lógico que o procedimento médico de inseminação artificial fosse de cobertura facultativa e a fertilização in vitro, que possui característica complexa e onerosa, tivesse cobertura obrigatória.

Prec​​edentes

“A interpretação deve ocorrer de maneira sistemática e teleológica, de modo a conferir exegese que garanta o equilíbrio atuarial do sistema de suplementação privada de assistência à saúde, não podendo as operadoras de planos de saúde serem obrigadas ao custeio de procedimentos que são, segundo a lei de regência e a própria regulamentação da ANS, de natureza facultativa, salvo expressa previsão contratual”, observou.

Ao citar diversos julgados, o ministro destacou que o entendimento predominante no STJ é de que os planos não têm a obrigação de custear a fertilização in vitro. Ele lembrou julgado recente da Terceira Turma (REsp 1.794.629) que deu provimento ao recurso de uma operadora para desobrigá-la de custear o tratamento.

Fonte: STJ – 02/03/2020


Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1823077


STJ define hipóteses de cabimento do agravo de instrumento sob o novo CPC



​​​Em dezembro de 2018, concluindo e decidindo o Recurso Especial 1.704.520, sob o rito dos recursos repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu o conceito de taxatividade mitigada do rol previsto no artigo 1.015 do Código de Processo Civil (CPC), abrindo caminho para a interposição do agravo de instrumento em diversas hipóteses além daquelas listadas expressamente no texto legal.

O agravo de instrumento é o recurso viável e cabível contra as decisões tomadas pelo juiz no curso do processo – as chamadas decisões interlocutórias –, antes da sentença.

Ao expor e anunciar seu voto no REsp 1.704.520, a ministra Nancy Andrighi, relatora, justificou que a enunciação, em rol pretensamente exaustivo, das hipóteses de cabimento do agravo revela-se insuficiente e em desconformidade com as normas fundamentais do processo civil, na medida em que sobrevivem questões urgentes fora da lista do artigo 1.015, as quais “tornam inviável a interpretação de que o referido rol seria absolutamente taxativo e que deveria ser lido de modo restritivo”.

Letra mor​ta

“Um rol que pretende ser taxativo raramente enuncia todas as hipóteses vinculadas a sua razão de existir, pois a realidade, normalmente, supera a ficção, e a concretude torna letra morta o exercício de abstração inicialmente realizado pelo legislador”, afirmou.

Por outro lado, pontuou a ministra, que uma interpretação extensiva ou analógica mostra-se igualmente ineficaz, “seja porque ainda remanescerão hipóteses em que não será possível extrair o cabimento do agravo das situações enunciadas no rol, seja porque o uso da interpretação extensiva ou da analogia pode desnaturar a essência de institutos jurídicos ontologicamente distintos”.

Ela frisou que outra corrente interpretativa, segundo a qual a destaca o artigo 1.015 seria puramente exemplificativa, de modo que em determinadas situações a recorribilidade da decisão interlocutória seria imediata, “ainda que a matéria não conste expressamente do rol ou que não seja possível dele extrair a questão por meio de interpretação extensiva ou analógica”.

Urgên​​cia


Então, nenhuma das três correntes mencionadas é a mais adequada para interpretar o artigo 1.015, segundo a relatora, que propôs uma tese baseada no requisito da urgência como critério para a admissão do agravo fora das situações da lista. Com isso, acrescentou, atende-se ao objetivo do legislador, que, pretendendo restringir a utilização do recurso, limitou seu cabimento a uma relação de hipóteses nas quais não seria possível esperar pelo julgamento da apelação.

“Trata-se de reconhecer que o rol do artigo 1.015 do CPC possui uma singular espécie de taxatividade mitigada por uma cláusula adicional de cabimento, sem a qual haveria desrespeito às normas fundamentais do próprio CPC e grave prejuízo às partes ou ao próprio processo”, declarou a magistrada.

“O rol do artigo 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação”, concluiu Nancy Andrighi ao definir a tese adotada no Tema 988 dos recursos repetitivos.

A tese estabelecida no repetitivo orientou a solução de diversos recursos que trouxeram ao STJ questionamentos sobre a aplicação, inciso por inciso, do artigo 1.015. Conheça abaixo algumas das decisões mais importantes do tribunal sobre o agravo de instrumento no novo CPC.

Regimes dis​​tintos

Em abril de 2019, a Terceira Turma entendeu que cabe agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias proferidas em liquidação e cumprimento de sentença, no processo executivo e na ação de inventário.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso (que tramitou em segredo judicial), disse que a opção do legislador foi “estabelecer regimes distintos em razão da fase procedimental ou de especificidades relacionadas a determinadas espécies de processo”.

Ela explicou que o caput do artigo 1.015 é aplicável somente à fase de conhecimento, conforme orienta o parágrafo 1° do artigo 1.009 do CPC – o qual, ao tratar do regime de preclusões, limita o alcance do primeiro dispositivo às questões resolvidas naquela fase.

Em seu voto, Nancy Andrighi lembrou que o parágrafo único do artigo 1.015 excepciona a regra do caput e dos incisos, ditando um novo regime para as fases subsequentes à de conhecimento (liquidação e cumprimento de sentença), para o processo executivo e o inventário.

Em outro caso, ao analisar o REsp 1.736.285, o colegiado reforçou o entendimento de que na liquidação e no cumprimento de sentença, no processo de execução e na ação de inventário, há ampla e irrestrita recorribilidade de todas as decisões interlocutórias.

No voto acompanhado pelos demais ministros do colegiado, a ministra Nancy Andrighi anotou que a doutrina jurídica é uníssona nesse sentido.

Falência e rec​​uperação

No caso de microssistemas específicos, a interpretação pode ser diferente da definida pela corte para o artigo 1.015. Em setembro de 2019, a Segunda Seção afetou três recursos especiais para julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, nos quais decidirá acerca da possibilidade da interposição de agravo de instrumento contra decisões interlocutórias no âmbito de processos de recuperação judicial e falência (Tema 1.022).

A questão submetida a julgamento é a seguinte: “Definir se é cabível agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas em processos de recuperação judicial e falência em hipóteses não expressamente previstas na Lei 11.101/2005”.

A relatora dos processos afetados, ministra Nancy Andrighi, disse que é preciso definir se a questão jurídica do agravo nos processos de falência é idêntica àquela examinada pelo STJ no REsp 1.704.520.

Ela lembrou que, no julgamento de 2018, a Corte Especial se concentrou exclusivamente na interpretação do sistema procedimental e recursal das regras gerais do CPC de 2015, não tendo sido enfrentado o cabimento do agravo em procedimentos especiais e seus sistemas recursais específicos.

“Há, portanto, nítido distinguishing com a tese firmada no Tema 988, haja vista a questão jurídica de os recursos especiais ora em análise se referirem à matéria dos processos falimentares e recuperacionais, procedimento especial regido por sistema recursal próprio, no qual a averiguação do cabimento do agravo de instrumento envolve o exame de fatores diversos”, explicou a relatora.

Guarda de ​criança

Duas hipóteses de cabimento de agravo de instrumento analisadas pelo tribunal em 2019 dizem respeito ao direito de família. Ao julgar um processo sob segredo de justiça, a Terceira Turma decidiu que o agravo pode ser interposto contra a decisão interlocutória que determina busca e apreensão de menor para efeito de transferência de guarda, uma vez que tal hipótese, no entendimento do colegiado, encaixa-se na regra do inciso I do artigo 1.015.

O ministro Villas Bôas Cueva, relator, apontou que, apesar das várias decisões da Justiça estadual no caso, a guarda da criança foi concedida ainda em caráter provisório. Assim, tratando-se de decisão interlocutória sobre tutela provisória, o ministro entendeu ser perfeitamente cabível a interposição de agravo de instrumento.

Além disso, o relator lembrou a taxatividade mitigada do rol do artigo do CPC, o que implica a admissão do agravo em hipóteses não contempladas naquela lista, desde que o critério de urgência esteja presente.

Para o ministro, ainda que se entendesse não ser o caso das tutelas provisórias previstas no inciso I do artigo 1.015, “é indubitável que a questão relativa à guarda de menor envolve situação de evidente urgência a ser apreciada de forma imediata pelo tribunal”.

Data da sepa​ração

Em outro caso que também tramitou em segredo, a Terceira Turma entendeu que cabe agravo contra decisão interlocutória que fixa a data da separação de fato. Para o colegiado, essa decisão resolve parte do objeto litigioso, e por isso pode ser atacada por agravo de instrumento.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora, o CPC passou a reconhecer expressamente em seu artigo 356 o fenômeno segundo o qual pedidos ou parcelas de pedidos podem amadurecer em momentos processuais distintos, seja em razão de não haver controvérsia sobre a questão, seja em virtude da desnecessidade de produção de provas.

“Diante desse cenário, entendeu-se como desejável ao sistema processual, até mesmo como técnica de aceleração do procedimento e de prestação jurisdicional célere e efetiva, que tais questões possam ser solucionadas antecipadamente, por intermédio de uma decisão parcial de mérito, com aptidão para a formação de coisa julgada material”, apontou a relatora.

No caso dos autos, a ministra ressaltou que a questão relacionada à data da separação de fato do casal é, realmente, tema que versa sobre o mérito do processo, mais especificamente sobre uma parcela do pedido de partilha de bens. Por isso, explicou, a decisão proferida em primeiro grau é, na verdade, verdadeira decisão parcial de mérito, nos termos do artigo 356 do CPC.

Litisconsorte e​​ prescrição

Em maio de 2019, a Quarta Turma decidiu que, nos casos de pronunciamento judicial sobre a exclusão de litisconsorte, o questionamento pode ser feito via agravo de instrumento (nos termos do inciso VII do artigo 1.015), independentemente dos motivos jurídicos para essa exclusão. “É agravável, portanto, a decisão que enfrenta o tema da ilegitimidade passiva de litisconsorte, que pode acarretar a exclusão da parte”, afirmou o relator do REsp 1.772.839, ministro Antonio Carlos Ferreira.

O colegiado também entendeu, no mesmo julgamento, que as decisões interlocutórias que analisem temas relativos à prescrição e à decadência possuem natureza de mérito e, portanto, são atacáveis por agravo de instrumento, conforme previsto no artigo 1.015, inciso II.

Antonio Carlos Ferreira apontou que, diferentemente do CPC de 1973 – segundo o qual haveria decisão de mérito apenas quando o juiz pronunciasse a decadência ou a prescrição –, o artigo 487 do CPC/2015 estabelece que a resolução de mérito ocorre quando o magistrado decide, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência ou não de decadência ou prescrição.

“Desse modo, nos termos do código processual vigente, quando o magistrado decidir a respeito da prescrição ou da decadência – reconhecendo ou rejeitando sua ocorrência –, haverá decisão de mérito e, portanto, caberá agravo de instrumento com fundamento no inciso II do artigo 1.015 do CPC/2015”, declarou o ministro.

CDC ou Código Civil?

No julgamento do REsp 1.702.725, a Terceira Turma reconheceu o cabimento do agravo quando a decisão interlocutória em fase de saneamento resolve sobre o enquadramento fático-normativo da relação de direito existente entre as partes e versa também sobre prescrição ou decadência.

Uma empresa de transportes recorreu de julgado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que não conheceu de seu agravo de instrumento interposto contra decisão que reconheceu a existência de relação de consumo entre as partes e, como consequência, afastou a prescrição com base no Código de Defesa do Consumidor (CDC).

A companhia alegou violação ao inciso II do artigo 1.015 do CPC, segundo o qual cabe agravo contra as decisões interlocutórias que versem sobre o mérito do processo. Para a recorrente, a definição da legislação aplicável – se o CDC ou o Código Civil – é questão de mérito, especialmente diante de sua repercussão no prazo prescricional.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, ressaltou que é preciso diferenciar o mérito da questão (que trata do pedido elaborado pela parte em juízo) do enquadramento fático-normativo da causa de pedir, que é a relação jurídica subjacente ao pedido.

As decisões interlocutórias que versam sobre o mérito – explicou – formarão coisa julgada material se não forem impugnadas imediatamente, ao passo que o enquadramento fático-normativo pode sofrer ampla modificação pelo tribunal, por ocasião do julgamento da apelação.

De acordo com a ministra, se, a partir da subsunção entre fato e norma, houver decisão sobre a existência de prescrição ou decadência, o enquadramento fático-normativo se incorpora ao mérito do processo, “pois não é possível examinar a prescrição sem que se examine, igual e conjuntamente, se a causa se submete à legislação consumerista ou à legislação civil”.

Exigência de c​​ontas

Em razão das modificações nos conceitos de sentença e decisão interlocutória trazidas pelo CPC/2015, e considerando as diferentes consequências do pronunciamento judicial que reconhece ou não o direito de exigir contas, a Terceira Turma fixou o entendimento de que o agravo de instrumento será o meio de impugnação adequado quando o julgamento da primeira fase da ação de exigir contas for de procedência do pedido (decisão interlocutória com conteúdo de decisão parcial de mérito).

No entanto, se o julgamento nessa fase for pela improcedência ou pela extinção do processo sem resolução do mérito, o colegiado concluiu que o pronunciamento judicial terá natureza de sentença e será impugnável por apelação.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do REsp 1.746.337, afirmou que, na vigência do CPC/1973, não havia dúvidas de que cabia apelação contra sentença que julgava procedente a primeira fase da ação de prestação de contas. Todavia, o código de 2015 não só modificou o nome da ação (para “ação de exigir contas”), como determinou que a decisão – e não a sentença – que julgar o pedido procedente deve condenar o réu a prestar contas.

Segundo a relatora, a simples alteração de termos – de sentença no CPC/1973 para decisão no CPC/2015 – não é suficiente para se concluir que tenha havido modificação da natureza do ato que julga a primeira fase da ação, já que a sentença também teve seu conceito transportado de um critério finalístico (que colocava fim ao processo) para um critério cumulativo (finalístico e substancial).

De igual forma, a ministra disse que o CPC/2015 incorporou um novo conceito de decisão interlocutória, identificável a partir de um critério residual (todo pronunciamento judicial de natureza decisória que não seja sentença).

Efeito suspensiv​​o

A Terceira Turma também decidiu pelo cabimento do agravo de instrumento no caso de decisão interlocutória que indefere a concessão de efeito suspensivo aos embargos à execução de título extrajudicial.

A questão chegou ao STJ após o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) não conhecer do agravo interposto pelo sócio de uma empresa em recuperação judicial, no qual pedia a concessão de efeito suspensivo aos embargos à execução, para impedir o prosseguimento da execução individual movida contra ele por créditos sujeitos à recuperação.

Segundo a relatora do REsp 1.745.358, ministra Nancy Andrighi, a decisão sobre efeito suspensivo aos embargos à execução é, “indiscutivelmente, uma decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória, como, aliás, reconhece de forma expressa o artigo 919, parágrafo 1°, do CPC, que, inclusive, determina a observância dos requisitos processuais próprios da tutela provisória”.

A ministra explicou que a interposição imediata do agravo de instrumento contra decisão que indefere a concessão do efeito suspensivo é admissível com base no artigo 1.015, I, do CPC, “tornando absolutamente despicienda, a propósito, a regra adicional (mas incompleta) de cabimento prevista no artigo 1.015, X, do CPC”.

Exibição de docu​​mentos

Outro caso relatado pela ministra Nancy Andrighi na Terceira Turma diz respeito ao cabimento do agravo contra decisão que indefere requerimento para exibição de documentos. O colegiado interpretou a regra do inciso VI do artigo 1.015 do CPC e concluiu que essa hipótese de cabimento do agravo deve ser entendida de forma abrangente.

Em seu voto, a ministra lembrou que o artigo 1.015 é amplo e dotado de diversos conceitos jurídicos indeterminados, “de modo que esta corte será frequentemente instada a se pronunciar sobre cada uma das hipóteses de cabimento listadas no referido dispositivo legal”.

A relatora afirmou que o debate acerca do inciso VI se insere nesse contexto, exigindo a indispensável conformação entre o texto legal e o seu conteúdo normativo, a fim de que se possa definir o significado da frase “decisões interlocutórias que versarem sobre exibição ou posse de documento ou coisa”.

Ela ressaltou não haver dúvida de que a decisão que resolve o incidente processual de exibição instaurado contra a parte adversária e a decisão que resolve a ação incidental de exibição instaurada contra terceiro estão abrangidas pela hipótese de cabimento.

Contudo – destacou Nancy Andrighi –, ainda era preciso definir o cabimento na hipótese de decisão interlocutória sobre exibição ou posse de documento que é objeto de simples requerimento de expedição de ofício da própria parte no processo, sem a instauração de incidente processual ou de ação incidental – como ocorreu no caso em julgamento (REsp 1.798.939).

Outras hipó​teses

Ao longo de 2019, a ministra Nancy Andrighi relatou outros casos sobre o cabimento de agravo de instrumento, concluindo pela possibilidade nas hipóteses de decisão interlocutória que versa sobre a inversão do ônus da prova em ações que tratam de relação de consumo (REsp 1.729.110), admissão de terceiro em ação judicial com o consequente deslocamento da competência para Justiça distinta (REsp 1.797.991), decisão sobre arguição de impossibilidade jurídica do pedido (REsp 1.757.123) e também no caso de decisão que aumenta multa em tutela provisória (REsp 1.827.553).

Fonte: STJ – 01/03/2020


Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1704520REsp 1736285REsp 1717213REsp 1707066REsp 1712231REsp 1772839REsp 1702725REsp 1746337REsp 1745358REsp 1798939REsp 1729110REsp 1797991REsp 1757123REsp 1827553


sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Procuração com poderes gerais e irrestritos não serve ...



A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a um recurso para declarar a nulidade de escritura de compra e venda de imóvel por entender que, embora o negócio tenha sido feito com base em procuração que concedeu poderes amplos, gerais e irrestritos, tal documento não especificava expressamente o bem alienado – não atendendo, portanto, os requisitos do parágrafo 1º do artigo 661 do Código Civil.

Na ação que deu origem ao recurso, o dono do imóvel afirmou que outorgou procuração ao irmão para que este cuidasse do seu patrimônio enquanto morava em outro estado. Posteriormente, soube que um imóvel foi vendido, mediante o uso da procuração, para uma empresa da qual o irmão era sócio, e ele mesmo – o proprietário – não recebeu nada pela operação.

A sentença julgou improcedente o pedido de anulação da escritura e aplicou multa por litigância de má-fé ao autor da ação. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve a decisão, mas afastou a multa.

No recurso especial, o autor afirmou que o negócio é nulo porque foi embasado em procuração outorgada 17 anos antes, sem a delegação de poderes expressos, especiais e específicos para a alienação do imóvel, cuja descrição precisaria constar do documento.

Termos​ ge​rais

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, considerou que, de acordo com o artigo 661 do Código Civil, a procuração em termos gerais só confere poderes para a administração de bens do mandante.

Ela citou doutrina em reforço do entendimento de que atos como o relatado no processo – venda de um imóvel – exigem a outorga de poderes especiais e expressos, incluindo a descrição específica do bem para o qual a procuração se destina.

“Os poderes expressos identificam, de forma explícita (não implícita ou tácita), exatamente qual o poder conferido (por exemplo, o poder de vender). Já os poderes serão especiais quando determinados, particularizados, individualizados os negócios para os quais se faz a outorga (por exemplo, o poder de vender tal ou qual imóvel)” – explicou a ministra sobre a exigência prevista no parágrafo 1º do artigo 661 do CC/2002.

A relatora destacou que, de acordo com os fatos reconhecidos pelo TJMG no caso julgado, embora a procuração fosse expressa quanto aos poderes de alienar bens, não foram conferidos ao mandatário os poderes especiais para vender aquele imóvel específico.

“A outorga de poderes de alienação de todos os bens do outorgante não supre o requisito de especialidade exigido por lei, que prevê referência e determinação dos bens concretamente mencionados na procuração”, concluiu a ministra ao dar provimento ao recurso.

Leia o acórdão.
Fonte: STJ – 28/02/2020


Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1836584


Crédito de prêmio de seguro não repassado ...



Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o crédito titularizado pela seguradora, decorrente do descumprimento do contrato de representação de seguro – consubstanciado pelo não repasse dos prêmios –, submete-se aos efeitos da recuperação judicial.

Segundo o relator do recurso julgado pela turma, ministro Marco Aurélio Bellize, quando uma empresa funciona como agente de seguros e recebe os prêmios na condição de mandatária da seguradora, deve conservá-los em seu poder até o prazo estipulado, e depois disso deve repassá-los à sociedade de seguros.

“Nesse cenário, parece-me incontornável a conclusão de que o representante de seguro, ao ter em sua guarda determinada soma de dinheiro, em caráter provisório e com a incumbência de entregar tal valor ao mandante (afinal, recebeu-o em nome da sociedade seguradora), assim o faz na condição de depositário, devendo-se, pois, observar o respectivo regramento legal”, afirmou.

Garantia est​​endida

Com base nesse entendimento, o colegiado confirmou acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que entendeu serem duas empresas de eletrônicos as mandatárias da seguradora e depositárias dos prêmios, o que submete tais valores à superveniente recuperação judicial das devedoras.

A controvérsia envolveu ação de recuperação judicial de duas empresas de equipamentos eletrônicos. A seguradora apresentou impugnação ao crédito arrolado no plano, pedindo sua exclusão dos efeitos da recuperação ou a readequação do valor de seu crédito.

Os créditos referem-se a acordo operacional firmado para permitir que as empresas de eletrônicos pudessem oferecer aos seus clientes a contratação de seguro de garantia estendida para aparelhos telefônicos. Os prêmios do seguro eram pagos pelos clientes na compra dos bens, e o valor global dos prêmios arrecadados devia ser mensalmente repassado à seguradora.

Como o repasse não foi feito, a empresa de seguros ajuizou ação de obrigação de fazer objetivando o recebimento dos valores acumulados.

Após ter o seu pedido negado pelo juízo recuperacional – o que foi confirmado pelo TJMG –, a seguradora recorreu ao STJ alegando que os valores discutidos na ação de obrigação de fazer (de repassar os prêmios) não se submeteriam à recuperação judicial, já que pertenceriam a ela, e não às empresas de eletrônicos.

Contrato de agên​​cia

O ministro Marco Aurélio Bellizze disse que o contrato de representação de seguro é uma espécie do chamado contrato de agência, previsto nos artigos 710 e seguintes do Código Civil. Tais contratos, explicou, são “voltados especificamente à realização de determinados tipos de seguro, em geral, os microsseguros, definidos em resolução específica a esse propósito (Resolução 297/2013), em que o agente/representante toma para si a obrigação de realizar, em nome da seguradora representada, mediante retribuição, a contratação de determinados tipos de seguros, diretamente com terceiros interessados”.

De acordo com o relator, no caso analisado, o crédito advém do vínculo contratual estabelecido entre as partes. Uma vez realizado, pelo agente de seguros, o contrato de garantia estendida com terceiros, com o recebimento dos prêmios, em nome da sociedade de seguros, esta passa a ser credora do representante, que deve repassar os valores no prazo estipulado.

“O que realmente é relevante para definir se o aludido crédito se submete ou não à recuperação judicial é aferir a que título a representante de seguros recebe os valores dos prêmios e a que título estes permanecem em seu poder, até que, nos termos ajustados contratualmente, deva proceder ao repasse à seguradora”, ressaltou.

O ministro apontou ainda que, segundo o artigo 645 do Código Civil, “o depósito de coisas fungíveis, em que o depositário se obriga a restituir objetos do mesmo gênero, qualidade e quantidade, regular-se-á pelo disposto acerca do mútuo”.

Assim, destacou Bellizze, “de acordo com o tratamento legal ofertado ao mútuo (empréstimo de coisa fungível), dá-se a transferência de domínio da coisa ‘depositada’ [emprestada] ao ‘depositário’ [mutuário], ‘por cuja conta correm todos os riscos dela desde a tradição’ (artigo 587 do Código Civil)”.

“Em se tratando de bens de terceiros que, efetivamente, passaram a integrar a propriedade da recuperanda, como se dá no depósito irregular de coisas fungíveis, regulado, pois, pelas regras do mútuo, a submissão ao concurso recuperacional afigura-se de rigor”, concluiu.

Leia o acórdão.
Fonte: STJ – 28/02/2020

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1559595


Militar transexual poderá permanecer em imóvel funcional ...



​O ministro Herman Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), garantiu a Maria Luiza da Silva, reconhecida como primeira transexual dos quadros da Força Aérea Brasileira (FAB), o direito de permanecer em imóvel funcional até o julgamento do recurso que discute sua aposentadoria integral no posto de subtenente.

No ano 2000, após cirurgia de mudança de sexo, a militar foi reformada apenas em razão de sua condição de transexual, ato já considerado ilegal pelas instâncias ordinárias.

A história de Maria Luiza é contada em documentário do cineasta brasiliense Marcelo Díaz, que estreou no ano passado.

Em 2019, ela recebeu comunicação para desocupar o imóvel no prazo de 30 dias, sob o fundamento de que já teria sido implantada sua aposentadoria integral – requisito fixado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) para a saída do imóvel – no posto de cabo.

Postura discrimin​a​tória

Entretanto, ao analisar um agravo interposto por Maria Luiza em medida cautelar, o ministro Herman Benjamin considerou que sua aposentadoria na graduação de cabo contrariou determinação judicial que lhe reconheceu o direito de alcançar o último posto do quadro de praças – o de subtenente.

Além disso, o ministro entendeu existir potencial risco à militar caso ela seja obrigada a desocupar o imóvel em um prazo curto e sem solução definitiva da controvérsia judicial, que já dura 14 anos.

“À vista disso, é inconcebível dizer que a agravante está recebendo a aposentadoria integral, pois lhe foi tirado o direito de progredir na carreira, devido a um ato administrativo ilegal” – afirmou o ministro, acrescentando que ela “continua sendo prejudicada em sua vida profissional devido à transexualidade”.

O ministro destacou também que a militar ficou anos sem a aposentadoria, mesmo a referente ao posto de cabo.

“É uma coincidência significativa ter ocorrido esta ‘implantação’ anômala e totalmente prejudicial à aposentadoria justamente após a estreia do documentário longa-metragem Maria Luiza, no qual é relatado todo o drama vivido pela agravante e é desnudada a postura absolutamente discriminatória sofrida. A película corre o mundo fazendo sucesso de crítica”, disse Benjamin.

Aposentadoria fo​rçada

A Aeronáutica considerou a transexual incapaz para o serviço militar após a cirurgia de mudança de sexo, com base no artigo 108, inciso VI, da Lei 6.880/1980, que estabelece como hipótese de incapacidade definitiva e permanente para os integrantes das Forças Armadas acidente ou doença, moléstia ou enfermidade sem relação de causa e efeito com o serviço militar.

Em primeira instância, o juiz considerou o ato de reforma ilegal e, em razão da impossibilidade de retorno à ativa – a militar havia ultrapassado a idade-limite para o posto de cabo, de 48 anos –, determinou sua aposentadoria com proventos integrais.

Entretanto, o magistrado não mandou a Aeronáutica realizar os registros de promoção por tempo de serviço a que a militar teria direito se não tivesse sido reformada por ato declarado nulo.

Ao julgar a apelação da transexual, o TRF1 entendeu que deveria ser reconhecido seu direito às eventuais promoções por tempo de serviço no período em que esteve ilegalmente afastada da atividade, pois foi considerada, para todos os efeitos, como em efetivo serviço.

Além disso, o tribunal reconheceu o direito de a militar permanecer no imóvel até a efetiva implantação da aposentadoria integral, momento em que deveria desocupá-lo.

Posteriormente, a Aeronáutica negou o pedido de aposentadoria como subtenente, alegando que as promoções não dependeriam exclusivamente do critério de antiguidade e já havia sido implantada a aposentadoria no posto de cabo.

Direito legít​imo

Em sua decisão, o ministro Herman Benjamin assinalou a importância de garantir a permanência da militar no imóvel funcional até que seja restaurado o direito à aposentadoria integral com todas as promoções por tempo de serviço.

O ministro apontou que os elementos juntados ao processo demonstram que a militar cumpriu a idade para a obtenção da aposentadoria e os requisitos das promoções decorrentes de sua reincorporação ao serviço na condição de excedente, além de ocupar o imóvel de forma legítima.

Para Benjamin, retirá-la da casa enquanto ainda se discute o seu direito à aposentadoria no posto de subtenente revela clara transgressão ao que foi decidido nas instâncias ordinárias e frustra a expectativa legítima de uso do bem, assegurado pelo TRF1.

“Uma vez que a agravante, no momento, é aposentada como cabo engajado, necessário concluir o seu direito em permanecer no imóvel até que seja decidida a aposentadoria integral no posto de subtenente. Ademais, forçoso concluir que lhe é devido o reembolso do valor imposto como multa por ocupação irregular”, declarou o ministro ao dar provimento ao agravo.

Leia a decisão.


Fonte: STJ – 28/02/2020

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):Pet 12852AREsp 1552655


Na fase de cumprimento de sentença, cálculo de honorários ...



​​Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), na fase de cumprimento de sentença, a verba honorária, quando cabível, é calculada exclusivamente sobre as parcelas vencidas da dívida.

Com base nesse entendimento, o colegiado deu provimento a recurso especial para reformar acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS).

No recurso apresentado ao STJ, o recorrente sustentou que os honorários advocatícios fixados na fase de cumprimento de sentença não incluem as parcelas vincendas da dívida.

Argumentou que ninguém pode cobrar em juízo uma dívida ainda não vencida, pois as parcelas vincendas carecem de exigibilidade e não podem ser objeto de pretensão executória.

Fase de conhe​​cimento

O relator, ministro Villas Bôas Cueva, explicou que o STJ – em casos regidos pelo Código de Processo Civil (CPC) de 1973 – tem entendimento firmado de que o percentual da verba advocatícia sucumbencial na fase de conhecimento, quando decorrente da condenação em ação indenizatória com vistas ao recebimento de pensão mensal, deve incidir sobre o somatório das parcelas vencidas, acrescido de uma anualidade das prestações.

O ministro acrescentou que o artigo 85 do CPC de 2015 incorporou o referido entendimento jurisprudencial ao estabelecer que, “na ação de indenização por ato ilícito contra pessoa, o percentual de honorários incidirá sobre a soma das prestações vencidas acrescida de 12 prestações vincendas”.

Cumprimento de se​ntença

Por outro lado, segundo o relator, na fase de cumprimento de sentença, os honorários advocatícios, quando devidos após o prazo para pagamento espontâneo da obrigação (artigo 523, parágrafo 1º, do CPC/2015), são calculados sobre as parcelas vencidas da pensão mensal, não se aplicando o parágrafo 9º do artigo 85 do novo CPC.

Villas Bôas Cueva explicou que, se não ocorrer o pagamento voluntário dentro do prazo legal, o débito será acrescido de 10%, a título de honorários, além da multa.

De acordo com o ministro, a expressão “débito” constante do artigo 523, para efeito de honorários, compreende apenas as parcelas vencidas da dívida, sendo que o executado não pode ser compelido a pagar prestações futuras que ainda não atingiram a data de vencimento.

“A regra inserida no artigo 85, parágrafo 9º, do CPC/2015, acerca da inclusão de 12 prestações vincendas na base de cálculo dos honorários advocatícios, é aplicável somente na fase de conhecimento da ação indenizatória. No cumprimento de sentença, a verba honorária, quando devida, é calculada exclusivamente sobre as parcelas vencidas da pensão mensal”, concluiu.

Fonte: STJ – 28/02/2020

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.


quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

Relator dá liminar a preso punido coletivamente ...



​O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Rogerio Schietti Cruz concedeu liminar para suspender os efeitos de decisão que reconheceu infração disciplinar grave por parte de um preso após o desaparecimento de um pacote de fermento biológico da cozinha da penitenciária.

Após o supervisor perceber o sumiço do fermento, os detentos que trabalhavam no local foram questionados, mas nenhum deles assumiu o fato ou indicou quem poderia ter sido o responsável. Poucas horas depois, o produto reapareceu no lugar onde deveria estar guardado.

Indagados novamente e ameaçados de punição, os presos continuaram dizendo que não sabiam quem havia pegado o fermento. A direção do presídio abriu processo disciplinar contra os cinco detentos que estavam trabalhando na padaria da cozinha naquele momento, e, ao final, aplicou uma punição a todos, consistente na anotação de falta grave – o que tem reflexo na progressão do regime de cumprimento da pena.

Indisci​​plina

Tanto o juiz de primeira instância como o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) mantiveram a aplicação da penalidade, concluindo pela regularidade do processo disciplinar. O TJSP entendeu que “o reeducando praticou falta disciplinar de natureza grave, pois desobedeceu à ordem de funcionário público e agiu de maneira indisciplinada, desrespeitando as regras impostas no sistema penitenciário, pois, juntamente com outros sentenciados, prestava serviço na cozinha do presídio”.

No pedido de habeas corpus dirigido ao STJ, a defesa de um dos presos afirmou que a sanção disciplinar é ilegal, já que não ficou demonstrado quem subtraiu o fermento.

Segundo o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, se a corte de segunda instância conclui pela regularidade do processo disciplinar que apurou falta grave, seus fundamentos não podem ser revistos no STJ por meio de habeas corpus, pois isso exigiria o reexame aprofundado das provas. No entanto – continuou o relator –, não é necessário o revolvimento dos fatos para concluir, no caso em discussão, pela ausência de provas que apontem a autoria da conduta.

Penalidade co​​letiva

O ministro citou jurisprudência do tribunal no sentido da inviabilidade da aplicação de penalidade de forma coletiva no âmbito da execução penal, sem a individualização da conduta.

“É imperioso ressaltar a relevância da individualização da conduta imputada ao apenado, circunstância sem a qual nem é possível o adequado exercício das garantias fundamentais do contraditório e da ampla defesa, previstas no texto do artigo 5º, inciso LV, da Carta Magna, segundo o qual aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

Schietti destacou que a imputação de autoria coletiva à infração sob apuração corrompe a própria finalidade a que se presta o processo disciplinar, “tornando o procedimento de apuração instrumento inócuo, ao esvaziar a possibilidade de efetiva defesa, constituindo, inclusive, ofensa ao ordenamento jurídico internacional”.

Constrangim​​ento

O relator mencionou o artigo XI da Declaração Universal dos Direitos Humanos, segundo o qual “todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”.

“Assim, em um primeiro olhar, não verifico a indicação de elementos que vinculem o apenado ao desaparecimento do produto armazenado na padaria do estabelecimento prisional, de modo que constitui patente constrangimento ilegal a manutenção dos consectários decorrentes do reconhecimento da falta grave”, concluiu o ministro ao suspender o ato que reconheceu a infração disciplinar.

Leia a decisão.
Fonte: STJ – 27/02/2020

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):HC 559433


Para Terceira Turma, ação de nulidade de patente é ...



A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a ação de nulidade de patente ajuizada na Justiça Federal é prejudicial externa apta a suspender na Justiça estadual a tramitação de processo de indenização por uso não autorizado do objeto patenteado.

O colegiado reconheceu que a nulidade de patente pode ser arguida pela defesa de forma incidental, sem a necessidade de demanda autônoma ou de reconvenção, mas afirmou que a competência para julgar essa matéria é da Justiça Federal, com a participação do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).

“Configura prejudicialidade externa a pendência, em um processo extrínseco ao presente caso, de ação judicial na qual se debate a nulidade das patentes em que se funda o objeto principal desta ação, ainda que a recorrente não faça parte da demanda”, explicou o relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze.

Eficácia dos ​registros

O caso julgado pelos ministros se refere à eficácia do registro de patentes de uma empresa que, na origem, pleiteava na Justiça estadual indenização pelo uso indevido da tecnologia patenteada. Em primeiro grau, o juiz acolheu a tese de nulidade das patentes, alegada pela defesa na contestação, e julgou o pedido improcedente.

Porém, o Tribunal de Justiça reformou a sentença e condenou a empresa ré a se abster de produzir e comercializar os produtos que utilizem as patentes em questão, além de pagar indenização pela violação do direito de propriedade industrial.

No recurso ao STJ, a empresa condenada defendeu a possibilidade de arguição incidental de nulidade de patente. Afirmou também que, como existe uma ação de nulidade ajuizada na Justiça Federal, o processo na Justiça estadual deveria ser suspenso até o julgamento daquela demanda.

Interpretação harmô​​nica

O ministro Marco Aurélio Bellizze esclareceu que “a previsão legal para formulação de pedido incidental de nulidade de patente como matéria de defesa, a qualquer tempo (artigo 56, parágrafo 1º, da Lei 9.279/1996), deve ser interpretada de forma harmônica com as regras de competência absoluta para conhecimento da matéria”.

Ele mencionou o REsp 1.527.232, julgado sob o rito dos repetitivos (Tema 950), no qual a Segunda Seção do STJ concluiu pela competência absoluta da Justiça Federal, com a participação do INPI, para o julgamento sobre registros de marca e das correlatas ações de nulidade.

Segundo o relator, embora a tese adotada no recurso repetitivo diga respeito a marcas, o mesmo raciocínio pode ser aplicado ao caso dos autos, porque a aquisição do direito de utilização exclusiva da patente também se dá com o deferimento do registro pelo INPI, sendo que esse direito somente pode ser afastado por meio de processo administrativo ou judicial que desconstitua o registro.

Dessa forma, o relator assinalou que, no caso, o juízo estadual realmente não poderia ter avançado no conhecimento do pedido de nulidade dos registros formulado na contestação. Segundo ele, cabia à empresa ré – tendo em vista a necessidade de participação do INPI e a consequente competência do juízo federal – propor a ação de nulidade no juízo competente, “situação em que seria de rigor a observância da prejudicialidade entre as respectivas demandas”.

Conexã​​o

Em seu voto, Bellizze explicou que existirá conexão entre demandas quando houver identidade de objeto ou de causa de pedir (artigo 55 do Código de Processo Civil) e que, nessas situações, será necessário reunir os processos para julgamento simultâneo – prevenindo eventual contradição entre os julgados.

No entanto – ressaltou –, nas hipóteses em que a reunião dos processos for inviável (por exemplo, quando estiverem submetidos a juízos de competência absoluta distinta), a solução adequada à prevenção de julgamentos antagônicos é a suspensão do processo dependente, de acordo com o disposto no artigo 313, V, do CPC.

O ministro destacou que, no caso dos autos, as ações confrontadas traduzem a existência de uma prioridade lógica necessária para a solução da controvérsia, atendendo a todos os requisitos que determinam a prejudicialidade externa.

As partes informaram no processo que a Justiça Federal julgou improcedente a ação de nulidade, mas essa decisão ainda se encontra pendente do julgamento de recursos.

Para o relator, o tribunal estadual deveria ter determinado a suspensão do processo antes da análise da apelação, pois dessa forma resguardaria a efetividade da prestação jurisdicional e a racionalidade lógica das decisões. Com esse entendimento, a turma determinou a suspensão do processo até a solução definitiva sobre o pedido de nulidade na Justiça Federal.

Fonte: STJ – 27/02/2020

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.


Dano moral por inclusão indevida em cadastro ...



A orientação contida na Súmula 385 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) pode ser flexibilizada para permitir o reconhecimento de dano moral decorrente da inscrição indevida em cadastro restritivo de crédito, mesmo que as ações ajuizadas para questionar as inscrições anteriores ainda não tenham transitado em julgado, desde que haja elementos suficientes para demonstrar a verossimilhança das alegações do consumidor.

A Terceira Turma do STJ aplicou esse entendimento para condenar um banco a indenizar um consumidor em R$ 5 mil, em decorrência da inscrição indevida de seu nome em cadastro de restrição de crédito.

Em ação movida contra o banco, o consumidor conseguiu que fossem reconhecidas a inexistência do débito e a ilegalidade do registro na Serasa. Entretanto, seu pedido de danos morais foi rejeitado em primeira instância, em razão da existência de anotações anteriores contra ele no cadastro.

Inscrições con​​testadas

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a sentença, citando – entre outros fundamentos para negar a indenização – a Súmula 385, segundo a qual não cabe reparação de dano moral se o consumidor tem alguma anotação legítima anterior.

No recurso especial, o consumidor alegou que a súmula não pode ser aplicada ao caso, pois as outras inscrições de seu nome também são indevidas e estão sendo questionadas judicialmente.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora, é correto o entendimento do TJSP no sentido de que, até o reconhecimento judicial definitivo acerca da inexigibilidade do débito, deve ser presumida como legítima a anotação feita pelo credor nos cadastros restritivos. Ela destacou que essa presunção, em regra, não é afastada pela simples juntada de extratos que comprovem o ajuizamento de ações com a finalidade de contestar as demais inscrições.

Defesa dificulta​​da

Entretanto, afirmou a relatora, em determinadas hipóteses, o consumidor pode ficar em situação excessivamente desfavorável, especialmente quando as ações que questionam os débitos e pedem a compensação por danos morais forem ajuizadas concomitantemente – como ocorreu no caso analisado.

“Não se pode admitir que seja dificultada a defesa dos direitos do consumidor em juízo, exigindo-se, como regra absoluta, o trânsito em julgado de todas as sentenças que declararam a inexigibilidade de todos os débitos e, consequentemente, a irregularidade de todas as anotações anteriores em cadastro de inadimplentes para, só então, reconhecer o dano moral”, disse.

Nancy Andrighi mencionou que o consumidor ajuizou outras três ações para questionar as inscrições. Em duas, já transitadas em julgado, obteve a declaração de inexistência das dívidas, mas não conseguiu os danos morais por causa das demais inscrições. Em outro, ainda pendente de recursos, a sentença cancelou a dívida e determinou a indenização.

Círculo vi​​cioso

“O contexto dos autos, a um só tempo, bem revela o dito ‘círculo vicioso’ em que se pôs o consumidor recorrente e evidencia a verossimilhança das alegações deduzidas por ele, reforçando as razões de direito que fundamentaram o ajuizamento desta ação”, avaliou.

A ministra concluiu que a falta do trânsito em julgado em apenas um desses processos autoriza o afastamento da Súmula 385 para se reconhecer a procedência do pedido de indenização.

Ela lembrou que a Terceira Turma já flexibilizou a aplicação da súmula em situação semelhante, quando julgou o REsp 1.647.795, em outubro de 2017.

Leia o acórdão.
Fonte: STJ – 27/02/2020

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1704002


quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

Anulado acordo que impedia encanador de pedir ...



A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho considerou nulo o acordo em que um encanador aposentado por invalidez se comprometia a não ajuizar qualquer ação de indenização por danos decorrentes de acidente de trabalho.

Acidente

Em 1998, quando o empregado instalava canos numa vala em uma obra realizada pela Écio Braz dos Santos & Cia Ltda. para um promotor de Justiça em Osvaldo Cruz (SP), um muro de arrimo caiu violentamente sobre ele, causando-lhe fratura na bacia e escoriações nas pernas. As lesões o fizeram passar por cirurgias e por tratamento demorado e caro. Como resultado do acidente, ele acabou aposentado por invalidez.

Quitação geral

Por meio do Ministério Público Estadual, o encanador, o empregador e o responsável pela obra assinaram um acordo em 2000. Nos termos da transação extrajudicial, o empregador se comprometia a complementar o salário do  empregado e as despesas com o tratamento. Ele, por sua vez, dava plena e geral quitação de qualquer parcela indenizatória relativa ao acidente e abria mão de ajuizar qualquer ação indenizatória. Em 2005, no entanto, ele apresentou a reclamação trabalhista com essa finalidade.

O juízo da Vara do Trabalho de Adamantina (SP) considerou válido o acordo apresentado pela empresa na contestação e concluiu que o empregado não teria mais direito de ingressar com ação. O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP) manteve sentença.

Renúncia

O relator do recurso de revista do encanador, ministro Vieira de Mello Filho, ressaltou que o trabalhador, em situação de fragilidade econômica, não pode fazer frente ao empregador em uma mesa de negociação. “A quantidade de valores que, para o empregado, está em jogo quando negocia a respeito do seu contrato de trabalho, diferentemente do empregador, retira dele o poder de barganha”, afirmou. “Desse modo, sua manifestação de vontade é potencialmente viciada pela posição social que ocupa, ainda que não haja coação direta ou outro meio de constrição violenta da vontade”.

No seu entendimento, a transação extrajudicial, no caso, caracterizou verdadeira renúncia a direito estabelecido na Constituição da República, “intrinsecamente ligado à saúde, à promoção e à proteção do trabalhador”, e isso anula sua validade.

A decisão foi unânime. A reclamação agora retornará à Vara do Trabalho de origem, para que decida sobre o pedido de indenização.

(GL/CF)

Fonte: TST – 26/02/2020

Processo: RR–52800-46.2006.5.15.0068


Perda da guarda impede que mãe execute alimentos ...



Uma vez extinta a obrigação alimentar pela exoneração do alimentante, o responsável anterior pelo menor não tem legitimidade para prosseguir na execução de alimentos em seu nome, mas pode fazer o pedido de ressarcimento por meio de ação ordinária.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou não ser possível a cobrança de pensão alimentícia atrasada feita pela mãe de menor depois que a guarda passou à responsabilidade do pai.

O relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, explicou que, com a exoneração do alimentante, a genitora perdeu a legitimidade para prosseguir na execução dos alimentos vencidos, em nome próprio, pois não é possível sub-rogação no caso, diante do caráter personalíssimo do direito discutido.

“Do viés personalíssimo do direito aos alimentos, destinado a assegurar a existência do alimentário – e de ninguém mais –, decorre a absoluta inviabilidade de se transmiti-lo a terceiros, seja por negócio jurídico, seja por qualquer outro fato jurídico”, concluiu.

Execuçã​​​o

De acordo com os autos, a mãe do menor ajuizou ação de execução de alimentos em desfavor do pai, cobrando os valores da pensão não paga referente aos meses de setembro, outubro e dezembro de 2013. Em audiência de conciliação, ficou definido que os pagamentos seriam feitos entre setembro e dezembro de 2014, mas a dívida não foi quitada.

O pai apresentou exceção de pré-executividade, sustentando a ilegitimidade da mãe para prosseguir com a ação. Alegou que o menor passou a morar com ele em 17 de dezembro de 2014 e que desde então a mãe deixou de representá-lo judicialmente.

Em primeira instância, a exceção de pré-executividade foi indeferida, sob o fundamento de que a ação executiva se refere ao período em que a mãe estava com a guarda do menor, o que lhe confere legitimidade para manejar o pedido, a fim de ser indenizada pelo tempo em que teve de arcar sozinha com as despesas para a criação do filho.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) reformou a sentença. Para o tribunal paulista, é inadmissível que a mãe siga exigindo o crédito, em nome próprio, ainda que referente ao período em que tinha a guarda do menor.

Ao pedir a reforma do acórdão no STJ, a mãe alegou que a modificação da guarda não é suficiente para extinguir a obrigação do devedor dos alimentos. Disse ter arcado sozinha com o sustento do filho no período em que era a guardiã, visto que o pai descumpriu com o dever alimentar a que estava obrigado.

Caráter personalíssi​​mo

Para a Terceira Turma, a troca do responsável afasta de vez a obrigação de pagamento ao titular anterior, porque esse tipo de benefício é destinado apenas ao alimentando.

“Não há como conferir legitimidade à genitora para, em nome próprio, por sub-rogação, prosseguir com a execução de alimentos, visando ser ressarcida pelos débitos alimentares referentes ao período em que detinha a guarda do menor”, frisou o ministro Marco Aurélio Bellizze.

“Em conformidade com o direito civil constitucional – que preconiza uma releitura dos institutos reguladores das relações jurídicas privadas, a serem interpretados segundo a Constituição Federal, com esteio, basicamente, nos princípios da proteção da dignidade da pessoa humana, da solidariedade social e da isonomia material –, o direito aos alimentos deve ser concebido como um direito da personalidade do indivíduo”, destacou.

O relator disse que a pensão alimentícia integra o patrimônio moral do alimentando, e não o seu patrimônio econômico, ainda que possa ser estipulada economicamente. Bellizze também ressaltou que, dado o caráter personalíssimo do direito aos alimentos, esse benefício não pode ser transferido a terceiros.

Direito intransmissí​​vel

Bellizze afirmou que a intransmissibilidade do direito aos alimentos tem respaldo no artigo 1.707do Código Civil, que veda a possibilidade de renúncia, sendo que o respectivo crédito não pode ser cedido, compensado ou penhorado.

Em relação ao reembolso daquele que arca sozinho com as despesas do alimentando, o ministro ressaltou que, “para o propósito perseguido, isto é, de evitar que o alimentante, a despeito de inadimplente, se beneficie com a extinção da obrigação alimentar, o que poderia acarretar enriquecimento sem causa, a genitora poderá, por meio de ação própria, obter o ressarcimento dos gastos despendidos no cuidado do alimentando, durante o período de inadimplência do obrigado”, conforme os termos do artigo 871 do CC.

Fonte: STJ – 26/02/2020


O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.


Compartilhamento de informações de banco de dados ...



​​​​Bancos de dados que compartilham informações de consumidores devem informá-los previamente acerca da utilização desses dados, sob pena de terem que pagar indenização por danos morais.

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o fato de as informações serem fornecidas pelo consumidor no ato de uma compra, ou até mesmo divulgadas em redes sociais, não afasta a responsabilidade do gestor do banco de dados de previamente comunicar o seu compartilhamento.

O colegiado estabeleceu esse entendimento ao negar provimento ao recurso de uma empresa gestora de dados, que foi condenada a indenizar um consumidor em R$ 8 mil pela comercialização indevida de informações pessoais e sigilosas.

Prevenção de fra​​​udes

No recurso especial, a empresa alegou que não haveria a necessidade de notificação prévia com fundamento no artigo 43 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), pois ela não faz negativação, sendo apenas uma fonte de validação cadastral que visa evitar a ocorrência de fraudes a partir do confronto das informações prestadas pelo consumidor ao comerciante com aquelas armazenadas no banco de dados. Ainda segundo a empresa, o consumidor não comprovou a ocorrência de danos.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora, em se tratando de compartilhamento das informações do consumidor pelos bancos de dados, deve ser observada a regra do inciso V do artigo 5º da Lei 12.414/2011, a qual assegura ao cadastrado o direito de ser informado previamente sobre a identidade do gestor e sobre o armazenamento e o objetivo do tratamento dos dados pessoais.

“O fato, por si só, de se tratar de dados usualmente fornecidos pelos próprios consumidores, quando da realização de qualquer compra no comércio, que não se afiguram como os chamados dados sensíveis ou sigilosos”, não afasta a responsabilidade do gestor do banco de dados, na medida em que, quando o consumidor o faz “não está, implícita e automaticamente, autorizando o comerciante a divulgá-los no mercado” – explicou a ministra ao destacar que, nessas situações, o consumidor confia na proteção de suas informações pessoais.

Dano pres​​umido

A ministra considerou que as alterações da Lei 12.414/2011 – promovidas pela Lei Complementar 166/2019 – não eximem o gestor do banco de dados de comunicar ao consumidor o uso dos dados pessoais.

“Embora o novo texto da Lei 12.414/2011 se mostre menos rigoroso no que diz respeito ao cumprimento do dever de informar ao consumidor sobre o seu cadastro – já que a redação originária exigia autorização prévia mediante consentimento informado por meio de assinatura em instrumento específico ou em cláusula apartada –, o legislador não desincumbiu o gestor e/ou a fonte de proceder à efetiva comunicação.”

Nancy Andrighi afirmou que, na hipótese do compartilhamento das informações sem a prévia informação – como ocorreu no caso analisado –, o dano moral é presumido, sendo desnecessário ao consumidor comprovar prejuízo.

Dever de in​​formar

A relatora declarou que “as informações sobre o perfil do consumidor, mesmo as de cunho pessoal, ganharam valor econômico no mercado de consumo e, por isso, o banco de dados constitui serviço de grande utilidade, seja para o fornecedor, seja para o consumidor, mas, ao mesmo tempo, atividade potencialmente ofensiva a direitos da personalidade deste”.

Para a solução do caso, ela afirmou que é importante considerar as exigências da lei quanto ao dever de informação, “que tem como uma de suas vertentes o dever de comunicar por escrito ao consumidor a abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo, quando não solicitada por ele, consoante determina o parágrafo 2º do artigo 43 do CDC”.

Nancy Andrighi destacou que a situação analisada é distinta da questão enfrentada pela Segunda Seção ao julgar o Tema 710 dos recursos repetitivos, em 2014, quando o colegiado decidiu que, no sistema credit scoring, não se pode exigir o prévio e expresso consentimento do consumidor avaliado, pois não constitui um cadastro ou banco de dados, mas um modelo estatístico.

Leia o acórdão.
Fonte: STJ – 26/02/2020


Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1758799