O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) deu provimento a um recurso do Ministério Público Federal (MPF) e condenou a União ao pagamento de R$ 50.000,00 em danos morais coletivos para a comunidade indígena de Passo Grande do Rio Forquilha, localizada no município de Cacique Doble (RS). A 3ª Turma da Corte entendeu, por unanimidade, que houve omissão estatal por parte da União na demora em realizar a perfuração de poço artesiano na localidade e fornecer o acesso à água potável para os moradores da terra indígena. A decisão do colegiado foi proferida em sessão virtual de julgamento realizada ontem (9/11).
Poço artesiano
No ano de 2011, a comunidade recorreu ao MPF para informar que a água que era fornecida pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) não era suficiente para a ingestão e a higiene da população do local. Além disso, foi identificado que a caixa d’água que abastecia a localidade era velha e estava sem tampa, fazendo com que a água ficasse contaminada, gerando surtos de doenças na comunidade.
A Sesai ficou comprometida em angariar recursos para fornecer um maior volume de água potável para a população por meio do uso de caminhões-pipa, de melhorias nas caixas d’água e de escavação de um poço artesiano.
No entanto, em 2017, a situação ainda não tinha solução definitiva. Na época, a Secretaria de Desenvolvimento Rural, Pesca e Cooperativismo (SDR) do Estado do Rio Grande do Sul, trabalhando em cooperação técnica com a Sesai, declarou que estava realizando levantamento dos sistemas de abastecimento e de distribuição de água, para finalizar o orçamento da obra de perfuração do poço artesiano, o qual só seria finalizado no final daquele ano.
Dessa forma, o poço foi perfurado somente em 2018, encontrando-se em funcionamento na terra indígena desde então.
Sentença
Na ação civil pública ajuizada pelo MPF em agosto de 2017, foi pleiteado que a Justiça Federal condenasse a União e o Estado do RS a pagar, a título de dano moral coletivo, indenização no valor de R$ 200.000,00 à comunidade de Passo Grande do Rio Forquilha.
Em janeiro de 2019, o juízo da 1ª Vara Federal de Erechim (RS) considerou improcedente o pedido de condenação dos réus ao pagamento da indenização.
Recurso ao Tribunal
O órgão ministerial interpôs recurso de apelação ao TRF4 requisitando que a sentença fosse reformada. O MPF sustentou que “a questão do fornecimento de água potável foi objeto de diversas tentativas em ver atendida a demanda no âmbito extrajudicial desde 2011, e somente em 2018 a instalação de poço artesiano foi providenciada, havendo evidente negligência ao direito à saúde, bem como à honra da comunidade, que conviveu por longo período com doenças decorrentes da deficiência sanitária”.
Condenação
A relatora do caso no Tribunal, desembargadora federal Vânia Hack de Almeida, posicionou-se a favor do pagamento de danos morais coletivos por parte da União.
“Quanto ao pedido de condenação dos réus à indenização por dano moral coletivo, a sentença foi de improcedência, e neste ponto tenho que deve ser modificada, já que os autos são explícitos no sentido de que os órgãos públicos competentes para conferir acesso à água potável a cada cidadão, para higiene e para subsistência, reconheceram a deficiência da prestação de tal serviço à comunidade indígena, mas demoraram sete anos para cavar um poço artesiano para resolver integralmente a situação. Em que pese no decorrer desse período tenha havido prestação do serviço, com fornecimento de água com caminhões-pipa e caixas d’água, a questão é que o volume fornecido não era suficiente para o grupo, o que acarretou doenças em idosos e crianças, que usavam o produto oferecido para alimentação, sendo que os banhos e a limpeza necessária eram feitos em fontes próximas, mesmo em tempos de inverno”, declarou a magistrada em seu voto.
A desembargadora ressaltou que houve deficiência “de serviço imprescindível à vida em todos os seus aspectos e existência, inclusive relativamente às questões de higiene, dos quais foram reiteradamente privados. O dano moral sofrido pela referida comunidade indígena, além de dispensar individualização e dimensionamento no âmbito particular de cada indivíduo, também não requer análise de experts para constatá-lo, bastando uma simples verificação da causa e o conhecimento comum e público de tudo que ela tem sofrido no decorrer desses anos”.
A 3ª Turma, de forma unânime, determinou o pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 50.000,00 pela União. A quantia vai ser gerida por Fundo do Conselho Federal com aplicação específica e integral na terra indígena de Passo Grande do Rio Forquilha.
N° 5004069-34.2017.4.04.7117/TRF
Fonte: TRF 4