Em 2020, 38% dos julgamentos em segundo grau foram sobre ações previdenciárias

Aposentadoria especial, por idade ou tempo de contribuição, auxílio-doença e auxílio emergencial foram temas recorrentes durante o ano de 2020, marcado pela pandemia do novo coronavírus. O julgamento de recursos referentes a ações contra decisões do INSS que negaram pedidos a esses benefícios representou, no âmbito do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), 38% do total de julgados, ou 71.869 decisões das 5ª e 6ª Turmas e das Turmas Regionais Suplementares de Santa Catarina e do Paraná. 

Dos mais de 71 mil recursos, o maior índice, 20%, é relativo a solicitações de aposentadoria por tempo de contribuição. Para o desembargador federal da 1ª Turma Regional Suplementar de SC, Paulo Afonso Brum Vaz, as aposentadorias especiais são as que apresentam maior índice de negativas na via administrativa, o que reflete na intensa judicialização. “São processos complexos, que implicam análise de questões de fato, com realização de perícia, conversões de tempo e somatório de períodos picados”, analisa o magistrado. Segundo ele, existe uma tendência importante de procedência para esses benefícios e reversão das negativas administrativas, ao destacar estatística realizada pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) sobre o período entre 2014 e 2017, que apontou o índice de 71% de provimento ainda na primeira instância.

No primeiro grau, os números superam os 361 mil julgamentos. No rito ordinário, prevaleceram ações sobre aposentadoria por tempo de contribuição – 17.723 ao total. Já nos juizados especiais federais e nas turmas recursais, foram os auxílios-doença previdenciários os prevalentes – 80.049 e 27.630, respectivamente. Brum Vaz atribui esses valores a um aumento do adoecimento da população brasileira e ao crescente tratamento aos sintomas, em vez de uma solução às causas das doenças, especialmente aquelas relacionadas à saúde mental dos trabalhadores. “Problemas de saúde que poderiam ser resolvidos sem afastamento do trabalho culminam por se agravar e levam os indivíduos à incapacidade”, reflete o desembargador. Ele adiciona uma estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS) de que a depressão afeta cerca de 350 milhões de pessoas no mundo, com taxa de prevalência variando entre 8% e 12%. “É a principal causa de incapacitação dos indivíduos no mundo quando se considera o total de anos perdidos (8,3% dos anos para homens e 13,4% para mulheres) e a terceira principal causa da carga global de doenças. A previsão é de que subirá ao primeiro lugar até 2030”, alerta.

Propostas para desjudicialização

Conforme Brum Vaz, a desjudicialização passa pela otimização, ainda no âmbito administrativo, das perícias, que deveriam, em sua visão, ser biopsicossociais, com a aplicação de esforços científicos para o diagnóstico, além de levar em conta exames complementares, histórico médico, trabalho habitual, idade, escolaridade e outros fatores que possam influenciar no desempenho normal da prática laboral. “No confronto entre laudos particulares, laudos administrativos e laudos judiciais, percebem-se diferenças de resultados que, muitas vezes, tornam difícil acreditar que se trata da mesma pessoa que foi submetida às perícias. Em razoável medida, é essa notória discrepância que provoca a judicialização, hoje a mais intensa e onerosa”, reitera.

O desembargador mapeia três contribuições que o Poder Judiciário pode oferecer para solucionar esses problemas apontados. O primeiro deles é incentivar o consenso entre os atores do Direito para a propositura de ações coletivas, para a tutela judicial dos direitos individuais homogêneos. “Com programas sistemáticos e organizados de levantamento dos casos repetitivos para possíveis ações coletivas, teríamos, em boa medida, superado o problema da judicialização individual e ainda resolveríamos o déficit de empoderamento daqueles que, por adversidades de várias ordens (hipossuficiência econômica, cultural ou informacional que atuam como bloqueadores das vias de acesso à justiça), não conseguem buscar a tutela judicial dos seus direitos”.
 
A segunda sugestão é no sentido de incentivar a utilização dos mecanismos de solução das demandas repetitivas em relação às matérias previdenciárias de massa, com a instituição de normativos para que o INSS atendesse, obrigatoriamente, às decisões, inclusive para os que não ajuizaram ações. Por fim, a terceira proposta é o reconhecimento da existência de um direito constitucional subjetivo titularizado pelos cidadãos a uma tutela administrativa individual ou coletiva adequada, igualitária e efetiva na concretização dos direitos fundamentais sociais, para tornar a via administrativa mais eficaz e dispensar a judicialização.
 

Fonte: TRF 4

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