O juiz federal Gustavo Catunda Mendes, da 1ª Vara Federal de Caraguatatuba/SP, suspendeu nesta sexta-feira (9/4) os efeitos dos recursos hierárquicos em trâmite na Agência Nacional do Petróleo (ANP) e no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que visam a redistribuição de créditos ou valores relativos à alteração dos critérios de partilha de royalties no litoral de São Paulo.
Na decisão (tutela de urgência), o município de Ilhabela alegou violação do devido processo legal, contraditório e ampla defesa em relação ao processo administrativo que altera os limites dos territórios marítimos de São Sebastião, Ilhabela e Caraguatatuba para efeito da distribuição dos royalties do petróleo. Como consequência, caberia à ANP a aplicação dos novos critérios estipulados pelo IBGE para efeitos de partilha.
O magistrado salientou que o ofício encaminhado pela ANP concedia prazo de até 30 dias corridos para a manifestação, porém, teve negado o acesso ao processo administrativo e aos documentos que subsidiaram as decisões do IBGE e da ANP. Assim, ingressou com o pedido de tutela para suspender o referido processo até que seja assegurado o acesso à íntegra de todos os documentos pertinentes ao caso.
Em decisão anterior, a 1ª Vara de Caraguatatuba já havia deferido, em parte, pedido de tutela determinando tão somente que o município de Ilhabela tivesse acesso à íntegra dos documentos, devendo a autoridade administrativa conceder novo prazo de 30 dias com vista integral dos processos.
Como o autor interpôs recursos hierárquicos em relação aos processos administrativos perante o IBGE e ANP, o juiz entendeu serem necessárias novas providências “para se assegurar e efetividade do provimento jurisdicional, por medida de prudência e cautela, sobretudo pelo fato de a matéria controvertida envolver disponibilidade ou não de recursos de royalties que serão incorporados ao patrimônio público, com notável reversibilidade remota”.
Em recente manifestação, o município de Ilhabela informou que “desde março/2021 estão sendo implementadas as modificações de repasses orçamentários decorrentes da revisão da partilha dos royalties, objeto dos recursos hierárquicos ainda em curso”, sendo necessária, portanto, a declaração de nulidade do processo administrativo.
“A pretensa atribuição de efeito suspensivo encontra previsão no artigo 61, parágrafo único, da Lei 9.784/1999 (Processo Administrativo Federal), na medida em que se encontra presente justo receio de prejuízo de difícil ou incerta reparação decorrente da execução”, afirma Gustavo Catunda Mendes.
Segundo o juiz, nos termos da Lei 9.784/1999, artigo 2º, diante das particularidades de ordem técnica do caso, a atribuição de efeito suspensivo aos recursos hierárquicos atende aos “princípios da razoabilidade, ampla defesa, contraditório e interesse público, visto que, em atendimento a fins de interesse geral, salvaguarda a redistribuição de verbas de royalties e aplicação de verbas públicas após necessária segurança jurídica, a partir devida apreciação dos processos administrativo e judicial em curso”.
Gustavo Catunda Mendes ressaltou que a execução imediata da nova partilha dos royalties poderá surtir efeitos irreversíveis, na medida em que o aumento de disponibilidade de verbas às municipalidades envolvidas certamente terá como efeito prático imediato a alocação e aplicação dos recursos recebidos. Isso poderia trazer grave e nocivo comprometimento à eventual reversibilidade da medida, em caso de decisão diversa em sede administrativa ou judicial, sobretudo considerando o elevado impacto financeiro e orçamentário das alterações na partilha dos royalties.
“Conforme já se consignou na decisão inicial, e vale reiterar, eventuais atos decorrentes da expectativa criada pelos municípios envolvidos, seja de aumento de despesas, seja de comprometimento orçamentário em razão do ainda esperado e incerto incremento de receitas originárias da redistribuição de royalties, devem ser administrados a cargo e sob conta e risco dos agentes públicos responsáveis pela gestão administrativa municipal, prefeito e secretários municipais”, acrescenta o magistrado.
Gustavo Catunda Mendes ressaltou que a alteração da partilha deve ser submetida ao trânsito em julgado na esfera administrativa, bem como ao provimento jurisdicional. “Sem adentrar à questão do mérito administrativo, compete ao Poder Judiciário apreciar eventual suscitação de abuso de poder ou violação à lei, decorrentes de desrespeito ao contraditório e à ampla defesa, razão pela qual o atual momento processual recomenda a atribuição de efeitos suspensivo aos recursos hierárquicos em tramitação, até ulterior deliberação por este Juízo em sede de cognição exauriente (sentença), sujeita à esfera recursal”.
Por fim, o juiz determinou a suspensão dos efeitos práticos das decisões até então proferidas nos processos administrativos, não devendo haver redistribuição de créditos ou valores relativos à alteração dos critérios de partilha de royalties a partir da criação de nova linha geodésica ortogonal e paralela por ato do IBGE.
Foi estipulado prazo de 30 dias para que o IBGE e a ANP prestem informações detalhadas sobre o caso, bem como todas as partes apresentem gráficos, mapas e planilhas das situações “antes” e “depois” da revisão das linhas geodésicas que definem a costa dos municípios de São Sebastião e Ilhabela, e seus efeitos financeiros aos municípios envolvidos. (RAN)
Procedimento Comum Cível 5000825-58.2020.4.03.6135
Fonte: TRF3