Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência – o trabalhador albino

Hoje, 21 de setembro, é o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência. A data, oficializada pela Lei 11.133/2005, representa o nascimento e a renovação da luta do cidadão com deficiência pela visibilidade e participação na sociedade em igualdade de condições.

A evolução da legislação sobre o tema permitiu a substituição do modelo de caridade e assistencialismo pelas ações afirmativas que promovem a visibilidade, a acessibilidade e a inclusão. Pela lei brasileira, é considerada PCD a pessoa que possui deficiências visual, auditiva, física, intelectual ou múltiplas. A contratação de pessoas com deficiência no mercado de trabalho está definida na Lei 8.213/1991, conhecida como Lei de Cotas. De acordo com essa lei, empresas com 100 ou mais empregados são obrigadas a preencher de 2% a 5% dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência.

Mas existe um grupo que continua invisível na sociedade, apesar de chamar a atenção nas ruas: os albinos. O albinismo é uma condição genética caracterizada pela falha na produção e distribuição de melanina na pele, pelos e olhos. A melanina é a proteína que tem como função principal a proteção contra a radiação solar. As pessoas com albinismo podem apresentar problemas de visão, alterações de pigmentação, maior vulnerabilidade a queimaduras solares, além de lesões e câncer pele. Esse último, segundo o Ministério da Saúde, é uma das principais causas de morte entre albinos.

Nos termos da lei, os albinos são considerados pessoas com deficiência? Via de regra, sim. Embora o albinismo em si (falta de melanina, falta de pigmentação) não seja considerado uma deficiência, os problemas de visão que a maioria das pessoas albinas apresenta faz com que sejam consideradas, por lei, como pessoas com deficiência visual. Nesse contexto, é importante destacar a situação do albino e os desafios que ele enfrenta no mercado de trabalho. Viver em um país tropical e realizar trabalho externo sem o protetor solar representa o risco diário do trabalhador albino, que precisa do emprego para o seu sustento.

Acompanhe, a seguir, o caso julgado recentemente pela Justiça do Trabalho mineira sobre esse tema.

Empregado com albinismo será indenizado após adquirir câncer de pele por exposição ao sol sem proteção nas tarefas do trabalho

A Justiça do Trabalho de Minas condenou uma instituição de ensino mineira ao pagamento de indenização por danos morais de R$ 10 mil a um ex-empregado que adquiriu câncer de pele. O trabalhador, que é albino e exercia a função de contínuo (office-boy), alegou que ficou exposto de forma irregular, habitual e sem proteção ao sol nas tarefas externas do contrato de trabalho.

A Justiça do Trabalho negou a reintegração do trabalhador, mas determinou, além da reparação pelo dano moral sofrido, o pagamento de indenização correspondente ao valor gasto com a manutenção do plano de saúde, desde a data da dispensa até a publicação da decisão judicial. A decisão é do juiz titular da 17ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, Henrique Alves Vilela, que reconheceu ainda a existência de grupo econômico, e condenou a entidade sindical de Minas Gerais ao pagamento das parcelas devidas ao trabalhador de forma solidária.

Na ação, o trabalhador relatou que foi admitido pela instituição de ensino por meio do Programa PCD (Pessoa com Deficiência) e que foi diagnosticado com câncer de pele, em decorrência da exposição ao sol durante suas atividades sem a utilização de equipamentos de proteção, fundamentais para amenizar os efeitos da radiação solar.

No processo, a defesa da empregadora negou a ocorrência de doença ocupacional. Mas a perícia técnica apontou que o ex-empregado apresentou carcinoma basocelular (câncer de pele), que foi cirurgicamente tratado e que não determinou significativa incapacidade laborativa. O laudo indicou o nexo concausal entre a doença e o trabalho: exposição solar. Segundo o perito, restou do tratamento cirúrgico uma cicatriz definitiva no braço esquerdo, que caracteriza dano estético em grau leve, sendo que, hoje, clinicamente, “o reclamante está apto para o trabalho”.

Reintegração – Diante do caso, o trabalhador pediu a reintegração ao emprego ou indenização substitutiva, por causa do período da garantia provisória de emprego decorrente da alegada doença ocupacional. Embasou seu pedido, inicialmente, no artigo 118 da Lei 8.213/91.

Porém, ao decidir o caso, e adotando o entendimento do TST, pela Súmula 378, o juiz entendeu que o trabalhador não satisfez os requisitos necessários para que lhe fosse assegurada a garantia provisória de emprego, visto que não foi afastado por mais de 15 dias e nem recebeu o auxílio-doença acidentário. “Assim, improcedem os pedidos de reintegração ou pagamento de indenização substitutiva ao período de estabilidade, com fulcro no artigo 118 da Lei nº 8.213/91”, concluiu.

Dispensa discriminatória – O magistrado reconheceu, no entanto, que o empregado foi dispensado de forma discriminatória e arbitrária. Testemunhas ouvidas provaram que o ex-empregado prestava serviços externos de forma habitual, com exposição ao sol, e sem o fornecimento dos EPIs necessários, principalmente, em razão de sua condição especial.

Uma delas confirmou que o trabalhador só passou a receber o protetor solar depois do diagnóstico de câncer de pele. Outra testemunha relatou que o encontrou, por algumas vezes, “bem vermelho”, por trabalhar externamente. Em outro depoimento, foi confirmado também que o autor fazia entrega e busca de documentos, inclusive em unidades externas.

Uma testemunha, que exerce a mesma função, como contínuo, relatou que os dois faziam entregas de correspondência, sendo que o autor atuava mais externamente. Afirmou que o autor saía por volta de 8:30/9:00 horas, retornando por volta de 10:30/11:00 horas e que, em regra, fazia as entregas a pé. Por fim, informou que, somente após o laudo médico, foi designado para trabalhar internamente.

Na visão do juiz, ficou provado que o contínuo possuía limitação ao exercício das suas atividades. “Sendo diagnosticado com câncer de pele, contexto que enquadra o caso em análise às hipóteses descritas na Súmula nº 443 do TST, atraindo a inversão do ônus de prova, já que o trabalhador é portador de moléstia que o incapacita para exercer atividades que demandem exposição ao sol, o que pode causar estigma ou preconceito”.

Mas o julgador ressaltou que, a partir de tal inversão, o empregador não logrou demonstrar, por exemplo, um motivo razoável para a dispensa, que não aquele decorrente da limitação para o trabalho em razão do carcinoma que o acometeu e da sua condição específica de albino. “Não foi demonstrada a necessidade de demissão em razão de fato objetivo como, por exemplo, diminuição de trabalho ou encerramento de determinado setor”.

Para o juiz, esses fatos, quando aliados à inversão do ônus probatório, autorizam concluir que a resilição do contrato de trabalho, ainda que por meio de dispensa imotivada, teve por fato ensejador a moléstia que acomete o contínuo e a sua condição especial. “Isso conduz à conclusão de que foi realmente realizada uma dispensa discriminatória”, pontuou.

No entendimento do julgador, essa dispensa transmite a mensagem para os demais empregados de que os trabalhadores com restrições não são aceitos para a empresa. “Especialmente quando diagnosticados com moléstia que é vista, no geral, como grave, no caso o câncer de pele, a qual causa inconvenientes para o empregado”, salientou.

Segundo o magistrado, a dispensa imotivada é um direito potestativo do empregador. “Entretanto, não pode a empresa abusar desse direito potestativo, utilizando a dispensa imotivada como forma de penalizar o trabalhador portador de restrição para o labor”, ressaltou na sentença, constatando que houve abuso de direito, inserindo-se na esfera dos atos ilícitos, a teor do contido no artigo 187 do Código Civil, aplicável ao Direito do Trabalho por força do contido no artigo 8º da CLT.

Dessa forma, o julgador deferiu o pedido de percepção da remuneração do período de afastamento, da data da dispensa até a data de publicação da sentença, observada a limitação imposta pelo pedido.

Por fim, tendo em vista a impossibilidade de reativação do plano de saúde, uma vez que não haverá reintegração, o juiz deferiu uma indenização correspondente ao valor que o empregador gastaria pela manutenção do plano de saúde pelo período compreendido entre a data da dispensa até a data de publicação da decisão, valor esse a ser apurado na fase de cumprimento do julgado.

Danos morais – Para o juiz,o ato discriminatório sofrido é patente. “Ele foi privado de sua atividade laboral, simplesmente, por ter sofrido restrições físicas em razão de moléstia da qual é portador e da sua condição específica”, ressaltou.

Na visão do julgador, o abuso de direito do empregador, que se equipara a ilícito, conduziu à existência de danos ao patrimônio imaterial do contínuo. “Portanto, presente o dano moral, causado por ato culposo, sobressaindo daí o seu dever de indenizar”, concluiu.

Para quantificação da indenização pelo dano moral, o juiz entendeu que se deve ter em conta as possibilidades do empregador e o grau de culpa no evento, bem como as posses e o constrangimento sofrido pela vítima. “Quanto ao grau de culpa do empregador no evento, tem-se que decorre da dispensa irregular aliada à falta de zelo pela incolumidade física do autor diante da ausência de EPI indispensável para a realização segura da atividade laboral”, salientou.

Dessa forma, arbitrou a indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil. Esse valor, no entendimento do juízo, não pagará o constrangimento sofrido pelo contínuo. Todavia, compensará o dano, sem que lhe traga um enriquecimento sem causa. “Por outro lado, o importe fixado a título de indenização por dano moral poderá ser quitado pelo empregador, que será estimulado a empreender todos os esforços necessários para evitar que eventos desta natureza se repitam no futuro”, concluiu. A empregadora interpôs recurso, mas julgadores da Décima Primeira Turma negaram provimento ao apelo, mantendo a decisão de 1º grau.

Fonte: TRT 3

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