Procuradoria-Geral da República questiona alterações no Código Brasileiro de Aeronáutica que exigem autorização judicial para acesso e uso de informações sobre investigações de acidentes aéreos.
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) deve retomar nesta quarta-feira (14) o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5667, que questiona trechos do Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) que tratam do acesso e do uso de informações sobre investigações de acidentes aéreos.
O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, explicou que, desde o início da sua gestão, o processo foi incluído em pauta diversas vezes, mas não foi julgado. Diante do acidente aéreo ocorrido em Vinhedo (SP) na última sexta-feira (9), que vitimou 62 pessoas, “o que já era prioridade para pauta da Presidência se tornou mais urgente”. Barroso ressaltou que a ação foi incluída como primeiro item com a concordância do relator, ministro Nunes Marques.
O que está em discussão são as alterações promovidas pela Lei 12.970/2014 em dispositivos do CBA que tratam do Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Sipaer), responsável por apurar esse tipo de acidente. O texto prevê que as análises e as conclusões da investigação não podem ser utilizadas como provas em processos judiciais e procedimentos administrativos e que o material só deve ser fornecido com autorização judicial. As apurações visam prevenir outros acidentes por meio da identificação dos fatores que tenham contribuído, direta ou indiretamente, para a ocorrência.
Na ADI 5667, Procuradoria-Geral da República (PGR) pede que o STF invalide a proibição do uso do conteúdo das apurações do Sipaer como provas em processos judiciais e a necessidade de autorização judicial para acesso a informações “que deveriam estar disponíveis para outros órgãos e entes estatais”. Pretende, ainda, que o STF autorize o acesso de peritos criminais e outros agentes públicos do sistema de justiça ao local e aos vestígios dos acidentes e que eles possam preservar o lugar e acompanhar as análises dos objetos relacionados, de maneira coordenada com a investigação aeronáutica. Segundo a PGR, as normas questionadas interferem nos poderes constitucionais de investigação do Ministério Público e da polícia.
Prevenção de acidentes
No julgamento, iniciado em setembro de 2021 em sessão virtual, o relator, ministro Nunes Marques, votou para declarar a lei constitucional. Para ele, a legislação segue o regramento internacional ao prever um modelo duplo de apuração: o criminal, conduzido pela autoridade policial e pelo Ministério Público, para verificar indícios de crime, e a investigação do Sipaer, cujo objetivo é prevenir novos acidentes aéreos.
Por terem naturezas e objetivos distintos, o relator considerou que o uso do material da investigação aeronáutica no âmbito penal pode violar o devido processo legal, porque o Sipaer é livre para cogitar causas não comprovadas, a fim de levantar o maior número de fatores que podem ter contribuído para o acidente aéreo – ou seja, fatos que não seriam necessariamente “causa” de crime, no sentido jurídico.
Para Nunes Marques, é necessário um clima de total confiança no sigilo da informação para que as pessoas prestem depoimentos que possam esclarecer detalhes ocultos do acidente, sem temerem represálias.
O ministro lembrou ainda que o Brasil mudou o Código Brasileiro de Aeronáutica após o acidente do voo Gol 1907, que colidiu no ar com um avião Embraer Legacy 600 e provocou uma crise no sistema de tráfego aéreo brasileiro. Ele ressaltou, portanto, que as alterações foram fruto de pesquisa, debate, estudos e de uma forte vontade política do Congresso para aperfeiçoar a segurança aérea do país.
O julgamento foi suspenso por um pedido de vista (mais tempo de análise) do ministro Alexandre de Moraes e será retomado nesta quarta (14)
Fonte: STF