Cláusulas contratuais que preveem o vencimento antecipado de uma dívida, mediante inadimplência do devedor, são lícitas, conforme entendeu o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO). O julgamento foi realizado em um Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), de relatoria da desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis.
Mediante várias ações que questionavam a legalidade da cobrança, principalmente em casos de empréstimos bancários, o IRDR foi suscitado pelo desembargador Fausto Moreira Diniz. A intenção foi fornecer segurança jurídica e isonomia e, assim, evitar decisões conflitantes aos diversos processos individuais, mas que, em comum, traziam a mesma questão de direito.
Alguns contratos firmados entre instituições financeiras e clientes, a totalidade da dívida pode ser cobrada após um determinado prazo de parcelas em atraso, o que é, justamente, denominado de vencimento antecipado. De acordo com a magistrada autora do voto, esse tipo de negócio jurídico tem origem nas doutrinas legais da Inglaterra e dos Estados Unidos, chamada anticipatory breach.
“A teoria do inadimplemento antecipado do contrato decorre do princípio da boa-fé, que impõe às partes o dever de lealdade, confiança, mútua proteção e colaboração. Nesse sentido, a recusa antecipada ao cumprimento da obrigação é, também, uma forma de violação ao princípio da boa-fé, pois a conduta que denota a falta de interesse de uma das partes em cumprir o dever de prestar é certamente uma lesão ao direito de confiança que inspira qualquer relação negocial”, destacou a relatora.
Respeito contratual
Ainda no relatório, a desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis destacou que os contratos, entre instituições financeiras e clientes, representam a garantia e a segurança “do mundo dos negócios, dando origem ao seu caráter de intangibilidade ou imutabilidade. A ilação de que as partes, nos limites da função social do contrato e ausentes quaisquer defeitos do negócio jurídico, são livres para convencionarem entre si obrigações recíprocas com vistas a alcançarem seus respectivos objetivos sócio/econômicos que deram azo à avença”.
Uma vez que é considerado uma verdadeira norma jurídica, o contrato, caso faz lei entre as partes, caso estejam ausentes as hipóteses legais de defeitos do negócio jurídico. Dessa forma, segundo a relatora, a estipulação de cláusula que preconiza a cobrança do saldo, na hipótese de inadimplemento, possui guarida no nosso ordenamento jurídico, conforme artigo 1.425, III do Código Civil, que dispõe sobre vencimento de dívidas e recebimento de prestações atrasadas.
“Tal providência tem por escopo, não só proteger os direitos pertencentes ao credor, mas também tutelar o equilíbrio dos contratos e a segurança das relações jurídico/econômicas que fomentam e fazem girar o mundo dos negócios e constitui, em última análise, aspiração de cunho social. Destarte, é possível aos contratantes, com amparo no princípio da autonomia da vontade, estipular o vencimento antecipado, nas hipóteses em que o inadimplemento de determinado número de parcelas acarretará o vencimento extraordinário de todas as subsequentes, ou seja, a integralidade da dívida poderá ser exigida antes de seu termo, com vistas a se afastar maiores prejuízos ao credor”, concluiu a integrante do Órgão Especial.
Fonte: TJGO