Amparado pela Lei Pelé, goleiro obtém direito a romper contrato com clube de futebol carioca

A Seção Especializada em Dissídios Individuais – Subseção II (Sedi-2) do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT/RJ) concedeu parcial segurança ao mandado de segurança impetrado por um goleiro da categoria de futebol profissional do Clube de Regatas Vasco da Gama e deferiu a rescisão do contrato de trabalho. O atleta entrou com pedido de antecipação de tutela, negado em primeira instância, para que fosse reconhecida a ruptura de seu contrato de trabalho por mora contumaz. Por maioria, o colegiado deferiu a tutela antecipada requerida, pois entendeu que mesmo não sendo o mandado de segurança instrumento adequado à discussão sobre os motivos da rescisão indireta, o centro da discussão é o direito à dissolução contratual por parte do jogador, liberdade assegurada pela Lei 9.615/98 (Lei Pelé).

O goleiro ajuizou ação trabalhista, alegando que desde 2017 o clube não recolheu as parcelas referente ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), não pagou diversas verbas trabalhistas. Requereu, em sede de tutela antecipada, a extinção do vínculo empregatício, por culpa grave do Reclamado e a liberação definitiva do atestado liberatório.  

O atleta profissional baseou seus requerimentos na Lei Pelé, que prevê a rescisão indireta por atraso no pagamento dos salários por período igual ou superior a três meses e de ausência do recolhimento das contribuições previdenciárias e das contribuições devidas à conta vinculada no FGTS. Segundo o jogador, a manutenção do vínculo esportivo com Vasco da Gama prejudicaria a sua carreira. Requereu também a expedição de ofícios à Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e à Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (FFERJ) para que fosse registrada a extinção do vínculo.

O juízo da 38ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, deixou de apreciar a tutela antecipada até o recebimento de manifestação contrária por parte do clube. Ademais, verificou a ausência de satisfação dos pressupostos do art. 300, do CPC, dado que segundo o magistrado, a prova pré-constituída nos autos foi insuficiente para atestar de forma inequívoca as alegações autorais.  Inconformado com a decisão, o jogador impetrou mandado de segurança.

Em sede liminar, a desembargadora relatora Marise Costa Rodrigues, expôs que há previsão legal específica que autoriza a ruptura do contrato de trabalho entre atletas profissionais e clubes em caso de atraso ou inadimplemento das obrigações contratuais e que restou comprovado, por meio de prova documental, o inadimplemento de contribuições previdenciárias e de contribuições devidas à conta vinculada no FGTS atinentes a, pelo menos, dezoito meses. Assim, deferiu parcialmente a tutela antecipada requerida para autorizar a ruptura do contrato de trabalho discutido nos autos da ação trabalhista originária com a data de 24.07.2020, além da expedição dos ofícios requeridos. 

Inconformado com a decisão, o clube pediu a sua reconsideração através de agravo regimental, argumentando que a manutenção do deferimento da tutela antecipada, geraria dano irreparável e que eventual mora relativa ao período da pandemia do Covid-19 deveria ser relativizada e não poderia gerar a rescisão indireta do contrato de trabalho, uma vez que o que se busca é a preservação do emprego.  

A Seção Especializada em Dissídios Individuais – Subseção II (Sedi-2), sob a relatoria da desembargadora Marise Costa Rodrigues, decidiu por maioria, manter o deferimento da tutela antecipada com a consequente rescisão do contrato de trabalho do jogador e julgar prejudicado o agravo interno interposto, por perda de objeto. 

Em seu voto, a relatora aduziu que não houve alteração no quadro fático-jurídico delineado na decisão questionada, que ensejasse sua reforma. Entretanto, destacou ser “evidente que a ação mandamental não é a sede adequada à discussão acerca modalidade da ruptura contratual” mas que o mandado de segurança em questão não diz respeito especificamente à rescisão indireta do contrato de trabalho desportivo, mas sim ao direito à dissolução contratual pelo atleta profissional. 

“Está em jogo o direito à dissolução contratual pelo atleta profissional, o que lhe é assegurado como princípio básico do desporto, no sentido de garantir-se a livre prática do desporto de acordo com a capacidade e o INTERESSE de cada um, como fixado no art. 2°., IV, da Lei 9.615/98, o que se resume em uma palavra: LIBERDADE”, enfatizou.  A magistrada reconheceu como preenchidos os requisitos para antecipação dos efeitos da tutela, explicando, nesse caso, haver risco de prejuízo para a carreira do atleta, com a perda de um possível contrato com outro clube, além de haver nos autos prova inequívoca do reiterado e prolongado descumprimento das obrigações contratuais o que autoriza a ruptura do contrato de trabalho por culpa patronal. 

Com base em jurisprudência firmada pelo TRT/RJ, a desembargadora concluiu que o caso revela a existência de direito líquido e certo do jogador, que merece proteção contra ilegalidade ou abuso de poder. Em sua decisão final, a magistrada concedeu parcialmente o mandado de segurança, autorizando a ruptura do contrato de trabalho e determinando a expedição de ofícios à CBF e à FFERJ para o registro da extinção do vínculo profissional do atleta.  

Após a decisão sobre o mandado de segurança, o juiz substituto da 38ª VT/RJ José Alexandre Cid Pinto Filho, em sede de sentença, confirmou a tutela antecipada e a rescisão indireta, declarando extinto o vínculo entre o goleiro e o clube em 24 de julho de 2020, além de condenar a agremiação a pagar cerca de R$ 1 milhão pelo inadimplemento das verbas trabalhistas ao jogador. 

Nas decisões proferidas pela Justiça do Trabalho, são admissíveis os recursos enumerados no art. 893 da CLT.

Fonte: TRT 1

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