Congresso sobre a CADH debate direitos civis e políticos, migrações e nacionalidade

​​O primeiro dia do Congresso sobre a Convenção Americana de Direitos Humanos contou com debates sobre a aplicação internacional da CADH e os direitos civis e políticos estabelecidos no documento. O tema migrações e nacionalidade à luz da Convenção Americana dos Direitos Humanos também foi discutido entre os participantes do encontro.

O evento acontece nesta quinta (12) e sexta-feira (13) no auditório do Superior Tribunal de Justiça (STJ), e discute os princípios e valores consagrados na convenção – conhecida também como Pacto de San José da Costa Rica.

O primeiro debate da tarde desta quinta-feira foi mediado pela ministra Laurita Vaz e abordou a “Convenção Americana de Direitos Humanos e o contexto mundial”. A palestrante Sylvia Steiner falou sobre o uso da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos na Corte Penal Internacional – tribunal que integrou como juíza entre 2003 e 2016.

Ela explicou que a Corte Penal Internacional foi criada pelo Estatuto de Roma, o qual expressamente afirma que a interpretação e a aplicação das leis devem estar de acordo com os direitos fundamentais internacionalmente reconhecidos. Steiner ressaltou que essa obrigação criou, “entre os tribunais internacionais, um sistema quase integrado de justiça internacional, em que as cortes estão interagindo num diálogo transnacional e de justiça de forma permanente”.

Direitos hum​anos

O professor Flávio de Leão Bastos, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, tratou da imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade e da obrigação de investigação e punição por parte dos países da Organização dos Estados Americanos (OEA).

Segundo ele, esses crimes podem ser conceituados como “o ataque sistemático, generalizado, contra populações civis”, nos quais a investigação não pode ser obstaculizada por atos normativos ou atos de governo, como tribunais militares de exceção ou leis de anistia. “Ao investigar e punir esses crimes, as cortes internacionais estabelecem e pavimentam uma via nobre do estabelecimento da verdade histórica e de memória coletiva”, afirmou.

A professora Christine Peter, do Centro Universitário de Brasília (UniCeub), falou sobre seu estudo a respeito da CADH na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF). Ela analisou 16 acórdãos e destacou, em sua palestra, três nos quais o STF usou a convenção como aporte normativo: ADPF 347, ADI 4275 e ADI 2566. No entanto, ressaltou que ainda é preciso uma maior abertura no debate com os princípios estabelecidos na convenção, “não apenas no âmbito do Supremo, mas no próprio Ministério Público e em todas as instituições que dialogam com o STF na construção dos seus casos notórios, especificamente aqueles que dizem respeito aos direitos humanos fundamentais”.

Ao encerrar, a ministra Laurita Vaz destacou a contribuição da CADH para os direitos humanos e lembrou que no último dia 8 foi comemorado o Dia Internacional da Mulher. Para ela, a realidade ainda mostra que o Brasil “é campeão de contrastes”, uma vez que o progresso e o sucesso alcançados por muitas mulheres ainda não são a realidade para a maioria, em especial as que estão nas classes menos favorecidas.

“Para elas, o tempo parece correr mais devagar, como mostram os dados estatísticos. No Distrito Federal, a taxa de homicídio está diminuindo, mas a de feminicídio e de estupros, não. Isso só demonstra que a luta pela igualdade de gênero precisa ser levada a sério e que as vítimas precisam ser mais cuidadas pelas autoridades e por todos nós”, ressaltou.

Migraçõ​es

O último painel do primeiro dia do congresso teve como tema “Direitos civis e políticos da CADH”. A moderação ficou sob a responsabilidade do professor da Universidade de Brasília Mamede Said Maia Filho.

André de Carvalho Ramos, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e procurador regional da República, iniciou os debates com uma palestra sobre migrações e nacionalidade à luz da CADH.

Ele abordou a mobilidade humana e o universalismo. “A mobilidade humana é uma realidade inconteste”, destacou. Segundo o professor, o ideal de promoção dos direitos humanos não aceita localização geográfica ou topográfica, pois “todos nascem iguais”.

Ramos fez observações sobre a migração e a nacionalidade, tratando das questões entre a soberania e o universalismo dos direitos humanos, o tratamento jurídico e os precedentes transformadores na ação da Corte Interamericana dos Direitos Humanos, e as perspectivas e os desafios da mobilidade.

De acordo com o professor, a CADH foi criada com múltiplas facetas, objetivando a aproximação do direito à nacionalidade e do combate à apatridia, incentivando o direito de sair livremente de qualquer país e o direito ao asilo, e estimulando a atuação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

“Devemos ter um olhar mais aprofundado, menos no texto e mais na interpretação da Convenção Americana de Direitos Humanos. O Brasil ganhará mais com uma sociedade multicultural e inclusiva”, destacou.

Artig​os

Após a palestra, foram apresentados cinco artigos sobre o tema direitos humanos. O material fará parte de um livro a ser lançada no dia 25 de setembro de 2020, quando se comemora o 28º aniversário da entrada em vigor da CADH no Brasil.

Os artigos apresentados tratam da proteção e da expansão dos direitos fundamentais nos países americanos, abordando a inclusão dos direitos humanos, do direito ao meio ambiente e do debate sobre violência policial na pauta do Judiciário e dos operadores do direito.

O primeiro artigo apresentado é de autoria do professor José Tietzmann, da Universidade Federal de Goiás. Com o título “De Aarhus a Escazú: a oponibilidade do direito ao meio ambiente na Corte Interamericana de Direitos Humanos”, o artigo tratou do direito humano ambiental.  

A defensora pública Mariana Py Muniz, do Rio Grande do Sul, trouxe um artigo sobre “Audiência de custódia no Brasil: da efetivação da Convenção Americana dos Direitos Humanos”. Segundo ela, apesar de ser imprescindível, a audiência de custódia ainda precisa ser fortalecida e aperfeiçoada para melhor proteção dos direitos humanos.

“Obrigações positivas em matéria penal: efeitos e limites da jurisprudência interamericana em caso de violações de direitos humanos” foi o tema desenvolvido no artigo do promotor de Justiça Carlos Gustavo Andrade, do Ministério Público do Rio de Janeiro.

A defensora pública federal Isabel Penido apresentou o artigo “O direito convencional de liberdade de circulação e residência diante do fenômeno dos deslocamentos forçados internos na Colômbia: um estudo sobre o desenvolvimento dos parâmetros interamericanos”.

A advogada da União Andrea Vergara trouxe o artigo “A persecução penal como recurso efetivo na proteção dos direitos previstos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos” para apresentar no último painel do dia.

Todos os artigos estarão disponíveis para o público – em versões impressa e digital – na obra que será produzida, no Brasil, pelo Conselho da Justiça Federal (CJF).

Fonte: STJ – 13/03/2020

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