A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu recurso especial de um candidato reprovado na fase de investigação social em concurso da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) por ter admitido o uso de drogas oito anos antes do certame.
Ao determinar a reintegração do candidato ao concurso, o colegiado considerou, entre outras razões, o fato de ele já exercer um cargo no serviço público; o longo período desde que teve contato com entorpecentes e a sua aprovação na investigação social em outro concurso para a carreira policial, no Maranhão.
“Impedir que o recorrente prossiga no certame público para ingresso nas fileiras da Polícia Militar do Distrito Federal, além de revelar uma postura contraditória da própria administração pública – que reputa como inidôneo um candidato que já é integrante dos quadros do serviço público distrital –, acaba por lhe aplicar uma sanção de caráter perpétuo, dado o grande lastro temporal entre o fato tido como desabonador e o momento da investigação social”, afirmou o relator do recurso, ministro Og Fernandes.
O concurso para o cargo de soldado foi realizado pela PMDF em 2019 e, na fase de investigação social, o candidato admitiu que usou drogas em 2011, quando tinha 19 anos. Por isso, apesar da aprovação nas primeiras etapas do certame, ele foi considerado “não recomendado” para assumir o posto de policial.
Regras do edital do concurso
Em primeiro grau, o juízo acolheu o pedido de reintegração do candidato ao concurso, mas o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) reformou a sentença por entender que a admissão de policial com histórico de dependência química está subordinada à discricionariedade da administração pública, de forma que o Judiciário não poderia rever o ato questionado, salvo em caso de ilegalidade.
Ainda segundo o TJDFT, o tempo transcorrido desde o último contato com entorpecentes não faria diferença, pois o edital estabelece claramente que o uso ou a dependência de droga ilícita maculam a idoneidade moral exigida dos candidatos.
Princípios da razoabilidade e proporcionalidade
O ministro Og Fernandes lembrou que, de acordo com a jurisprudência do STJ, tratando-se de investigação social para cargos sensíveis – como os da área policial –, a análise da autoridade administrativa não deve se restringir a eventuais condenações penais transitadas em julgado, mas pode englobar o exame de outros aspectos relacionados à conduta moral e social do candidato, a fim de verificar sua adequação ao trabalho pretendido.
Por outro lado, o relator apontou que a discricionariedade administrativa não é imune ao controle judicial, especialmente diante da prática de atos que impliquem restrições de direitos dos administrados, como a eliminação de concurso público, cabendo à Justiça reapreciar os aspectos vinculados do ato administrativo (competência, forma, finalidade, além da razoabilidade e da proporcionalidade).
No caso dos autos, Og Fernandes apontou que, além de o próprio candidato ter admitido que foi usuário de drogas – mas deixou o vício há oito anos –, ele ocupa atualmente o cargo de professor no Distrito Federal, não havendo qualquer registro desabonador de sua reputação. Adicionalmente, ressaltou, o candidato foi aprovado na investigação social em concurso para o mesmo cargo na Polícia Militar do Maranhão.
Ao restabelecer a sentença, o magistrado ainda ressaltou o parecer do Ministério Público Federal no sentido de que a investigação social ou de vida pregressa não pode se tornar um instrumento de penalização perpétua.
O acórdão do TJDFT – concluiu o relator –, “ao reconhecer a impossibilidade de controle judicial do ato que reprovou o candidato na sindicância de vida pregressa, trilhou orientação contrária ao entendimento desta corte superior, estando demonstrado, no caso, que a administração não se pautou pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade”.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):AREsp 1806617
Fonte: STJ